Como seus amores são belos,minha irmã, noiva minha. Seus amores são melhores do que o vinho, e mais fino que os outros aromas é o odor dos teus perfumes. Por isso Eu quero consumir meus dias, no seu amor! ══════ ღೋ♡✿♡ღೋ═══════

Ani Ledodi Vedodi Li


Mais do que qualquer outro motivo, esta é a razão pela qual quero fazer deste blog um caminho para amarmos mais a Deus, por isso seu nome: “Ani Ledodi Vedodi Li”

Para você entrar em nossos artigos click nas imagens nas laterais e encontrarás os lincks dos artigos postados.

Deus o Abençõe !

E que possas crescer com nossas postagens.

É algo louvável esconder o segredo dos Reis; mas há glória em publicar as obras de Deus!

A Igreja não tem pressa, porque ela possui a Eternidade. E se todas as outras instituições morrem nesta Terra, a Santa Igreja continua no Céu.

Não existem nem tempos nem lugares sem escolhas.

E eu sei quanto resisto a escolher-te.

"Quando sacralizamos alguém essa pessoa permanece viva para sempre!"

Sacralize cada instante de tua vida amando o Amado e no Amado os amados de Deus !


Pe.Emílio Carlos

sábado, 31 de março de 2012

“Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito seja o Reino que vem!” (Mc 11,9-10)

Leituras: Marcos 11, 1-10 (antes da Procissão de Ramos);

Isaías 50, 4-7;

Salmo 21 (22), 8-9.17-18a.19-20.23-24 (R/2a);

Carta de São Paulo aos Filipenses 2, 6-11;

Marcos 14, 1-15, 47 (mais longo);

Marcos 15, 1-39. (mais breve) (Paixão do Senhor).

COR LITÚRGICA: VERMELHO

(A assembléia se reúne na igreja, ou em outro lugar conveniente de onde sairá a procissão).

BÊNÇÂO DOS RAMOS

Refrão orante:

Hosana Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor!

Durante esta semana santa, teremos a oportunidade de considerar a dor humana em Jesus de diversas formas.

Dor que se tornou sofrimento no corpo e atingiu o coração do Senhor, como na traição e na angústia que sentiu diante da paixão.

Porém teremos uma certeza nesta semana: como Deus não abandonou seu Filho, também não vai nos abandonar.

1. Situando-nos

Com a celebração de hoje, entramos na Semana Santa.


O que é a Semana Santa?

Por que ela é tão importante na dinâmica do ano litúrgico?

Na Semana Santa celebramos a história da salvação de um Deus que se humilhou e tornou-se homem para caminhar conosco, conhecer a nossa história e nos apontar caminhos de vida. Mas não é só isso. No Getsênami, Jesus experimenta uma grande tristeza e sente a dor da angustia. Suspenso entre o céu e a terra numa cruz, ele vive o doloroso abandono por parte do Pai. Enfrenta a traição de Judas que, com um beijo, o entrega aos seus inimigos.

Pedro não o reconhece na presença de uma empregada. Os discípulos, seus amigos prediletos, fogem e o deixa sozinho nas mãos dos soldados. A condenação forjada é tramada para eliminar sua pessoa e os desígnios de Deus nele manifestos. Jesus, o Servo Sofredor, despido de toda dignidade é reduzido a um farrapo humano.

Essa experiência de Jesus na Semana Santa é a história viva da humanidade. Contemplando a paixão e morte de Jesus, fazemos memória dos sofrimentos, das injustiças e das violências experimentados por milhões de seres humanos. Ele assume e faz seus todos esses sofrimentos. Em sua morte e ressurreição, estão presentes todos os sofrimentos humanos.

A Semana Santa, tempo de comunhão e solidariedade com e em Jesus, é um tempo santo e precioso para entrarmos na Historia da Salvação e da Libertação. Somos convidados a tomar parte nesta história como agentes, como discípulos missionários, não permitindo que o pecado, que levou Jesus à morte e ainda destrói tantas vidas, invada o nosso ser e o nosso agir.

Nessa Semana, meditamos o Evangelho de Jesus, contemplamos sua prática, acolhemos sua proposta de doação e partilha, entramos em sua atitude de obediência ao Pai e de serviço à humanidade. Na oração da coleta, imploramos a graça da conversão e mudança de vida, dizendo ao Pai: “concedei-nos aprender o ensinamento da sua paixão e ressuscitar com ele em sua glória.

Unidos com toda a Igreja no Brasil, concluímos hoje a primeira etapa da Campanha da Fraternidade 2012. Além da nossa conscientização sobre o problema, os desafios e as perspectivas da saúde em nosso país hoje se fazem presentes. É o dia de realizarmos o gesto concreto, pois a CF se expressa concretamente pela oferta de doações em dinheiro, na Coleta da Solidariedade.

É um gesto concreto de fraternidade, partilha e solidariedade, feito em âmbito nacional, em todas as comunidades cristãs, paróquias e dioceses. A Coleta da Solidariedade é parte integrante da Campanha da Fraternidade. O gesto fraterno da oferta tem um caráter de conversão quaresmal, condição para que advenha um novo tempo marcado pelo amor e pela valorização da vida.

2. Recordando a Palavra

A leitura do profeta Isaías fala do Servo do Senhor ou Servo Sofredor. Quem é ele? Ele é o escolhido, dotado de dons, capaz de atrair e provocar a adesão dos ouvintes. Esses dons lhe são concedidos em vista da missão: transmitir uma mensagem a quem perdeu toda a confiança.

A característica mais surpreendente no personagem do Servo é sua inocência. Ele é um justo. No entanto, ele sofre e seu sofrimento é absolutamente imerecido.

A leitura mostra as disposições interiores do Servo do Senhor: vive na permanente escuta da Palavra de Deus; o coração e os ouvidos estão abertos para não deixar escapar nada do que o Senhor lhe revela.

A missão implica, porém, muitos sofrimentos. Sua pregação denuncia injustiças, atinge aqueles que exploram e escravizam, aponta a corrupção política e moral. Tudo isso lhe acarreta perseguição. Ele é flagelado e espezinhado. Qual sua reação? Resiste firme, não abre a boca, não reclama, mas confia no Senhor, porque sabe que ele está ao seu lado. Jesus é o Servo que dedicou sua vida para libertar e consolar os oprimidos.

Na história do Servo Sofredor e de Jesus, é fácil reconhecer a historia de todos os homens e mulheres que querem praticar e proclamar a justiça.

O evangelho nos mostra que Jesus aceitou livremente sua morte, porque compreendeu seu sentido. Ele se sabia inocente. Compreendia que a morte de um justo não podia ser senão o bem dos outros prostrados pelo pecado.

A segunda leitura projeta uma luz sobre a missão de Jesus Cristo, seu esvaziamento que nos valeu a salvação. A comunidade dos filipenses, amada e muito querido por Paulo, encontra-se em situações de ciumeiras, desavenças, fofocas, disputas de poder. Paulo reage com uma palavra forte: “Nada façais por espírito de partido ou vanglória, mas com humildade tende os outros como melhores” (Fl 2, 3-4).

Ele recorre a um hino muito antigo para fundamentar a intervenção de Deus nesta historia (Cf. Fl 2,6-11). O poema na forma de hino, que é proposto aos filipenses, comporta dois movimentos: o despojamento voluntário do Cristo (v.6-8) e sua elevação por Deus (v.9-11).

“O Cristo Jesus, ele que tinha a condição divina, não considerou o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente”. Parece haver um contraste entre o que vai fazer o Filho de Deus e o que Adão fez. O Cristo escolheu na terra a humildade e a obediência em vez do orgulho e da revolta de Adão que se quis fazer igual a Deus. E vós sereis como deuses, disse a serpente (cf. Gn 3,5).

“Ele se despojou assumindo a condição de servo”. É a Encarnação que é descrita como uma “Kénosis” (esvaziou-se a si mesmo). Essa “Kénosis” ou esvaziamento não implica que Jesus deixe de ser igual a Deus ou de ser a imagem de Deus. É em seu próprio esvaziamento que ele revela o ser e o amor de Deus.

Os cinco verbos seguintes descrevem esse esvaziamento: “assumindo a condição de servo, tornado semelhante aos homens e reconhecido como um homem em seu comportamento, ele humilhou-se a sai mesmo, fazendo-se obediente até a morte e morte de cruz”.

O movimento de elevação vem em seguida. “Por isso Deus o sobre-exaltou grandemente”. Do mesmo modo, como na parte anterior, o hino retoma as expressões que expõem o destino do misterioso Servo do Livro de Isaías. A elevação está ligada com a ressurreição ou a ascensão, que é a ação soberana do Pai. O paralelo deve ser feito com o lirismo do Livro da Consolação: Eis que meu Servo há de prosperar, ele se elevará, será exaltado, será posto nas alturas (cf. Is 52,13).

A entrada de Jesus em Jerusalém é descrita por Marcos com todas as características de uma reportagem enriquecida por um diálogo com os donos do burrinho, não faltando um colorido político pela aclamação do povo. Não se fala do “filho de Davi”, mas do “reino do pai Davi”.

A narração da Paixão segundo Marcos é a narração mais breve e mais antiga. Marcos esteve dando importância às testemunhas oculares destes fatos. Jesus apresenta-se em toda a sua fragilidade humana, entregue a solidão, à angústia.

Mas, com sua morte, é manifestada sua divindade nas palavras do centurião romano: “verdadeiramente este homem era Filho de Deus”. Durante o processo que foi movido, Jesus guarda silêncio, confiando unicamente em Deus, a quem no Horto das Oliveiras chama “Abba” (paizinho).

O Evangelho de Marcos é o que com mais realismo e até com certa crueldade nos narra a paixão de Jesus. Ele realiza e vive uma paixão física, que atinge todo o seu corpo; mas também uma paixão do coração. No Getsênami, Jesus sofre pavor, angústia, tristeza e é preso e amarrado com violência pelo povo que veio a ele com espada e paus, dando-lhes bofetadas.

No pretório, os soldados romanos teceram uma coroa de espinhos e colocaram-se sobre sua cabeça. Aí mesmo, lhe golpearam na cabeça com uma vara, lhe cuspiam e, colocando-se de joelhos, lhe faziam reverência. Depois o crucificaram. O evangelista termina o relato dizendo que Jesus, dando um forte grito, expirou. Grito de dor, grito que resume toda a paixão: do corpo e do coração.

Como se comportam os seus? Judas, o trai, Pedro o nega, todos os discípulos o abandonam e fogem. As autoridades também agem de forma violenta e brutal. Jesus, o inocente, é julgado e condenado. Ele, o Senhor, é esbofeteado por um servo, escarnecido pelo soldado, objeto de zombaria do povo.

Este evangelho, descrevendo o realismo da paixão de Jesus, não nos pode deixar indiferentes.

3. Atualizando a Palavra

A Palavra que ouvimos na celebração de hoje é muito forte. Ela nos confronta com nossa própria fé, com o modo como a vivemos e testemunhamos. No evangelho que segue a benção dos ramos, vemos Jesus a caminho de Jerusalém. Em que ponto deste caminho nós estamos? Estamos à frente, atrás ou nos mantemos à beira da estrada? Exultamos convictos: “bendito o que vem em nosso Senhor” ou o fazemos superficialmente, levados pelo “embalo da multidão”.

Não basta clamar “bendito o que em vem nome do Senhor”. Urge agir e ser para que efetivamente haja espaço para ele se tornar presente em nossa sociedade. Há varias formas de buscar o que isto se realiza, uma delas é nos fazermos portadores da paz, que é fruto da justiça. É assumir, apesar de todas as pedras no caminho, o chamado que nos é feito e, a exemplo do servo sofredor, poder dizer: “Não lhe resisti nem voltei a trás... Sei que não sairei humilhado”.

Esta certeza nos é reforçada pelo próprio Cristo que se esvaziou, se humilhou e depois foi por Deus Pai exaltado. Participar da Eucaristia significa viver o mistério de Jesus Cristo em sua totalidade. Hoje, porém, somos chamados a viver mais intensamente sua paixão e morte e, com o hino da Campanha da Fraternidade, reafirmar: “Tu, que vieste para que todos tenham vida, cura teu povo dessa dor em que se encerra; que a fé nos salve e nos dê força nessa lida, e que a saúde se difunda sobre a terra”.

O Evangelho da Paixão nos conduz à contemplação. O sofrimento intenso de Jesus nos faz ver o quanto o projeto de amor e paz que ele trouxe entra em choque com o contexto mundano. A grande lição da Paixão é a da paciência em meio às provações. Dedução muito fácil de fazer, mas difícil de por em prática. Somos convidados à firmeza de Jesus em meio às contrariedades.

É preciso ousar fazer o mesmo que fez Paulo, que não hesitou em recomendar a contemplação do próprio mistério da Kénosis para animar a vida quotidiana dos cristãos. A humildade, à imagem do Cristo, contribui para a qualidade de vida entre os membros da comunidade. “Tende um mesmo amor, numa só alma, num só pensamento, nada façais por competição e vanglória, mas com humildade, julgando os outros como superiores a si mesmo, não visando ao próprio interesse, mas ao dos outros. Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus” (Fl 2,2-5).

4. Ligando a Palavra com ação litúrgica

A celebração do Domingo de Ramos nos coloca em um ambiente de contraste entre a exaltação da chegada de Jesus a Jerusalém e sua paixão e morte. Sacudidos pelo contexto divergente destes dois polos, pedimos ao Pai “concedei-nos aprender o ensinamento da sua paixão e ressuscitar com ele em sua glória” (oração do dia).

Na última Ceia, Jesus faz um gesto solene, que ficará como o mais conhecido por simbolizar sua morte e que nos toca ainda agora. Oferece pão e vinho como sacramento do que ele vive interiormente na hora de morrer. A palavra sobre o cálice é muito clara: “Isto é meu sangue, o sangue da aliança, que vai ser derramado em favor de muitos” (Mc 14,24).

Sim, Jesus sentia-se muito só nesse momento. Mas ele realiza um gesto de partilha, mostrando que sua morte será vivida em comunhão com todos os homens. Mas ainda, o ouvimos falar de muitos. Antes havia declarado: O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos (cf. Mc 10,45).

Outrora, Moisés aspergiu com sangue os israelitas membros da aliança do Sinai (cf. Ex 24,8). Hoje, Jesus diz que o sangue derramado em sua Paixão simboliza também a aliança, desta vez, estendida misticamente a todos. A morte de Jesus criou vínculos novos de fraternidade entre os homens.

Todo sentido do sacrifício de Jesus emerge na oração sobre as oferendas e no prefácio quando, pela voz de quem preside, dizemos: “ó Deus, pela paixão de nosso Senhor Jesus Cristo, sejamos reconciliados convosco, de modo que, ajudados pela vossa misericórdia, alcancemos pelo sacrifício de vosso Filho o perdão que não merecemos por nossas obras”.

E também afirmamos “sua morte apagou nossos pecados e sua ressurreição nos trouxe a vida”.

Com esta celebração, inicia-se a Semana Santa durante a qual, incessantemente, pediremos ao Pai: “como pela morte de vosso Filho nos destes esperar o que cremos, dai-nos pela sua ressurreição alcançar o que buscamos” (Oração após a comunhão).

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sexta-feira, 30 de março de 2012

“Completo na minha carne, o que falta à paixão de Cristo”


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Que gesto de amor sublime de Jesus por nós, abraçou sua cruz, que na verdade era a nossa cruz, eram os nossos pecados, a nossa condenação, abraçou-a com amor até o fim! Ninguém jamais amou tanto o homem como Cristo a ponto de sujeitar-se a todo o sofrimento e morte de cruz.

Objeto de desprezo até o momento em que Jesus, obediente até o fim, foi nela suspenso. Tornou-se então, motivo de glória, significado de vida e não de morte.

A cruz não é um fim em si mesma, porém nela, Jesus conquistou para nós a oportunidade de uma vida plena.

Enquanto olhamos para a cruz com um olhar superficial, humano, simplesmente como significado de sofrimento, acabamos por nos agarrarmos a imagem de um Deus carrasco, que nos sujeita ao sofrimento, como se tudo nessa vida tivesse que passar pelo sofrimento, como se tivessemos que nos sujeitar ao sofrimento únicamente por vontade de Deus, e não como consequencia de nossas escolhas.

A cruz não é isto, Deus não age desta forma, o Nosso Deus não é carrasco, pelo contrário, Jesus passou pela cruz para que nós tivessemos uma chance, na cruz está explicito o tamanho da misericórdia de Deus para com os homens, muitas vezes ingratos, que não sabem reconhecer o tamanho da dádiva que Deus concedeu a nós por meio da Cruz que Jesus carregou em nosso lugar.

A Cruz é sinônimo de vida! Foi nela que Jesus venceu a morte.

Nela Cristo conquistou para nós o direito de uma vida plena, e feliz, tudo depende de nossas escolhas, abraçarmos nossa cruz com amor, e tentarmos ao máximo seguir e fazer a vontade de Deus, podemos começar já na terra o nosso céu. Se olharmos em volta, veremos que grande parte do nosso sofrimento, se não todo, é resultado de nossas escolhas, muitas vezes erradas, fruto do nosso pecado.

Ainda assim, com todo nosso pecado, nossas escolhas mal feitas, Deus ainda põe ao longo de nossa vida, para caminhar conosco “um Cirineu”, que nos ajuda com o peso de nossa cruz.

Que nós saibamos a exemplo de Jesus carregar a nossa cruz, que busquemos a cada dia sermos mais solícitos uns com os outros, pacientes com nossas cruzes, como Jesus foi com a Dele, e que a cada passo façamos tudo por amor a Jesus, para que um dia possamos desfrutar dessa vida plena que Jesus nos assegurou ao ser crucificado, porém mesmo que Ele nos tenha assegurado essa chance de vida plena, vive-la plenamente ainda depende de nós, de nossas escolhas.

“Quando Eu for exaltado, atrairei todos à mim” (João 12,32)

Não é fácil morrer para nossas vontades, que nem sempre nos levam ao caminho de Deus, muitas vezes nos tornamos escravos de nós mesmos, nossos desejos desordenados, essa é nossa cruz, lutar contra o que em nós ainda não pertence a Cristo, os pecadinhos de estimação.

Deus nos deixa livres para escolhermos por onde queremos andar, Ele apenas nos indica o caminho, seguir por ele ou não, é escolha nossa!

Que nós possamos como São Paulo completar em nós o que falta a paixão do Senhor.


DOMINGO DE RAMOS Ano B

“Requisitaram, para lhe levar a cruz, um homem que passava, vindo do campo, Simão de Cirene, pai de Alexandre e Rufo.” Mc 15, 21

Carta a Simão de Cirene

Caríssimo Simão.

Desculpa-me o afeto desta saudação mas sabes, certamente, que és um dos personagens mais lembrados do evangelho.

Sem dizeres nenhuma palavra, aquele pequeno versículo que os evangelistas nos deixaram (só João não te refere), com o teu nome e o dos teus filhos, revelando-te como quem ajudou Jesus a levar a cruz, gravou-te no nosso coração.

Mas quem és tu? Um desconhecido forçado a entrar no maior drama da história. Um nome e um gesto lembrado para sempre. Proveniente da longínqua Líbia (hoje um país crucificado por um regime despótico e a procurar uma liberdade que vença os conflitos), estarias radicado por Jerusalém ou vinhas para a Páscoa? Sabermos o teu nome e o dos teus filhos leva-nos a pensar que tu ou eles pertenceram às primeiras comunidades cristãs.

O que pensaste ao ser obrigado a levar o instrumento de morte de um condenado?

Que viste naquele flagelado que a multidão injuriava?

Sempre as multidões foram manipuláveis. Dias antes, essa ou outra multidão tinha-O aclamado Messias Rei ao entrar em Jerusalém. Onde estavam os amigos que O acompanhavam desde a Galileia? Um deles, também chamado Simão, tinha dito que daria a vida por Ele. Mas isto não sabias ainda. Agora ia ali, talvez à tua frente, como se levasse o peso do mundo nos seus ombros, alguém que não conhecias.

Terá o seu olhar cruzado com o teu?

Quero acreditar que sim. E que tenhas percebido aquele amor que muda as nossas vidas, que enche de paz quando as injustiças e o inexplicável acontecem, que nos empurra a dar até ao fim o melhor que está dentro de nós.

Ficaste até ao fim?

Ouviste aqueles que O incitavam a descer da cruz e a salvar-se a si mesmo?

Ficamos sem saber mas o teu papel já estava realizado.

Levares a cruz de Jesus tornou-te padroeiro de todos os que levam cruzes que não são suas.

Que são de alguém que amam ou de desconhecidos.

Porque se compadecem ou porque são requisitados.

E há um mistério de amor a ligar todos estes Cireneus voluntários ou não, que aliviam o peso e dão vida a quem a não tinha. Tão ao contrário dos que se especializam em atar “fardos pesados e difíceis de suportar” e os põem aos ombros dos homens, ou “fazem todas as obras para serem vistos pelos homens” como dizia Jesus (Mt 23, 4-5).

Que nomes novos tem a cruz hoje?

Desemprego, pobreza, violência, exploração dos fracos, dependência dos poderosos?

E que poderes a originam?

Injustiça, corrupção, desonestidade, enriquecimento ilícito, abuso de poder!

Ah, Simão, a cruz que levaste aos ombros já era feita de tudo isto!

Mas a abundância do amor venceu o desamor.

A manhã de Páscoa tornou-se mais forte que as trevas do calvário.

Na cruz de Jesus todas as cruzes conduzem à Vida!

Obrigado por nos ensinares que, mesmo sem querermos, podemos dar vida a quem a amamos e a quem desconhecemos.

Obrigado por teres caminhado com Jesus como gostaríamos de acompanhar quem sofre.

Um abraço forte, e até já, nestes caminhos de Jesus!

P. Vítor Gonçalves

DOMINGO DE RAMOS NA PAIXÃO DO SENHOR

A liturgia deste último Domingo da Quaresma convida-nos a contemplar esse Deus que, por amor, desceu ao nosso encontro, partilhou a nossa humanidade, fez-Se servo dos homens, deixou-Se matar para que o egoísmo e o pecado fossem vencidos. A cruz (que a liturgia deste domingo coloca no horizonte próximo de Jesus) apresenta-nos a lição suprema, o último passo desse caminho de vida nova que, em Jesus, Deus nos propõe: a doação da vida por amor.

A primeira leitura apresenta-nos um profeta anônimo, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com teimosa fidelidade, os projetos de Deus. Os primeiros cristãos viram neste “servo” a figura de Jesus.

A segunda leitura
apresenta-nos o exemplo de Cristo. Ele prescindiu do orgulho e da arrogância, para escolher a obediência ao Pai e o serviço aos homens, até ao dom da vida. É esse mesmo caminho de vida que a Palavra de Deus nos propõe.

O Evangelho
convida-nos a contemplar a paixão e morte de Jesus: é o momento supremo de uma vida feita dom e serviço, a fim de libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo e escravidão. Na cruz, revela-se o amor de Deus – esse amor que não guarda nada para si, mas que se faz dom total.


LEITURA I – Is 50,4-7


No livro do Deutero-Isaías (Is 40-55), encontramos quatro poemas que se destacam do resto do texto (cf. Is 42,1-9; 49,1-13; 50,4-11; 52,13-53,12). Apresentam-nos uma figura enigmática de um “servo de Jahwéh”, que recebeu de Deus uma missão. Essa missão tem a ver com a Palavra de Deus e tem caráter universal; concretiza-se no sofrimento, na dor e no abandono incondicional à Palavra e aos projetos de Deus. Apesar de a missão terminar num aparente insucesso, a dor do profeta não foi em vão: ela tem um valor expiatório e redentor; do seu sofrimento resulta o perdão para o pecado do Povo. Deus aprecia o sacrifício do profeta e recompensá-lo-á, elevando-o à vista de todos, fazendo-o triunfar dos seus detratores e adversários.
Quem é este profeta? É Jeremias, o paradigma do profeta que sofre por causa da Palavra? É o próprio Deutero-Isaías, chamado a dar testemunho da Palavra no ambiente hostil do Exílio? É um profeta desconhecido? É uma figura coletiva, que representa o Povo exilado, humilhado, esmagado, mas que continua a dar testemunho de Deus, no meio das outras nações? É uma figura representativa, que une a recordação de personagens históricas (patriarcas, Moisés, David, profetas) com figuras míticas, de forma a representar o Povo de Deus na sua totalidade? Não sabemos; no entanto, a figura apresentada nesses poemas vai receber uma outra iluminação à luz de Jesus Cristo, da sua vida, do seu destino.

O texto que nos é proposto é parte do terceiro cântico do “servo de Jahwéh”.

O texto dá a palavra a um personagem anônimo, que fala do seu chamamento por Deus para a missão. Ele não se intitula “profeta”; porém, narra a sua vocação com os elementos típicos dos relatos proféticos de vocação.

Em primeiro lugar, a missão que este “profeta” recebe de Deus tem claramente a ver com o anúncio da Palavra. O profeta é o homem da Palavra, através de quem Deus fala; a proposta de redenção que Deus faz a todos aqueles que necessitam de salvação/libertação ecoa na palavra profética. O profeta é inteiramente modelado por Deus e não opõe resistência nem ao chamamento, nem à Palavra que Deus lhe confia; mas tem de estar, continuamente, numa atitude de escuta de Deus, para que possa depois apresentar – com fidelidade – essa Palavra de Deus para os homens.
Em segundo lugar, a missão profética concretiza-se no sofrimento e na dor. É um tema sobejamente conhecido da literatura profética: o anúncio das propostas de Deus provoca resistências que, para o profeta, se consubstanciam, quase sempre, em dor e perseguição. No entanto, o profeta não se demite: a paixão pela Palavra sobrepõe-se ao sofrimento.
Em terceiro lugar, vem a expressão de confiança no Senhor, que não abandona aqueles a quem chama. A certeza de que não está só, mas de que tem a força de Deus, torna o profeta mais forte do que a dor, o sofrimento, a perseguição. Por isso, o profeta “não será confundido”.

ATUALIZAÇÃO

• Não sabemos, efetivamente, quem é este “servo de Jahwéh”; no entanto, os primeiros cristãos vão utilizar este texto como grelha para interpretar o mistério de Jesus: ele é a Palavra de Deus feita carne, que oferece a sua vida para trazer a salvação/libertação aos homens… A vida de Jesus realiza plenamente esse destino de dom e de entrega da vida em favor de todos; e a sua glorificação mostra que uma vida vivida deste jeito não termina no fracasso, mas na ressurreição que gera vida nova.

• Jesus, o “servo” sofredor que faz da sua vida um dom por amor, mostra aos seus seguidores o caminho: a vida, quando é posta ao serviço da libertação dos pobres e dos oprimidos, não é perdida mesmo que pareça, em termos humanos, fracassada e sem sentido. Temos a coragem de fazer da nossa vida uma entrega radical ao projeto de Deus e à libertação dos nossos irmãos? O que é que ainda entrava a nossa aceitação de uma opção deste tipo? Temos consciência de que, ao escolher este caminho, estamos a gerar vida nova, para nós e para os nossos irmãos?

• Temos consciência de que a nossa missão profética passa por sermos Palavra viva de Deus? Nas nossas palavras, nos nossos gestos, no nosso testemunho, a proposta libertadora de Deus alcança o mundo e o coração dos homens?

SALMO RESPONSORIAL – Salmo 21 (22)

Refrão: Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?

LEITURA II – Filip 2,6-11

A cidade de Filipos era uma cidade próspera, com uma população constituída maioritariamente por veteranos romanos do exército. Organizada à maneira de Roma, estava fora da jurisdição dos governantes das províncias locais e dependia diretamente do imperador; gozava, por isso, dos mesmos privilégios das cidades de Itália. A comunidade cristã, fundada por Paulo, era uma comunidade entusiasta, generosa, comprometida, sempre atenta às necessidades de Paulo e do resto da Igreja (como no caso da colecta em favor da Igreja de Jerusalém – cf. 2 Cor 8,1-5), por quem Paulo nutria um afeto especial. Apesar destes sinais positivos, não era, no entanto, uma comunidade perfeita… O desprendimento, a humildade, a simplicidade, não eram valores demasiado apreciados entre os altivos patrícios que compunham a comunidade.
É neste enquadramento que podemos situar o texto que esta leitura nos apresenta. Paulo convida os filipenses a encarnar os valores que marcaram a trajetória existencial de Cristo; para isso, utiliza um hino pré-paulino, recitado nas celebrações litúrgicas cristãs: nesse hino, ele expõe aos cristãos de Filipos o exemplo de Cristo.


Cristo Jesus – nomeado no princípio, no meio e no fim – constitui o motivo do hino. Dado que os Filipenses são cristãos – quer dizer, dado que Cristo é o protótipo a cuja imagem estão configurados – têm a iniludível obrigação de comportar-se como Cristo. Como é o exemplo de Cristo?


O hino começa por aludir subtilmente ao contraste entre Adão (o homem que reivindicou ser como Deus e lhe desobedeceu – cf. Gn 3,5.22) e Cristo (o Homem Novo que, ao orgulho e revolta de Adão, responde com a humildade e a obediência ao Pai). A atitude de Adão trouxe fracasso e morte; a atitude de Jesus trouxe exaltação e vida.
Em traços precisos, o hino define o “despojamento” (“kenosis”) de Cristo: Ele não afirmou com arrogância e orgulho a sua condição divina, mas aceitou fazer-Se homem, assumindo com humildade a condição humana, para servir, para dar a vida, para revelar totalmente aos homens o ser e o amor do Pai. Não deixou de ser Deus; mas aceitou descer até aos homens, fazer-Se servidor dos homens, para garantir vida nova para os homens. Esse “abaixamento” assumiu mesmo foros de escândalo: Jesus aceitou uma morte infamante – a morte de cruz – para nos ensinar a suprema lição do serviço, do amor radical, da entrega total da vida.


No entanto, essa entrega completa ao plano do Pai não foi uma perda nem um fracasso: a obediência e entrega de Cristo aos projetos do Pai resultaram em ressurreição e glória. Em consequência da sua obediência, do seu amor, da sua entrega, Deus fez d’Ele o “Kyrios” (“Senhor” – nome que, no Antigo Testamento, substituía o nome impronunciável de Deus); e a humanidade inteira (“os céus, a terra e os infernos”) reconhece Jesus como “o Senhor” que reina sobre toda a terra e que preside à história.
É óbvio o apelo à humildade, ao desprendimento, ao dom da vida, que Paulo aqui faz aos Filipenses e a todos os crentes: o cristão deve ter como exemplo esse Cristo, servo sofredor e humilde, que fez da sua vida um dom a todos. Esse caminho não levará ao aniquilamento, mas à glória, à vida plena.


ATUALIZAÇÃO

• Os valores que marcaram a existência de Cristo continuam a não ser demasiado apreciados no séc. XXI. De acordo com os critérios que presidem à construção do nosso mundo, os grandes “ganhadores” não são os que põem a sua vida ao serviço dos outros, com humildade e simplicidade, mas são os que enfrentam o mundo com agressividade, com autossuficiência e fazem por ser os melhores, mesmo que isso signifique não olhar a meios para passar à frente dos outros. Como pode um cristão (obrigado a viver inserido neste mundo e a ser competitivo) conviver com estes valores?


• Paulo tem consciência de que está a pedir aos seus cristãos algo realmente difícil; mas é algo que é fundamental, à luz do exemplo de Cristo. Também a nós é pedido, nestes últimos dias antes da Páscoa, um passo em frente neste difícil caminho da humildade, do serviço, do amor: será possível que, também aqui, sejamos as testemunhas da lógica de Deus?


• Os acontecimentos que, nesta semana, vamos celebrar garantem-nos que o caminho do dom da vida não é um caminho de “perdedores” e fracassados: o caminho do dom da vida conduz ao sepulcro vazio da manhã de Páscoa, à ressurreição. É um caminho que garante a vitória e a vida plena.


ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO – Filip 2,8-9

1. Louvor e glória a Vós, Jesus Cristo, Senhor.

2. Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.

3. Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.

4. Glória a Vós, Senhor, Filho do Deus vivo.

5. Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória.

6. Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.

7. A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.


Cristo obedeceu até à morte e morte de cruz.

Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes.


EVANGELHO – Mc 14,1 - 15,47


Marcos procura, no seu Evangelho, apresentar a figura de Jesus de acordo com duas grandes coordenadas. Uma, desenvolvida na primeira parte do Evangelho, apresenta Jesus como o Messias, enviado por Deus aos homens para lhes propor o Reino (cf. Mc 1,14-8,30); outra, tratada na segunda parte do Evangelho, apresenta Jesus como o Filho de Deus, que para cumprir a missão que o Pai lhe confiou tem de passar pela morte, mas a quem Deus ressuscitará (cf. Mc 8,31-16,8).

A leitura que hoje nos é proposta é o relato da paixão de Jesus. O relato, inegavelmente fundamentado em acontecimentos concretos, não é uma simples reportagem jornalística da condenação à morte de um inocente; mas é, sobretudo, uma catequese destinada a apresentar Jesus como o Filho de Deus que aceita cumprir o projeto do Pai, mesmo quando esse projecto passa por um destino de cruz. Marcos pretende que os crentes a quem a catequese se destina concluam, como o centurião romano que testemunha a paixão e morte de Jesus: “na verdade, este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39). Fica assim demonstrada a tese que Marcos, desde o início do Evangelho (cf. Mc 1,1), se propôs apresentar: Jesus, o Messias, é o Filho de Deus.

Betânia, o cenáculo, o Getsemani, o palácio do sumo-sacerdote, o pretório romano, o Gólgota e o túmulo são os cenários onde se desenrola a ação e onde vai sendo demonstrada a filiação divina de Jesus.


A morte de Jesus tem de ser entendida no contexto daquilo que foi a sua vida. Desde cedo, Jesus apercebeu-Se de que o Pai O chamava a uma missão: anunciar esse mundo novo, de justiça, de paz e de amor para todos os homens. Para concretizar este projeto, Jesus passou pelos caminhos da Palestina “fazendo o bem” e anunciando a proximidade de um mundo novo, de vida, de liberdade, de paz e de amor para todos. Ensinou que Deus era amor e que não excluía ninguém, nem mesmo os pecadores; ensinou que os leprosos, os paralíticos, os cegos não deviam ser marginalizados, pois não eram amaldiçoados por Deus; ensinou que eram os pobres e os excluídos os preferidos de Deus e aqueles que tinham um coração mais disponível para acolher o “Reino”; e avisou os “ricos” (os poderosos, os instalados) de que o egoísmo, o orgulho, a autossuficiência, o fechamento só podiam conduzir à morte.

O projeto libertador de Jesus entrou em choque – como era inevitável – com a atmosfera de egoísmo, de má vontade, de opressão que dominava o mundo. As autoridades políticas e religiosas sentiram-se incomodadas com a denúncia de Jesus: não estavam dispostas a renunciar a esses mecanismos que lhes asseguravam poder, influência, domínio, privilégios; não estavam dispostas a arriscar, a desinstalar-se e a aceitar a conversão proposta por Jesus. Por isso, prenderam Jesus, julgaram-n’O, condenaram-n’O e pregaram-n’O numa cruz.

A morte de Jesus é a consequência lógica do anúncio do “Reino”: resultou das tensões e resistências que a proposta do “Reino” provocou entre os que dominavam o mundo.
Podemos, também, dizer que a morte de Jesus é o culminar da sua vida; é a afirmação última, porém mais radical e mais verdadeira (porque marcada com sangue), daquilo que Jesus pregou com palavras e com gestos: o amor, o dom total, o serviço.
Na cruz, vemos aparecer o Homem Novo, o protótipo do homem que ama radicalmente e que faz da sua vida um dom para todos. Porque ama, este Homem Novo vai assumir como missão a luta contra o pecado – isto é, contra todas as causas objetivas que geram medo, injustiça, sofrimento, exploração e morte. Assim, a cruz mantém o dinamismo de um mundo novo – o dinamismo do “Reino”.

No relato da Paixão na versão de Marcos, não difere substancialmente das versões de Mateus e de Lucas; no entanto, há algumas coordenadas que Marcos sublinha especialmente. De entre elas, destacamos:


1. Ao longo de todo o processo, Jesus manifesta uma grande serenidade, uma grande dignidade e uma total conformação com aquilo que se está a passar. Não se trata de passividade ou de inconsciência, mas de aceitação serena de um caminho que Ele sabe que passa pela cruz. Marcos sugere, desta forma, que Jesus está perfeitamente conformado com o projeto do Pai e que a sua vontade é cumprir fiel e integralmente o plano de Deus, sem objeções ou resistências de qualquer espécie. Esta “dignidade” de Jesus diante do processo que as autoridades religiosas e políticas lhe movem é atestada em várias cenas:


Mateus e Lucas põem Jesus a interpelarÄ diretamente Judas, quando este o entrega no monte das Oliveiras (cf. Mt 26,50; Lc 22,48); mas na narração de Marcos, Jesus mantém-se silencioso e cheio de dignidade diante da traição do discípulo (cf. Mc 14,45-46), sem observações ou recriminações.

Mateus põe Jesus a desautorizarÄ Pedro quando este fere um servo do sumo-sacerdote cortando-lhe uma orelha (cf. Mt 26,52) e, na narração de Lucas, Jesus pede aos discípulos que deixem atuar os seus sequestradores (cf. Lc 22,51); mas Marcos não apresenta, no mesmo episódio, qualquer reação de Jesus (cf. Mc 14,47). Marcos apenas acrescenta que a prisão de Jesus acontece para que se cumpram as Escrituras (cf. Mc 14,49).
No tribunal judaico, quandoÄ interrogado pelo sumo-sacerdote acerca das acusações que lhe eram feitas, Jesus manteve um silêncio solene e digno (cf. Mc 14,61a), recusando defender-Se das acusações dos seus detratores.

2. Uma das teses fundamentais do Evangelho de Marcos é que Jesus é o Filho de Deus (cf. Mc 1,1). Esta ideia também está bem presente, bem sublinhada, bem desenvolvida, no relato da Paixão:

No jardim das Oliveiras, a pouco antes de ser preso, Jesus dirige-Se a Deus (cf. Mc 14,36) e chama-Lhe “Abba” (“paizinho”, “papá”). Esta apalavra não era usada nas orações hebraicas como invocação de Deus; mas era usada na intimidade familiar e expressava a grande proximidade entre um filho e o seu pai. Para a psicologia judaica, teria sido um sinal de irreverência usar uma palavra tão familiar para se dirigir a Deus. O fato de Jesus usar esta palavra, revela a comunhão que havia entre Jesus e o Pai e revela uma relação marcada pela simplicidade, pela intimidade, pela total confiança.
Apesar do silêncio digno de Jesus durante oÄ interrogatório no palácio do sumo-sacerdote, há um momento em que Jesus não hesita em esclarecer as coisas e em deixar clara a sua divindade. Quando o sumo-sacerdote Lhe perguntou diretamente se Ele era “o Messias, o Filho de Deus bendito” (Mc 14,61b), Jesus respondeu, sem subterfúgios: “Eu sou. E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Todo-poderoso e vir sobre as nuvens do céu” (Mc 14,62). A expressão “eu sou” (“egô eimi”) leva-nos ao nome de Deus no Antigo Testamento (“eu sou aquele que sou” - Ex 3,14)… É, na perspectiva do nosso evangelista, a afirmação inequívoca da dignidade divina de Jesus. A referência ao “sentar-se à direita do Todo-poderoso” e ao “vir sobre as nuvens” sublinha, também, a dignidade divina de Jesus, que um dia aparecerá no lugar de Deus, como juiz soberano da humanidade inteira. O sumo-sacerdote percebe perfeitamente o alcance da afirmação de Jesus (Ele está a arrogar-Se a condição de Filho de Deus e a prerrogativa divina por excelência – a de juiz universal); por isso, manifesta a sua indignação rasgando as vestes e condenando Jesus como blasfemo.

Marcos põe um centurião romano a dizer, junto da cruz de Jesus: “na verdade, este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39). Mais do que uma afirmação histórica, esta frase deve ser vista como uma “profissão de fé” que Marcos convida todos os crentes a fazer… Depois de tudo o que foi testemunhado ao longo do Evangelho, em geral, e no relato da paixão, em particular, a conclusão é óbvia: Jesus é mesmo o Filho de Deus que veio ao encontro dos homens para lhes apresentar uma proposta de salvação.

3. Apesar de Filho de Deus, o Jesus de Marcos é também homem e partilha da debilidade e da fragilidade da natureza humana:

No jardim das Oliveiras, pouco antes de ser preso, o Jesus de Marcos sentiu “pavor” e “angústia” (cf. Mc 14,33), como acontece com qualquer homem diante da morte violenta (Mateus é ligeiramente mais moderado e fala da “tristeza” e da “angústia” de Jesus – cf. Mt 26,37; e Lucas evita fazer qualquer referência a estes sentimentos que, sublinhando a dimensão humana de Jesus, podiam lançar dúvidas sobre a sua divindade).
No momento da morte, Jesus reza: “meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste” (Mc 15,34). A “oração” de Jesus é a “oração” de um homem que, como qualquer outro ser humano, experimenta a solidão, o abandono, o sentimento de impotência, a sensação de fracasso… e do fundo do seu drama, não compreende a ausência e a indiferença de Deus.
Não há dúvida: o Jesus apresentado por Marcos é, também, o homem/Jesus que Se solidariza com os homens, que os acompanha nos seus sofrimentos, que experimenta os seus dramas, fragilidades e debilidades.

4. Em todos os relatos da paixão, Jesus aparece a enfrentar sozinho (abandonado pelas multidões e pelos próprios discípulos) o seu destino de morte; mas Marcos sublinha especialmente a solidão de Jesus, nesses momentos dramáticos:

Lucas põe um anjo a confortar Jesus, no jardimÄ das Oliveiras (cf. Lc 22,43); Marcos não faz qualquer referência a esse momento de “consolação.

Mateus conta que a mulher de PilatosÄ intercedeu por Jesus, pedindo ao marido que não se intrometesse “no caso desse justo” (cf. Mt 27,19); Marcos não refere nenhuma interferência deste tipo no processo de Jesus.

João, além de Pedro, refere aÄ presença de um “outro discípulo conhecido do sumo-sacerdote” no palácio de Anás (Jo 18,15); Marcos, para além de Pedro (que negou Jesus três vezes), nunca refere a presença de qualquer outro dos discípulos.
Ä Lucas fala na presença de mulheres, ao longo do caminho do calvário, que “batiam no peito e se lamentavam por Ele” (Lc 23,27-31); Marcos também não conhece ninguém que se lamentasse durante o caminho percorrido por Jesus em direção ao lugar da execução (só após a morte de Jesus, Marcos observa que algumas mulheres que O seguiam e serviam quando estava na Galileia estavam ali a “contemplar de longe” – Mc 15,40-41).
Abandonado pelos discípulos, escarnecido pela multidão, condenado pelos líderes, torturado pelos soldados, Jesus percorre na solidão, no abandono, na indiferença de todos, o seu caminho de morte. O grito final de Jesus na cruz (“meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste” – Mc 15,34) pode ser o início do Salmo 22 (cf. Sal 22,2); mas é, também, expressão dramática dessa solidão que Jesus sente à sua volta.

5. Só Marcos relata o episódio do jovem não identificado que seguia Jesus envolto apenas num lençol e que fugiu nu quando os guardas o tentaram agarrar (cf. Mc 14,51-52). Para alguns comentadores do Evangelho segundo Marcos, o jovem em causa poderia ser o próprio evangelista… Trata-se, no entanto, de uma simples conjectura.
É mais provável que o episódio tenha sido introduzido por Marcos para representar plasticamente a atitude dos discípulos que, desiludidos e amedrontados diante do fracasso do projeto em que acreditaram, largaram tudo quando viram o seu líder ser preso e fugiram sem olhar para trás.


ATUALIZAÇÃO

• Celebrar a paixão e a morte de Jesus é abismar-se na contemplação de um Deus a quem o amor tornou frágil… Por amor, Ele veio ao nosso encontro, assumiu os nossos limites e fragilidades, experimentou a fome, o sono, o cansaço, conheceu a mordedura das tentações, experimentou a angústia e o pavor diante da morte; e, estendido no chão, esmagado contra a terra, atraiçoado, abandonado, incompreendido, continuou a amar. Desse amor resultou vida plena, que Ele quis repartir conosco “até ao fim dos tempos”: esta é a mais espantosa história de amor que é possível contar; ela é a boa notícia que enche de alegria o coração dos crentes.

• Contemplar a cruz onde se manifesta o amor e a entrega de Jesus significa assumir a mesma atitude que Ele assumiu e solidarizar-Se com aqueles que são crucificados neste mundo: os que sofrem violência, os que são explorados, os que são excluídos, os que são privados de direitos e de dignidade… Olhar a cruz de Jesus significa denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo, em termos de estruturas, valores, práticas, ideologias; significa evitar que os homens continuem a crucificar outros homens; significa aprender com Jesus a entregar a vida por amor… Viver deste jeito pode conduzir à morte; mas o cristão sabe que amar como Jesus é viver a partir de uma dinâmica que a morte não pode vencer: o amor gera vida nova e introduz na nossa carne os dinamismos da ressurreição.

• Um dos elementos mais destacados no relato marciano da paixão é a forma como Jesus Se comporta ao longo de todo o processo que conduz à sua morte… Ele nunca Se descontrola, nunca recua, nunca resiste, mas mantém-Se sempre sereno e digno, enfrentando o seu destino de cruz. Tal não significa que Jesus seja um herói inconsciente a quem o sofrimento e a morte não assustam, ou que Ele Se coloque na pele de um fraco que desistiu de lutar e que aceita passivamente aquilo que os outros Lhe impõem… A atitude de Jesus é a atitude de quem sabe que o Pai Lhe confiou uma missão e está decidido a cumprir essa missão, custe o que custar. Temos a mesma disponibilidade de Jesus para escutar os desafios de Deus e a mesma determinação de Jesus em concretizar esses desafios no mundo?

• A “angústia” e o “pavor” de Jesus diante da morte, o seu lamento pela solidão e pelo abandono, tornam-n’O muito “humano”, muito próximo das nossas debilidades e fragilidades. Dessa forma, é mais fácil identificarmo-nos com Ele, confiar n’Ele, segui-l’O no seu caminho do amor e da entrega. A humanidade de Jesus mostra-nos, também, que o caminho da obediência ao Pai não é um caminho impossível, reservado a super-heróis ou a deuses, mas é um caminho de homens frágeis, chamados por Deus a percorrerem, com esforço, o caminho que conduz à vida definitiva.

• A solidão de Jesus diante do sofrimento e da morte anuncia já a solidão do discípulo que percorre o caminho da cruz. Quando o discípulo procura cumprir o projeto de Deus, recusa os valores do mundo, enfrenta as forças da opressão e da morte, recebe a indiferença e o desprezo do mundo e tem de percorrer o seu caminho na mais dramática solidão. O discípulo tem de saber, no entanto, que o caminho da cruz, apesar de difícil, doloroso e solitário, não é um caminho de fracasso e de morte, mas é um caminho de libertação e de vida plena.

• A figura do jovem que, no jardim das Oliveiras, deixou o lençol que o cobria nas mãos dos soldados e fugiu pode ser figura do discípulo que, amedrontado e desiludido, abandonou Jesus. Já alguma vez viramos as costas a Jesus e ao seu projeto, seduzidos por outras propostas? O que é que nos impede, por vezes, de nos mantermos fiéis ao projeto de Jesus?

MEU ESPINHO NA CARNE

II Cor. 12,1-10

"Basta-te minha graça, porque é na fraqueza que se revela totalmente a minha força!"

A verdade é uma só: "Em todas as coisas somos mais que vencedores por Aquele que nos amou" (Rom. 8,37). O problema é só uma visão muitas vezes turvada pelos nossos desejos e só nossas aspirações. Santa Teresa d`Ávila nos diz: "Ponde os olhos no crucificado e tudo vos parecerá pouco!" Paulo conhece sua condição pobre, fraco, miserável e declara: "Tenho um espinho na carne".

Não sabemos o que era tal espinho na carne de Paulo, porque ele não o declara. Alguns sugeriram que pode ter sido malária, epilepsia ou mais provável uma enfermidade nos olhos (cf Gal. 4,13-15). Qualquer que fosse o caso era um problema crônico que o debilitava, às vezes, impedindo-o de trabalhar mais pela expansão do Evangelho. Esse espinho era um impedimento para o seu ministério, e ela orava pedindo a remoção, para um bem maior, para expandir o Evangelho e sua ação missionária, não para um bem próprio. Mas Deus se recusou a fazê-lo.
Paulo era uma pessoa auto-suficiente. Por isso esse espinho deve ter trazido muitas dificuldades. Esse espinho mantinha Paulo humilde, lembrava-lhe de sua necessidade de contato constante com Deus e beneficiava aqueles que estavam ao seu redor, pois viam Deus trabalhando em sua vida e transbordando de sua vida.

O próprio Paulo reconheceu o bem deste espinho: "Não me levasse ao orgulho... E me livrar do perigo da vaidade". Qual é o teu espinho hoje, neste momento ou um espinho que a tempo você se depara com ele. Escute agora as palavras do Senhor: "Basta-te minha graça, porque o meu poder se aperfeiçoará na tua fraqueza".

Nosso maior problema é que ficamos presos na remoção dos nossos espinhos, é assim que ficamos paralisados. É preciso ficar atento não na remoção dos espinhos, mas ao "Poder de Deus" ser mostrados em nossas fraquezas. À medida que reconhecemos nossas limitações, passamos a depender mais de Deus e não de nossa própria força ou capacidades, esforço e talentos. Nossas limitações não só nos ajudam a desenvolver o caráter cristão como também aprofundam nossa contemplação, nosso estar com Deus.

Reconheço que dependo completamente de Deus e que todas as fibras do meu ser precisam dele, ou seja, que dentro de mim não existe nada que eu não tenha recebido dele.

Deus não tirou o espinho de Paulo, fez coisa melhor: passou a dirigir aquele espinho e o fez servo de Paulo. Muitas vezes o ministério de espinhos tem sido muito mais útil aos homens do que o ministério de tronos. Na verdade o trono de Deus em nossas vidas é feito de nossas misérias. Amados filhos, quando você se deparar com seu espinho na carne, quando passar por aquele terrível vale de sofrimentos, quando aquela ofensa o atingir e pensar que tudo está acabado, lembre-se: confie em Deus de tal forma que sairás bem mais rico do que entrou! Ser mais do que vencedor é tomar do inimigo os despojos e apropriar-se deles. A arma que ele havia preparado para sua derrota, tome-a para si, e use-a para o seu próprio bem.

Oração:

Querido Deus creio que quando sou fraco aí é que sou forte, pois tudo posso naquele que me conforta e fortalece. Senhor, quando a cegueira me atingir possa eu rezar e confiar: "Senhor, eu aceito das Tuas mãos este Talento da cegueira. Ajuda-me a usa-lo para a Tua glória, para que na Tua vinda possas receber com juros, o que é Teu".
Ajuda-me neta cegueira a deixar-me ser conduzido. Creio que em Ti sou mais que vencedor e quando fraco aí é que sua força me encoraja: "Basta tua graça que se aperfeiçoa na minha fraqueza!"

Creio Senhor.
Pe.Emílio Carlos Mancini+
A BELEZA DA CRUZ

Ó preciosíssimo dom da cruz! Vede o esplendor de sua forma! Não mostra uma figura mesclada de bem e de mal como aquela árvore do Paraíso, mas totalmente bela e excelente à vista e ao paladar. É uma árvore geradora de vida, não de morte; ilumina, não cobre de trevas; introduz no Paraíso, dele não expulsa; árvore em que Cristo, qual rei, com bravura sobe e vence o demônio, detentor do poder da morte e liberta o gênero humano da escravidão tirânica.

Sobre esta árvore o Senhor, qual valente guerreiro, ferido durante o combate em suas mãos, pés e lábios divinos, curou as chagas do pecado e nossa natureza ferida pelo mortífero dragão.

Mortos no princípio pela árvore, agora, pela árvore, recuperamos a vida; enganados antes pela árvore, na árvore repelimos a astuciosa serpente. Na verdade, novas e extraordinárias mudanças. Em vez da morte, dá-se a vida; em lugar da corrupção, a incorrupção; do opróbrio, a glória.

Tinha razão de exclamar o santo Apóstolo: “Quanto a mim, não quero gloriar-me a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por quem o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo!” Pois a máxima sabedoria, aquela que floresceu da cruz, desafia a jactância da sabedoria do mundo e a arrogância da tolice. O tronco de todos os bens, elevado na cruz, extirpou todos os brotos da maldade e da injustiça.

Já as prefigurações desta árvore desde o princípio do mundo foram sinais e indícios de fatos em extremo admiráveis. Veja, quem tem vontade de saber. Noé, com seus filhos e as esposas, e com todas as espécies de animais, não se livrou da morte no dilúvio decretado por Deus numa pequena quantidade de madeira? E a vara de Moisés? Não é figura da cruz? Ora mudando a água em sangue, ora devorando as fictícias serpentes dos magos, ora dividindo o mar com seu toque, ora fazendo voltar as ondas a seu lugar e submergindo os inimigos. Mas sempre salvando aquele povo escolhido. Ainda figura da cruz, a vara de Aarão reverdecendo no mesmo dia, revelando o sacerdote legítimo.

Abraão também prefigurou-a ao pôr o filho amarrado sobre o feixe de lenha. Pela cruz a morte foi destruída e Adão recuperou a vida. Da cruz gloria-se todo apóstolo, por ela todo mártir é coroado, todo justo é santificado. Pela cruz revestimo-nos de Cristo, despojamo-nos do velho homem. Pela cruz, nós, ovelhas de Cristo, nos reunimos em um só rebanho, destinados que somos aos campos celestes.


Dos sermões de São Teodoro Estudita,

Abade, do século IX

O HOMEM VELHO E O HOMEM NOVO

O Homem Velho e o Homem Novo, como são evidentes, não são “partes” do Ser Humano, mas antes modos concretos de viver.
O que está sempre em causa, para o Apóstolo, é a adesão ao Projeto Salvador de Deus revelado em Jesus Cristo.
Por isso é que esta era a compreensão do batismo que, como sabes, era celebrado apenas por adultos – depois de um longo catecumenato – na vigília pascal.
O grande símbolo batismal era exatamente a morte do Homem Velho (no despir-se da sua roupa e mergulhar-se) para renascer Homem Novo em Jesus Ressuscitado (no elevar-se da água, ser ungido com óleo – símbolo bíblico do Espírito Santo – e ser revestido com uma túnica branca, símbolo de Ressurreição), o Homem Novo e princípio da Nova Humanidade.

Na linguagem do Apóstolo Paulo, o Homem Velho é o Homem escravizado no seu íntimo pelo domínio da Lei judaica e do pecado. O Homem Novo é o Homem animado pelo Espírito de Jesus Ressuscitado que liberta da escravidão da Lei e recria do pecado.
Viver a vida no Espírito de Cristo é construir o Homem Novo. Esta “construção” é a dinâmica de configuração da nossa Vida com a Vida de Jesus de modo a podermos dizer como Paulo: “Nós temos a mentalidade de Cristo!” (1 Cor 2, 16)

Por ser uma permanente configuração com Jesus, a meta desta construção coincide com a própria plenitude da Vida, que ultrapassa a fronteira da morte. “Ainda que o Homem Exterior se degrade e definhe, o Homem Interior permanentemente se renova e cresce!” (2 Cor 4, 16)
O crescimento interior é sempre um processo de conversão, e a conversão exige luta interior. Ao falar da Vida no Espírito de Cristo, Paulo diz que a Carne (Homem Exterior ou Velho) tem desejos contrários ao Espírito (Homem Interior ou Novo), e o Espírito desejos contrários à Carne, porque são duas realidades em luta uma com a outra…” (Gal 5, 17)

Então, como acontece quando vemos um combate de boxe na televisão, vamos ver as características dos dois “lutadores”: num canto do ringue, o Homem Velho; no outro canto, o Homem Novo…

O Homem Velho é egoísta. Pensa sempre em si e no seu interesse, mesmo quando faz coisas boas. Se não lhe agradecem devidamente, sente-se ofendido…

O Homem Velho não sabe o que é a gratuidade porque procura sempre compensações e procura-se apenas a si próprio nas relações com os outros…

O Homem Velho não confia nas pessoas porque parte sempre do princípio que elas o podem magoar ou pôr em causa. Por isso, assume muitas atitudes ríspidas e frias, que é uma maneira de manter as pessoas à distância…

O Homem Velho é violento porque está sempre a defender-se e a defender o seu espaço, as suas certezas, as suas opiniões e os seus privilégios…

O Homem Velho, apesar disto, é digno de pena, porque está sempre a vitimizar-se do “mal” que o mundo inteiro arquiteta contra ele. Sente-se sempre vítima da sua história injusta e das pessoas que o rodeiam e só lhe fazem mal…

O Homem Velho não sabe perdoar, porque isso implica amar com o Coração inteiro. Às vezes consegue “desculpar” algumas coisas, mas guarda tudo num “baú escondido” da sua mente e usa isso como arma de arremesso em alturas de tensão ou confronto…

O Homem Velho é uma pessoa azeda porque não é capaz de olhar nada com otimismo nem ninguém com Confiança…

O Homem Velho é injusto, porque está sempre a exigir dos outros aquilo que não lhes dá e a implorar da Vida aquilo que ele se recusa a construir, por medo ou por preguiça…

O Homem Velho é mesquinho, porque tem uma dificuldade enorme em olhar à sua volta, perceber as necessidades dos outros, interpretar os seus sentimentos ou corresponder aos seus desejos. Quando, às vezes, se dá conta disso, opta por baixar a cabeça, colocar as mãos nos bolsos e seguir adiante, porque se sente incomodado…

O Homem Velho adora dizer “Não é nada comigo!”, mesmo quando está em causa o bem dos irmãos, mas passado um bocado já se está a queixar que as coisas estão todas mal porque ninguém faz nada…

O Homem Velho diz “Eu estou bem!” quando consegue chegar à total indiferença e reduzir o mundo ao tamanho do seu casulo…

O Homem Velho é escravo de mil coisas sem o saber! Não é capaz de comprometer a Vida por nada, não tem causas que o apaixonem nem motivos que o façam correr em direção a nada. Sempre que o Homem Velho corre é para fugir de alguma coisa…

O Homem Velho vive assustado porque, no fundo, a solidão acaba sempre por doer e o egoísmo, quando o apanha sozinho e desprotegido, atira-lhe à cara que assim nunca chegará a ser feliz…

O Homem Velho não é criativo, porque não acredita no futuro nem aceita que aquilo que faz possa ser importante para alguém. Tem medo do que é novo e, sobretudo, tem medo de fracassar…

O Homem Velho não gosta do Evangelho de Jesus, porque não conhece nada mais perigoso e comprometedor do que isso. Não gosta de Jesus de Nazaré porque o centro do seu Evangelho é a construção do Reino de Deus, que tem a ver com a emergência da justiça e da igualdade pelo caminho do amor fraterno e do perdão recíproco. O Homem Velho prefere o outro “Jesus”, aquele “Senhor lá no alto do céu” ao qual é possível “amar” sem que seja preciso amar mais ninguém… ao qual é possível “prestar culto” sem ser preciso servir mais ninguém…

O Homem Velho não gosta do Deus de Jesus, Aquele que em Si próprio é Comunhão Amorosa Familiar. Prefere o “deus todo-poderoso” que, tal como ele, também não confia em ninguém nem ama de verdade mas apenas se mantém à distância e julga…

O Homem Velho não gosta nada que lhe falem da Igreja como Comunidade, porque isso é uma enorme perda de tempo e, sobretudo, uma fonte de sofrimento, porque a Comunidade põe em causa a sua maneira de estar, de acreditar e de rezar…

O Homem Velho não é feliz… E continuará a não ser enquanto perder o tempo a culpar os outros disso. É uma das manhas do egoísmo, esta de querer que tudo e todos mudem para que nós sejamos diferentes…

O Homem Velho não está aberto ao Espírito Santo porque não está aberto aos irmãos! A Palavra de Deus não acontece no seu íntimo porque está fechado às mediações!

O Homem Velho tem os dias contados…

O Homem Novo tem em Jesus de Nazaré a sua medida! Ama os seus gestos, dá importância às suas palavras e procura os seus critérios. Por isso se pergunta muitas vezes: “Nesta situação que estou a viver, como é que Jesus faria?!”

O Homem Novo tem o Coração aberto à acção do Espírito Santo e não Lhe impõe nenhuma das suas certezas. Por isso está em permanente dinâmica de Conversão e Renascimento interior…

O Homem Novo tem a Mente desperta para que a Palavra de Deus aconteça nele de maneira livre e nova. Por isso, a Palavra torna-se nele Sabedoria e Verdade…

O Homem Novo sabe que ser pessoa é ser criador de si próprio à imagem e semelhança de Deus, colaborador do Espírito Santo na formação da sua própria consciência moldada pelo amor e instrumento de humanização para os irmãos…

O Homem Novo conhece e ama o Deus de Jesus Cristo como Amor Trinitário e vive com uma imensa gratidão o dom da Nova e Eterna Aliança pela qual a Família Humana foi assumida na Família Divina…

O Homem Novo, configurado com Jesus e dinamizado pelo Espírito, chama a Deus-Pai seu “Abba”…

O Homem Novo tem muitas atitudes parecidas com Jesus e revela nos seus gestos e palavras muita da sabedoria que Jesus colocava nas suas parábolas…

O Homem Novo sabe perdoar sem ser preciso que se lhe peça desculpa, porque o seu perdão precede o arrependimento do outro…

O Homem Novo ama de verdade, e por isso não se põe no centro das suas ações e decisões…

O Homem Novo gosta de dizer “nós”…

O Homem Novo é acolhedor e tolerante. Não julga as pessoas pela aparência nem lhes põe etiquetas ao fim de cinco minutos ou logo ao primeiro equívoco…

O Homem Novo é sensato porque sabe discernir as situações que vive e por isso sabe quando deve falar e quando deve calar, quando deve agir e quando deve esperar…

O Homem Novo não se deixa vergar sob nenhuma espécie de opressão ou domínio. Olha sempre nos olhos toda a gente! Por isso se debruça para ir ao encontro dos caídos, mas não se verga diante dos altivos e poderosos…

O Homem Novo é livre, porque é capaz de entregar a Vida até as últimas conseqüências pelas causas em que acredita e pelas pessoas que ama…

O Homem Novo é sereno, porque olha com Sabedoria o desenrolar da história e não se deixa iludir pela superficialidade das aparências nem pelos slogans gritados pelas multidões…

O Homem Novo não se deixa escravizar pelas coisas que tem, nem por aquelas que quereria ter, porque já percebeu que o Essencial da Vida se constrói ao nível do Coração…

O Homem Novo tem horizontes de Vida Eterna e Ressurreição. Acredita que a palavra definitiva da Vida pertence a Deus e, por isso, é uma Palavra de Ressurreição que ultrapassa a morte e transfigura a história…

O Homem Novo acredita que nos construímos Humanos para sermos Divinizados…

O Homem Novo acredita tudo isto, rejubila com tudo isto, celebra-o, aprofunda-o e partilha-o, mas não o impõe a ninguém…

O Homem Novo é amável, ou seja, é uma pessoa digna de ser amada porque se torna fonte de Vida e riqueza para aqueles que com ele se encontram de Coração acolhedor…

O Homem Novo é também provocador e sinal de contradição, porque vive a Verdade com uma coerência inquestionável e põe em causa muitos dos que o rodeiam e não vivem na Verdade…

O Homem Novo faz-se acompanhar dos pobres e defende o direito dos oprimidos, porque acredita num mundo de diferentes. Como sempre, aqueles que acreditam são os únicos que o constroem, e esses chamam-se “Bem Aventurados”…

O Homem Novo às vezes chora e sofre, quer por causa da compaixão com os seus irmãos, quer por causa da violência que os opressores às vezes exercem sobre ele. Mas nunca se resigna, porque sabe em quem tem assente a sua Esperança e enraizada a sua Vida…

O Homem Novo é humilde. Por isso conhece perfeitamente as suas capacidades e reconhece serenamente que nem tudo depende apenas de si. Acredita nas suas capacidades, assume as limitações tranquilamente, faz a sua parte e trata todas as pessoas como iguais…

O Homem Novo é audaz e pioneiro quando chega a hora de inventar o futuro porque acredita no sucesso dos seus esforços, na presença do Espírito Santo e na generosidade e verdade dos irmãos…

O Homem Novo acaba sempre por ser mais forte…


Pe.Emílio Carlos

IRMÃOS, SE ALGUÉM FOR SURPREENDIDO NALGUMA FALTA, VÓS, QUE SOIS ESPIRITUAIS, CORRIGI-O COM ESPÍRITO DE BRANDURA

Gál 6,1-5


A Bíblia muitas vezes ressalta o interesse que os cristãos devem ter pelo bem-estar espiritual dos irmãos. "Meus irmãos se algum entre vós se desviar da verdade e alguém o converter, sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho errado salvará da morte a alma dele e cobrirá multidão de pecados" (Tiago 5,19-20). Talvez a reação mais natural diante de um irmão que peca seja abandoná-lo, achando que cada pessoa deve tomar conta de si mesma. Mas as Escrituras ensinam que os cristãos são uma família, um corpo, e cada membro deve preocupar-se intensamente com o crescimento espiritual dos outros membros.

A Palavra ensina que deve haver distinção entre os irmãos que pecam. Nem todos os pecados refletem o mesmo tipo de coração e, portanto, assim como cada doença física requer um tratamento diferente, o mesmo acontece com as enfermidades espirituais. "E compadecei-vos alguns que estão na dúvida; salvai-os, arrebatando-os do fogo; quanto a outros, sede também compassivos em temor, detestando até a roupa contaminada pela carne" (Judas 22-23). "Exortamo-vos, também, irmãos, a que admoesteis os insubmissos, consoleis os desanimados, ampareis os fracos e sejais longânimes para com todos" (1 Tessalonicenses 5,14). Esses textos agrupam em várias categorias os que estão em pecado, mostrando o tipo de ajuda necessária para cada caso.

"Irmãos, se alguém for surpreendido nalguma falta, vós, que sois espirituais, corrigi-o com espírito de brandura; e guarda-te para que não sejas também tentado" (Gálatas 6,1). Em alguns casos, o pecado pega o homem num momento de fraqueza e o enlaça. Nessa situação, outros irmãos devem conversar com aquele que tropeçou e ajudá-lo a se erguer novamente. Isso deve ser feito com um espírito de mansidão e delicadeza. Não ajuda muito repreender com severidade. É preciso que pensemos como gostaríamos de ser tratados numa situação dessas, porque todos tropeçamos e caímos no pecado uma vez ou outra, e necessitaremos que os nossos irmãos com mansidão nos façam voltar à fidelidade no serviço do Senhor. Paulo incentivou Timóteo a fazer apelos às pessoas e não repreendê-las de uma maneira áspera (I Timóteo 5,1-2). Áqüila e Priscila mostraram sabedoria ao conversarem com Apolo em particular para ajudá-lo a aprender o caminho de Deus com mais precisão (Atos 18, 24-26). O objetivo é recuperar o pecador e não apenas "cumprir o nosso dever" de admoestá-lo.


Pe.Emílio Carlos +