Aprender o caminho,
caminhando
A nossa vida é caracterizada pela
dimensão do caminhar: de muitas e variadas formas fazemos essa experiência do
caminho – umas vezes a sós, outras acompanhados; nalguns casos com gosto,
noutras situações a custo e em sofrimento; umas vezes com ritmo e leveza,
outras com sabor a luta; por vezes tendo em vista a meta, noutras titubeando em
tropeções; umas vezes descalços e noutros casos usando um calçado mais ou menos
consentâneo com o percurso...
É sobre a vivência do nosso caminhar –
sobretudo em contexto pascal – que deixamos breves referências ao nosso
itinerário de vida, lendo, analisando e interpretando a nossa condição de
caminhantes e segundo o calçado que de nós revela as condições psicológicas e
espirituais da caminhada... rumo à Páscoa definitiva.
= Pé direito/pé esquerdo – neste equilíbrio de ritmo podemos enquadrar as coisas corretas (pé direito) e os aspectos menos bons (pé esquerdo), que nos acontecem e que nós fazemos acontecer, onde Deus está, de quantas formas e feitios, a conduzir-nos ou a corrigir-nos... sempre numa leitura teológica do nosso existir. Quantos passos bem-andados e quantos outros por maus caminhos! Tudo faz parte da história de cada um!...
= Pé descalço/pé calçado – estamos a nu sempre que experimentamos a rudeza do chão que pisamos, seja de terra dura e fria ou o fofo e alcatifado, sem precalços ou pejado de tropeços... O pé descalço sente as agruras do caminho, mesmo que ele seja mais ou menos sem obstáculos, enquanto o calçado com que envolvemos os nossos pés tem de estar à altura do momento que vivemos, sentimos ou percorremos... pois, sem o calçado apropriado, corremos o risco de não sermos capazes de caminhar corretamente.
= Cada categoria de calçado revela, no
entanto, quem o usa, muito para além das possibilidades econômicas, ele revela
a personalidade que através dele se manifesta... mesmo que de forma
inconsciente:
Sandálias- traduzem uma certa fragilidade, despojamento e leveza, que, por vezes, se usam em épocas de lazer, como em férias, ou ainda em espaços de maior exposição ao sol, deixando que os pés andem mais soltos e sem constrangimento;
Botas- embora envolvendo
alguma rudeza relacionada com o trabalho e com as condições para enfrentarmos
as condições da vida, do tempo, do ambiente adverso e mesmo das modas –
sobretudo no contexto feminino – ou dos espaços onde se desenrolada a tarefa da
vida... podemos ver a força e a segurança, na diversidade de ações, de momentos
e de condicionamentos;
Sapatos – masculinos ou femininos – são
mais do que meros adereços de circunstância, pois podem ser fator de afirmação
no contexto social em que cada um está inserido, tornando-se recurso muito para
além das capacidades econômicas... Parafraseando, diremos: ‘Diz-me o que
calças, que te direi quem és’ – poderia ser o aforisma para nós entendermos,
nós enquadrarmos e nós reconhecermos na sociedade atual;
Sapatilhas
ou ‘tênis’ – numa alusão à prática desportiva, pois também nesta área
podemos encontrar uma razoável diversidade de tipologias... Bastará observar um
jogo de futebol, onde nem todos calçam da mesma forma, quase parecendo mais um
desfile de marcas do que a constituição de uma equipe.
Pantufas e chinelos –
próprios para o conforto de casa e inseridos num ambiente de descontração e de
intimidade, podemos relacionar estas formas de calçado com a pacatez de uma
vida quase recatada no lar ou num espaço de maior recolhimento... que poderá
ser mais do que o final da vida, mas antes uma oportunidade de meditação sobre
o sentido último (que não meramente derradeiro) da existência humana e social.
Ora, na nossa caminhada pascal rumo à
celebração da Páscoa definitiva temos, segundo os vários intervenientes uma
multiplicidade de referências, atendendo à sua forma da calçar: os pés
descalços de Jesus crucificado, as botas rudes dos soldados romanos, as
sandálias frágeis do pescador envergonhado Pedro, a subtileza feminina na
consolação das mulheres de Jerusalém, a capacidade de seguimento (mais do que
atlético) de Simão cireneu... para além do pé esquerdo da traição de Judas ou
ainda os pés arrastados após a morte e sepultura de Jesus...
Caminhemos com serenidade e exigência
até à Pascoa da ressurreição, anunciando Jesus vivo ao mundo de hoje!
Pe.Emílio Carlos +
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