“Não tenho senão a água de minhas lágrimas…”
“A tua vida estará suspensa diante de ti” (Deut. 28, 66)
Fogem as mães da presença dos filhos moribundos;
E se por acaso alguma mãe se vê obrigada a assistir a um filho que está para morrer, procura-lhe todos os alívios que pode dar.
Concerta-lhe a cama, para que esteja em posição mais cômoda; serve-lhe
refrescos, e assim a pobre mãe procura mitigar a própria dor.
Ah, Mãe a mais aflita de todas as mães, ó Maria! Incumbe-vos a assistir a
Jesus moribundo, mas não vos é permitido dar-lhe algum alívio.
Maria ouviu o Filho dizer: Sitio, tenho sede; mas não lhe foi permitido
dar uma gota de água para lhe mitigar a sede. Só pode dizer-lhe, como
contempla São Vicente Ferrer: Filho, não tenho senão a água de minhas
lágrimas.
Via que sobre aquele leito de morte de Jesus, pregado
com três cravos de ferro, não achava repouso. Queria abraçá-lo para lhe
dar alívio, ao menos para deixar espirar entre seus braços; mas não
podia.
Via o pobre Filho, que naquele mar de aflições buscava
quem o consolasse, como ele já tinha predito pela boca do profeta
Isaías.
Mas quem entre os homens o desejava consolar, se todos
eram seus inimigos? Mesmo sobre a cruz um blasfemava e encarnecia de uma
maneira, outro de outra, tratando-o como impostor, ladrão, usurpador
sacrílego da divindade, digno de mil mortes.
O que mais
aumentou a dor de Maria e sua compaixão para com o Filho, foi ouvi-lo
sobre a cruz lamentar-se de o Eterno Pai também o ter abandonado: “Deus
meu, Deus meu, porque me desamparaste?”.
Palavras como disse a
Bem-aventurada Virgem a Santa Brígida, que não puderam nunca mais
sair-lhe da ideia, enquanto viveu. De modo que a aflita Mãe via o seu
Jesus atormentado de todas as partes; queria aliviá-lo, mas não podia.
Pobre Mãe!
“Mulher, eis aí o teu filho”
Pasmavam os homens, diz Simão de Cássia, vendo que a divina Mãe guardava o silêncio, sem se queixar no meio de sua grande dor.
Mas, se Maria guardava o silêncio com a boca, não o guardava com o
coração, porquanto naquelas horas não fazia senão oferecer à justiça
divina a vida do Filho para nossa salvação.
Saibamos, pois, que
pelo mérito de suas dores Ela cooperou para nos fazer nascer para a
vida da graça, e por conseguinte somos filhos de suas dores: “Mulher,
eis aí o teu filho”.
Naquele mar de amargura era este o único
alívio que então a consolava: o saber que por meio de suas dores nos
conduzia à salvação eterna.
– Desde então Maria começou a
exercer para conosco o ofício de boa Mãe; pois que, como atesta São
Pedro Damião, foi pelas súplicas de Maria que o bom ladrão se converteu e
se salvou, querendo a Mãe divina recompensá-lo assim pela delicadeza
que outrora lhe mostrou na viagem ao Egito.
E o mesmo ofício de
Mãe tem a Bem-aventurada Virgem continuado sempre e continua a exercer.
Nós porém, com as nossas obras mostramo-nos deveras seus dignos filhos?
Ó Mãe, a mais aflita de todas as mães! Morreu, enfim, vosso Filho, tão
amável e que tanto vos amava! Chorai, que tendes razão para chorar. Quem
jamais poderá consolar-vos?
Só vos pode consolar o pensamento
que Jesus com a sua morte venceu o Inferno, abriu o Céu fechado aos
homens, e ganhou tantas almas. Do trono da cruz reinará sobre tantos
corações que, vencidos pelo amor, pelo amor lhe servirão.
Não
recuseis entretanto, ó minha Mãe que vos acompanhe a chorar convosco, já
que mais que vós tenho razão de chorar pelas ofensas que tenho feito a
vosso Filho.
Ah, Mãe de misericórdia! Em primeiro lugar pela
morte de meu Redentor, e depois pelos merecimentos de vossas dores,
espero o perdão e a salvação eterna.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário