2º DOMINGO
DA PÁSCOA
07 de abril de 2013
Meu Senhor e Meu Deus ! Creio |
QUEM É TOMÉ?
TOMÉ SOMOS
TODOS NÓS!
|
Leituras:
Atos 5, 12-16;
Salmos
117 (118), 2-4.22-24.25-27a (R/1);
Apocalipse 1, 9-11a.12-13.17-19;
João 20,
19-31.
COR LITÚRGICA: BRANCA OU DOURADA
O
Senhor ressuscitou! Aleluia! Nesta eucaristia, sabemos que é impossível
vivermos a verdadeira fé cristã sem a participação da comunidade. Nossa
celebração é memória desta presença viva de Jesus ressuscitado. Hoje,
comemoramos também o “Domingo da Divina Misericórdia”, pois Cristo nos salvou e
santificou no mais puro amor.
1. Situando-nos brevemente
No tempo da Páscoa, a comunidade cristã tem a oportunidade de
aprofundar o evento da salvação, cuja memória desponta de modo pungente na
liturgia desse tempo. Segundo o Ritual de Iniciação de Adultos, o tempo pascal
é chamado de “Tempo da Mistagogia”, querendo com isso chamar a atenção sobre os
mistérios (sacramentos) celebrados na vigília pascal, que tem seu prolongamento
nas celebrações dominicais.
De fato, a antífona de entrada, dirigindo-se aos neófitos, como
a recém nascidos, e retomando o texto da Primeira Carta de Pedro, remete a
comunidade ao novo nascimento celebrado na Noite Santa. Mas a referência não é
exclusiva aos novos, como também aos discípulos e discípulas já batizados que
foram chamados ao reino de Deus, conforme explicita a segunda antífona, opção
para as comunidades que não celebraram a iniciação na Vigília.
Convém chamar a atenção para o fato de que a vida nova não está
isenta de dificuldades. O cristão não é tirado do mundo pelos sacramentos que
celebra, mas situado nele de uma maneira especial: como comunidade que aponta e
evoca uma realidade nova, mostrando aos demais que a salvação alcançada em
Cristo se realiza e se prolonga naqueles que aderem a Ele (fé).
Pela comunhão com os irmãos, pela promoção da justiça e da
libertação, pelo cultivo de utopias e de esperanças de vida e de inclusão, a
comunidade dos fiéis torna-se sinal da Páscoa, sinal da vida nova que Deus quer
e preparou para todos. É possível enumerar vários acontecimentos que confirmam a
convivência entre a realidade e a realização da Páscoa e os fatos e situações
que indicam a direção contrária: violência, medo, fome, miséria, desastres, corrupção
e maldade de todo tipo.
Contudo, o fiel é chamado a ver além e através dessas
realidades: a vitória de Cristo sobre a morte é também vitória sobre o pecado
do mundo e seus efeitos. Os males que atravessam a nossa existência se tornam
para os que vêem, pela fé, sinais de realidade maior e melhor.
2. Recordando a Palavra
O evangelho narra manifestação de Jesus ressuscitado aos
discípulos. Alguns elementos compõem um cenário pascal que indica o clima
vivido pela comunidade de fé: primeiro dia da semana (Domingo), comunidade
reunida, alegria e paz da parte de Cristo aos discípulos.
Duas vezes Jesus proclama o seu desejo para a comunidade dos
seus discípulos: “A paz esteja com vocês”. O nosso termo “paz” procura traduzir
- embora de uma maneira inadequada - o termo hebraico “Shalom!”, que é muito
mais do que “paz”, conforme o nosso mundo a compreende. “Shalom”, e palavras
derivadas, ocorrem mais de 350 vezes no Antigo Testamento. Podemos dizer que o
Shalom tem dois aspectos inseparáveis - é dom e desafio para os cristãos. É
dom, porque somente Deus pode dá-la; é desafio, pois tem que ser construído dia
após dia na vida pessoal, familiar, comunitária e social de cada pessoa.
Mas outros elementos entrecruzam essa experiência, fazendo um
inegável contraste: o anoitecer como sinal das dificuldades vividas, o medo dos
judeus, as portas fechadas, a descrença de alguns membros simbolizada pela
falta de fé de Tomé e, igualmente, o distanciamento da comunidade por parte dos
discípulos, o que gerou dúvida e descrédito sobre os irmãos. Todos esses
elementos giram em torno de testemunho da comunidade.
Mas a perícope, ao final, chama a atenção sobre os sinais
realizados por Jesus (cf. vv. 30-31) que são escritos para suscitar a fé da
comunidade. Os sinais não são milagres, são símbolos: realidades sensíveis que
remetem às dimensões invisíveis e superiores (Cf. LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho segundo João IV
(Capítulo 18-21). Col. Bíblia Loyola. 16.ed. São Paulo: Loyola,
1998.pp.183-184).
Nota-se certa insistência no relato nos sinais da paixão: com
forte negação, Tomé exige tocar os ferimentos das mãos e do lado de Cristo, a
fim de crer. Na segunda manifestação, Jesus o convida a tocar, tal qual exigido,
apontando, contudo, o caminho inverso para a fé: crer sem ver. As chagas são os
sinais em questão: marcas da morte no corpo do Vivente.
A dúvida pode assim ser compreendida: “o judeu Tomé não ignora
que algum dia se dará a ressurreição escatológica de todos os seres humanos,
mas como admitir que o Crucificado tenha entrado desde já na Vida? Seria
preciso verificar isso tocando suas chagas!” (Cf. LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho segundo João – IV.
P.186).
Jesus não lhe nega desejo de tocar os sinais da paixão,
convidando-o a estender as mãos, mas o exorta a uma fé mais madura. Por trás,
se entrevê o drama das comunidades que já viam morrer as testemunhas oculares,
os que conviveram com Jesus. É possível fazer a experiência da ressurreição sem
ter convivido com Jesus? A resposta é sim, mas assumindo a irrupção da vida
nova em meio aos conflitos do tempo presente.
O Ressuscitado se deixa tocar e ser reconhecido nas feridas de
cruz que remetem à experiência mais dolorosa e desacreditada. Porém, a
experiência da cruz, pela fé, se torna translúcida, transparente, fazendo ir
além de si mesma.
Nessa proclamação triunfante da divindade de Jesus, o Evangelho
terminava (o Capítulo 21 é um epílogo, adicionado mais tarde). No início, João
nos informou que “o Verbo era Deus”. Agora, ele repete essa afirmação e abençoa
todos os que a aceitam baseados na fé! A meta do Evangelho foi alcançada:
mostrar a divindade de Jesus, para que acreditando, todos pudessem ter a vida
n’Ele.
3. Atualizando a Palavra
Celebrar a páscoa a cada ano terá sempre sabor de desafiante
novidade, pois impele a descobrir, na existência, razões para prosseguir
adiante, olhando com a fé e atentamente os acontecimentos mais dolorosos e
desacreditados como sinais da Páscoa. O grande sinal da manifestação de Jesus
Ressuscitado à comunidade tem em vista a fé.
Mas a fé, que foi transmitida pela Igreja, não nega a
existência, os obstáculos, os desafios. E estes, longe de obscurecer a
percepção da Páscoa, devem servir para fortalecer a convicção da ressurreição.
Todavia tal caminho não se faz no isolamento e sim na comunhão.
A fé tem a ver com a Igreja, reunião daqueles que foram
escolhidos para o testemunho e para a vida nova. Distante da comunidade só
restará a dúvida e a incapacidade de reconhecer nas coisas mais humanas e
quotidiana a manifestação do Senhor.
Em tempos de ofertas religiosas de mercado, os espetáculos e as
manifestações milagreiras tendem a desenraizar a experiência de Deus. Valem as
“curas”, os choros, os arrepios, as emoções movidas por supostas adivinhações
ou “revelações” misteriosas. Ninguém olha para as próprias feridas e para as
feridas alheias para reconhecer a vida secreta que nelas habita.
Os obstáculos e desafios não servem mais para fortalecer e serem
abraçados como cruz do discipulado. São evitados. As doenças, a pobreza, e as
injustiças não são confrontadas à luz da fé. Aceita-se a indiferença, sem
qualquer perspectiva de solidariedade, de profetismo, de luta em vista de uma
transformação.
A Páscoa nos convida para algo mais: para a luz que brilha na
noite, para a palavra que recria, para vida que emerge das águas, para o pão
que cria vida ao ser partido. A fé está enraizada na vida; na existência faz
seu húmus. A Ressurreição eleva aquilo que a encarnação assumiu.
4. Ligando a Palavra com ação
litúrgica
O rito da comunhão é bem mais que o alimentar-se do pão e do
vinho. Implica movimento, deslocamento do seu lugar para o lugar de Cristo, o
altar. É canto que explicita o gesto de entrega servil e amorosa. Realiza o
corpo eclesial, a união com Cristo, a Deus.
A antífona de comunhão deste domingo, que deveria ser assumida
como refrão do canto de comunhão, retoma a ordem de Jesus para Tomé: “Estende a
tua mão, toca o lugar dos cravos, e não sejas incrédulo, mas fiel, aleluia!”.
É exatamente isso que realiza cada fiel que toma parte na
comunhão eucarística: estende a mão, não para tocar o lugar dos cravos, mas os
sinais da paixão: pão e vinho. Não apenas os tocam, recebendo-os, mas deles se
nutrem. Na alimentação, os sentidos do paladar e do tato estão intimamente
ligados: toma-se pelas mãos e leva-se a boca para comer e beber. Tomai e comei
é ordem explícita de Jesus.
Os sinais da paixão fizeram-se alimento na celebração da
eucaristia. São assimilados para nutrir a fé. O evangelho narrado se prolonga
no rito da comunhão. Tomé é cada cristão que obedientemente cumpre o mandato do
Senhor, fazendo sua memória: ”façam isto!”.
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