Santa teresinha
O Pequeno Passarinho
O passarinho quereria voar para o Sol brilhante que lhe fascina
o olhar;
quereria imitar as Águias, suas irmãs, que vê elevarem-se até ao
fogo divino da Santíssima Trindade... Pobre dele! tudo quanto
pode fazer é agitar as suas pequenas asas; mas levantar voo,
isso não está no seu pequeno poder! Que será dele? Morrerá de
desgosto, ao ver-se impotente?... Oh, não! o passarinho nem
sequer se vai afligir. Com um audacioso abandono, quer ficar a
fixar o seu divino Sol. Nada seria capaz de o assustar, nem o
vento nem a chuva; e se nuvens sombrias chegam a esconder o
Astro do Amor, o passarinho não muda de lugar, pois sabe que
para além das nuvens o seu Sol brilha sempre, e que o seu brilho
não se poderia eclipsar nem por um instante sequer.
É
verdade que às vezes o coração do passarinho se vê acometido
pela tempestade; parece-lhe não acreditar que existe outra
coisa, a não ser as nuvens que o envolvem. É então o momento da
alegria perfeita para a pobre e débil criaturinha. Que
felicidade para ela, permanecer ali, apesar de tudo, e fixar a
luz invisível que se esconde à sua fé!!!...
Jesus,
até agora compreendo o teu amor para com o passarinho pois ele
não se afasta de Ti. Mas eu sei, e Tu também o sabes, muitas
vezes a imperfeita criaturinha, ficando embora no seu lugar
(isto é, sob os raios do Sol), deixa‑se distrair um pouco da sua
única ocupação; apanha um grãozito à direita e à esquerda, corre
atrás de um vermezito... Depois, encontrando uma pocita de água,
molha as penas ainda mal formadas; quando vê uma flor que lhe
agrada o seu espírito entretém-se com essa flor... Enfim! não
podendo pairar como as Águias, o pobre passarinho entretém-se
ainda com as bagatelas da terra. Não obstante, depois de todas
as suas travessuras, em vez de se ir esconder num canto para
chorar a sua miséria e morrer de arrependimento, o passarinho
volta-se para o seu Bem‑amado Sol, expõe as asitas molhadas aos
seus raios benfazejos, geme como a andorinha e, no seu doce
cantar, confia, conta em pormenor as suas infidelidades,
pensando, no seu temerário abandono, conseguir assim maior
influência e atrair mais plenamente o amor d’Aquele que não veio
chamar os justos mas os pecadores... Se o Astro Adorado
continuar surdo ao chilrear plangente da sua criaturinha, se
permanecer velado..., pois bem: a criaturinha continua molhada,
aceita ficar transida de frio, e ainda se alegra com esse
sofrimento que, aliás, mereceu...
Ó Jesus! como o teu passarinho está contente por
ser débil e pequeno. Que seria dele se fosse grande?... Nunca
teria a audácia de aparecer na tua presença, de dormitar diante
de Ti... Sim, aí está mais uma fraqueza do passarinho: quando
quer fixar o Divino Sol, e as nuvens o impedem de ver um único
raio, contra sua vontade os seus olhitos fecham-se, a sua
cabecinha esconde-se debaixo da asita, e a pobre criaturinha
adormece, julgando fixar ainda o seu Astro Querido. Ao acordar,
não fica desolado, o seu coraçãozinho fica em paz, e recomeça o
seu ofício de amor. Invoca os Anjos e os Santos que se elevam
como Águias em direcção ao Fogo devorador, objecto do seu
desejo.
E as
Águias, compadecendo-se do seu irmãozinho, protegem-no,
defendem-no, e põem em fuga os abutres que o queriam devorar. Os
abutres, imagem do demónio, o passarinho não os teme, pois não
está destinado a ser presa deles, mas da Águia que contempla no
centro do Sol do Amor.
Por tanto tempo quanto quiseres, ó meu Bem-amado,
o teu passarinho ficará sem forças e sem asas; permanecerá
sempre com os olhos fixos em Ti. Quer ser fascinado pelo teu
divino olhar, quer tornar‑se a presa do teu Amor... Um dia,
assim o espero, Águia adorada, virás buscar o teu passarinho e,
subindo com ele para o Fogo do Amor, mergulhá‑lo‑ás eternamente
no ardente Abismo desse Amor, ao qual se ofereceu como vítima...
(História de uma Alma, Ms B 5rº-vº)
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