Um certo dia em minha oração
pessoal, lectio divina tomei o texto de Jesus no horto das Oliveiras em sua
agonia mortal senti um apelo insistente do Senhor a oferecer-me com Ele como vítima
ao amor misericordioso de Deus. (Mat 26,36-46; Jo 17).
Quando me deparei estava diante de
um apelo de Jesus como aquele na Cruz: “Tenho sede!” como se Jesus suplicasse
para mim muitas almas para serem salvas, resgatadas do inferno. Na solidão em meu
isolamento, levou-me Nosso Senhor a
fazer como que um voto de sofrer, especialmente, por todas as pessoas que ate
ao fim do mundo viessem a abusar das graças de salvação eterna.
Qualquer batizado é alguém identificado
e chamado a configuração com Cristo, ou seja, sacerdote e vítima com Ele.
Falamos hoje muito, depois do Concílio Vaticano II, do sacerdócio comum dos fiéis,
todos sacerdotes pelo batismo, inseridos em Cristo.
Temos falado menos da dimensão
batismal de ser vítima com Ele, mas esta dimensão radica na graça do batismo
que já contém em gérmen toda a vida e santidade cristãs, todas as dimensões do
ser e do agir cristão. Unidos a Jesus, ao seu sacrifício redentor, onde Ele foi
a Vítima na cruz, no extremo do amor, para remir a humanidade, podemos inserir
n'Ele a nossa oferta e realizar o apelo de S. Paulo: «ser vítimas vivas, santas
e agradáveis a Deus em oferenda permanente» (cfr. Rom 12, 1).
Ser vítima, como vocação de todo o cristão,
deve entender-se como um ato de amor, uma vida vivida em amor.
De fato, o que nos salvou não foi o
sofrimento, mas o amor com que Jesus sofreu. Amor que o levou a dar a vida, mas a
maior prova de amor é exatamente essa, ou seja, a capacidade de dar a vida pelos
outros. Neste sentido, parece não ser reto unir a palavra vitima e a realidade
de «ser vítima com dores, sangue, sofrimento, doenças dolorosas, etc.
Ser vítima é ser oferta em amor de
tudo o que se vive, se faz, se reza.
É evidente que o amor de Jesus foi um amor
crucificado e que o nosso amor por Ele e pelos outros tem de passar pela cruz.
Mas o que conta, o que salva, o que liberta é o amor com que se vive, com que
se toma a cruz, cada dia, para o seguir e para o imitar.
Ao usar estas duas palavras, como
que místicas, misteriosas em relação a tornar-se vítima de amor e assumir a
dor: amor e dor, dor e amor.
Santa Madre Teresa de Jesus nos fala:
“alegria e dor andam juntas”. Na vida de amor, a dor e a alegria se revezam
sempre. A alegria e a dor crescem sempre no terreno do amor. "A coragem em sofrer muito ou
sofrer pouco está sempre na proporção do amor” (Santa Madre Teresa de Jesus)
“Eu queria só te dizer que me
fizesse entender o que é a vida...Que alegria e dor andam juntas em mim, mas o
que conta é o amor.
Vem tomar posse de mim, vencer
minha impotência, o meu nada, Senhor.
Ah! tudo quero te dar, mesmo o que
não tenho, mesmo o que não sou.
Pois o que conta é o amor! Amor!
faz do meu nada amor! Só amor... amor! faz do meu nada amor!
Sei que viver é amar, que amar é
sofrer, que amar é se dar.
Ah, bem pequena eu sou, como,
então, desejar só viver de amor?
Mas tudo podes em mim.
Um teu único olhar tudo em mim
mudará.
E, não sendo mais do que sou, sendo
toda amor, viverei para sempre ao teu lado Senhor.
Sendo toda amor... faz do meu nada
amor!Só amor... amor! faz do meu nada amor!
Ó Senhor, experimento tanta alegria
ao pensar que as minhas infidelidades azem
com que melhor conheça a vossa misericórdia, que sinto suavizar-se a dor pelas
graves ofensas que vos fiz.” (Santa Madre Teresa de Jesus).
Não tenha medo das dores que o amor
lhe trará, mas anime-se diante da perspectiva das alegrias que você receberá.
No amor você aprenderá a sofrer e o bálsamo das alegrias suavizará seus
sofrimentos.
Amar sofrendo, sofrer amando. Amar
sofrendo, oferecendo tudo para que Deus seja mais amado, mais conhecido. Sofrer por amor d'Ele, pois sabemo-Lo
ofendido, desprezado, insultado: pecado, blasfêmias, sacrilégios, ódios satânicos
contra Deus. E quem ama, sofre por ver e saber que Ele não é amado. E deseja
sofrer com Ele, identificar-se com Ele, que foi a cruz e a morte, o amor leva a
identificação com o Amado, e se o Amado é Jesus Crucificado, no momento máximo
do seu amor, que foi a cruz e a morte, então há o desejo de ser identificado
com Ele, de ser como Ele, de ser vítima com Ele.
Mas o amor leva a pensar também no
mundo, nos homens e mulheres que sofrem, nos «cristos» sofredores, os
crucificados de hoje, nos homens que não o conhecem, não o amam, nos pecadores
que não aproveitam as graças de Deus, nas pessoas que vivem em pecado, nas
estruturas da sociedade que geram dor, mal, pecado, injustiça, mentira, morte,
etc. Então, por desejo nascido do amor, quer fazer-se tudo para ajudar a
humanidade a encontrar caminhos de salvação, de paz, de amor. E, por amor,
aceita-se sofrer para que todos vivam do Amor
infinito de Deus, ou seja, unimo-nos a Jesus que, na Cruz, amou o Pai, foi
Vítima que Se ofereceu para que o mundo tivesse vida. E amou os homens para dar
a vida por todos, para a todos salvar e remir.
Com esta visão e compreensão do mistério,
como alma vítima quero afirmar: Assim como Jesus fez seus os pecados dos
homens, imolando-Se por eles, como Vítima, também nós, em união com Maria junto
a cruz, queremos oferecer-nos com Jesus e em Jesus, como se nós e Ele fossemos
um só, pela salvação do mundo.
Não se trata, pois, de buscar sofrimentos, de aumentar penitências,
de amar e desejar a dor pela dor. Isso não
seria nem humano nem cristão.
A chave do problema está no amor que se coloca em cada
palavra, em cada gesto, em cada oração, em cada trabalho, em cada momento da vida,
seja ele qual for. Claro que não está fora deste horizonte o sofrimento.
Jesus foi muito claro ao dizer que o discípulo não é maior
que o Mestre e ao convidar-nos a pegar na cruz cada dia.
Aliás, é nesta perspectiva que Ele
nos fala no grão de trigo que precisa de «morrer» para gerar vida. Sendo assim,
é reto pensar que as nossas dores, físicas ou morais, os nossos incômodos, os
nossos sofrimentos, os nossos cansaços, etc., tudo pode e deve ser oferecido
com Jesus Vítima, tudo tem valor redentor unido a Ele. Costumo dizer que tudo
tem peso de Eternidade. Não é preciso buscar o sofrimento. É preciso sim, é urgente
aceitá-lo com generosidade sempre que ele nos bate a porta. Com amor saber
sofrer, com amor aceitar o sofrimento.
Amar sofrendo e sofrer amando.
Sofrer por amor da humanidade, para
colaborar na conversão do mundo e na salvação de todos os homens e do homem
todo.
Pe.Emílio Carlos +
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