3º DOMINGO
DA PÁSCOA
14 de abril
de 2013
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“A Igreja como manifestação daquele que venceu a
morte”
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Leituras:
Atos 5, 27b-32.40b-41;
Salmo 29 (30), 2 e 4.5. e 6.11 e 12a e
13b;
Apocalipse 5, 11-41;
João 21, 1-19
ou mais breve 1-14.
COR LITÚRGICA: BRANCA OU DOURADA
O Senhor ressuscitou! Aleluia!
Nesta
páscoa semanal a liturgia nos mostra a missão evangelizadora da Igreja, que
através do aparecimento do Ressuscitado, torna possível a existência da
comunidade e de sua missão: missão que nos ensina a servir, e servindo manifestamos
e reconhecemos a presença de Cristo entre nós, e garantimos o milagre da
unidade. Como Pedro, aceitamos o convite de Jesus: Segue-me.
1. Situando-nos brevemente
O
terceiro domingo da Páscoa orienta-se à experiência da companhia do
Ressuscitado que se manifesta em meio aos discípulos. O Tempo da Páscoa integra
o grande dia pascal, o Dia que o Senhor fez para nós. Neste período, a Igreja
se deixa encontrar por seu Senhor e busca contemplá-lo e reconhecê-lo mediante
os mesmos gestos que ele já realizava enquanto estava na sua companhia.
A
liturgia celebrada nós dá acesso a estes gestos de maneira que permaneçamos
unidos a Jesus corporalmente, assumindo
na história humana o posto de sacramento daquele que é
Morto-Ressuscitado.
2. Recordando a Palavra
Nos escritos joaninos, as “aparições” do Ressuscitado são
introduzidas com o termo “manifestação”. Em grego se empregam termos distintos:
“ephanerosen”, que a Vulgata verte para o latim “manifestavit” (no caso de
João); Em Lucas aparece outro termo: “egerthe” (vulgata: “apparuit”).
Embora as palavras “aparição” e “manifestação” possam significar
a mesma realidade – Jesus aproximando-se dos discípulos após sua morte e
ressurreição – o termo “manifestação” traz consigo algumas peculiaridades. Uma
delas diz respeito à acepção de algo que se torna patente, de modo que pode ser
notado, captado pela percepção humana.
Para João, este termo lhe é muito querido, sobretudo, no que se
refere a um evento que, manifesto, pode ser reconhecido visualmente. Outro dado
importante implícito à palavra “manifestação” é o seu sentido de revelação. As
manifestações de Jesus, no evangelho de João, trazem consigo o ato de “dar a
conhecer” – por parte de Jesus – o coração do Pai.
Por fim, esta palavra grega traz ainda o significado de outro
termo – “phaino” – que pode ser traduzido por brilhar, resplandecer. A Vulgata
traduz para o latim o texto grego da seguinte forma: “depois disso, Jesus
manifestou-se outra vez aos seus discípulos à margem do mar de Tiberíades.
Manifestou-se assim” (Tradução de “Postea
manifestavit se iterum Iesus discipulis ad mare Tiberiadis; manifestavit autem
sic”. A Bíblia de Jerusalém, também, prefere esta tradução). O Lecionário,
por sua vez, utilizou o verbo aparecer.
Preferindo falar da “manifestação” de Jesus, mais do que de uma
simples “aparição”, aqueles que escreveram esta segunda conclusão do evangelho
de João (A primeira conclusão é Jo 20, 30-31) ligam a ressurreição ao mistério
da encarnação descrita no prólogo. Pela encarnação do Verbo, Deus
possibilitou-nos vislumbrar em Jesus a sua glória. É como se João nos
lembrasse: aquele que ressuscitou dos mortos e voltará para o Pai e o mesmo
que, vindo de Deus, permitiu por sua pessoa, palavras, gestos e ações que
contemplássemos a luz divina, uma vez que a boa obra de Cristo pode ser descrita
como revelação do Pai.
Neste sentido, a manifestação do Ressuscitado é narrada pelo
evangelista trazendo à memória dos ouvintes e dos próprios discípulos uma cena
que se situa no início do ministério de Jesus, quando do convite ao seguimento,
segundo o relato de Lucas (Cf. Lc 5,4ss). Além deste fato, João acrescenta à
cena da pesca uma refeição.
A primeira Leitura evoca o testemunho da Igreja nascente por
meio do qual o Nome de Jesus, isto é, sua pessoa, é manifestado (Cf. At 5,4).
Na audácia dos apóstolos em anunciar – mesmo que proibidos – a mensagem do
evangelho, fazendo-se do próprio Jesus (Cf. At 5,28), refulge a cruz e a
ressurreição do Senhor.
Esta perspectiva coincide com aquela responsabilidade que Jesus
transmite a Pedro de cuidar do rebanho, empenhando para isso a própria vida, o
que se torna, também, prova de amor ao Evangelho (Cf. Jo 21,15-19) Nesta
perspectiva, o pranto é tornado festa (Cf. Sl 29, 12 (Salmo Responsorial),
porque do sofrimento vem a alegria do anúncio da Palavra de Deus que se faz
carne na doação e no serviço dos apóstolos.
Com estes textos, a Liturgia da Palavra insinua a eficácia que
as ações e os gestos da Igreja possuem, se vividos como memória de Jesus.
Evocam a própria Páscoa do Senhor, realizando-a no testemunho daqueles o seguem.
3. Atualizando a Palavra
No texto-base em preparação ao 10º Intereclesial das Comunidades
Eclesiais de Base, José Oscar Beozzo evocava a vida cristã como memória
perigosa de Jesus. A Liturgia da Palavra deixa entrever esta perspectiva ao
colocar-nos diante do testemunho dos apóstolos e, em especial, daquela
incumbência dada a Pedro – que envolve a Igreja toda – de cuidar do rebanho que
se estende para além dela mesma e se identifica com a humanidade.
Por amor, os pastores da Igreja, mas também todos os seus
membros, são encarregados pelo Senhor no cuidado para com o mundo. Neste
trabalho que os cristãos realizam se cumpre o mandato do amor e se dá a
oportunidade para a que a criação inteira proclame seu “amém” à vitória do
Cordeiro (Cf. Ap 5, 11-14).
Na palavra e na obra de homens e mulheres de nosso tempo – hoje
lembrando-nos especialmente daqueles que assumem o pastoreio em nome de Cristo
– ressoa a boa-nova. Como não recordar de Dom Pedro Casaldáliga e a recente
perseguição sofrida por conta de seu compromisso com os povos indígenas?
Como não fazer memória de tantos bispos, padres, religiosas,
leigos e leigas que, espalhados pelas diversas Igrejas Particulares,
denunciaram nas recentes eleições municipais, os desmandos e corrupção o poder
político? Nestas ações corriqueiras é que se manifesta a Páscoa de Cristo,
vencendo a morte e fazendo brilhar a vida para sempre (Cf. Canto “Senhor vencestes a morte, fizeste brilhar a vida para
sempre”. (Hinário Litúrgico da CNBB, fascículo II, Paulus).
4. Ligando a Palavra com ação
litúrgica
A oração do dia reza a exultação do povo em ser renovado pela
Páscoa de Cristo e lança aos fiéis o desafio de permanecerem na esperança da
ressurreição (Cf. Oração da Coleta). Santo Atanásio afirmava: “Jesus
ressuscitado converte a vida do ser humano em uma festa contínua” (URTASUN, Cornelio. Las oraciones Del
Misal. Escuela de espirtiualidad Cristiana. Barcelona: Centre de Pastoral
Litúrgica, 1995.p.263).
E acrescenta: “a Páscoa rejuvenesce a vida dos fieis” (URTASUN,
Cornelio. Idem). De fato, somos ”novas criaturas” que entoam o “canto novo” que
consiste na “glória de seu nome (Cf.
Antífona de Entrada: “Aclamai a Deus, toda terra, cantai a glória de seu nome,
rendei-lhe glória e louvor, aleluia!”).
A celebração litúrgica ao realizar a vida de Cristo, no coração
da assembléia, lhe permite irradiar a glória do Senhor que não significa outra
coisa que torná-lo manifesto ao mundo por meio da fidelidade ao seu mandato e à
sua herança: o amor. Amar os irmãos, arriscar-se pela fraternidade universal,
que toma forma nos pequenos gestos de carinho e solidariedade locais, revela o
Nome de Deus em nós. Este nome é “Cristo”: Cristo em nós, fazendo-nos
partícipes de sua ressurreição por causa de sua compaixão para com o gênero
humano (Cf. Aclamação ao Evangelho).
A vida nova que abraçamos (Cf. Prefácio da Páscoa II) se exprime
pelos gestos típicos que dão forma à celebração litúrgica. Gestos humanos que
se tornam divinos, porque Cristo os assume. E uma vez que os gestos são
expressão de quem somos, nós mesmos tomamos parte na eternidade, cujas portas
foram abertas a nós por Cristo uma vez por todas (Cf. Prefácio da Páscoa I).
Lembrando que a eternidade não tem a ver com “duração” da vida,
mas com a sua qualidade. Ao darmos corpo ao amor de Cristo, tornando-nos
memória perigosa dele, permitimos que ele em nós se manifeste e –
arriscando-nos uns pelos outros –adentramos no céu.
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