3º
DOMINGO DA QUARESMA - C
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“Da conversão brota vida nova, a
salvação”
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Leituras:
Êxodo 3, 1-8a.13-15;
Salmo
102 (103);
Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios 10, 1-6.10-12;
Lucas 13 1-9.
COR
LITÚRGICA: ROXA
A Quaresma nos apresenta a
oportunidade de revalorizar o Sacramento da Reconciliação, pois somos pecadores
e, por isso, necessitamos da misericórdia do Senhor. Ele se apresenta como
simples agricultor para trabalhar a terra de nosso coração, regar-nos e
adubar-nos com o seu Espírito. Antes mesmo que Jesus fizesse a plena revelação
do Deus Amor e Misericordioso, os profetas já anunciavam aspectos importantes
da caridade e da justiça, fundamentos do Reino de Deus. O bem comum, desejado
por Deus, é o grande objetivo das Sagradas Escrituras. Da adesão ao projeto do
Reino de Deus e, portanto, o compromisso com a construção do bem comum é que
depende a salvação individual. “Casa comum, nossa responsabilidade” (CF –
2016).
1. Situando-nos
Somos peregrinos com Jesus rumo à Páscoa. Eis que chegamos ao
terceiro domingo da Quaresma. Jesus intensifica o convite à conversão.
Após termos celebrado os domingos das “tentações” e “da
transfiguração” de Jesus, a liturgia da Palavra ressalta a urgência da
conversão pela renovação batismal. A conversão se traduz na adesão ao projeto
libertador de Deus.
Hoje somos colocados diante do Deus imensamente solidário
conosco, do Deus que deseja vida digna para todos e não a morte; do Deus
misericordioso e paciente que, nesta Quaresma, de novo nos “dá um tempo” para
nos convertermos ao Reino que Jesus veio inaugurar. “Permanecer no caminho do
mal é fonte apenas de ilusão e tristeza. A verdadeira vida é outra coisa. Deus
não se cansa de estender a mão. Está sempre disposto a ouvir. Basta acolher o
convite à conversão e submeter-se à sua justiça” (MV, n.21).
A Quaresma é o tempo da paciência de Deus, é o tempo que Ele nos
dá para que possamos produzir os frutos da justiça e da fraternidade. “Assumir
a responsabilidade com a Casa Comum exige uma profunda mudança no estilo de
vida e nos valores que orientam nossa ação” (CONIC.
Campanha da Fraternidade 2016: Texto Base. Brasília. Edições CNBB, 2015. Arte
do Cartaz, p. 13).
2. Recordando a Palavra
Jesus continua sua “viagem” para Jerusalém (cf. Lc 9,51-19,28).
Ele percorre o caminho rodeado por seus discípulos. Acabava de lhes falar sobre
o discernimento dos sinais que manifestam a vontade de Deus. Sinais do
cotidiano que explicitam o projeto salvífico do Pai. Falando à multidão e, em
particular, aos discípulos, enfatiza, em duas partes distintas, a urgência da
conversão.
Na primeira parte (cf. Lc 13, 1-5), Jesus refere-se aos dois
fatos da repressão a um grupo de galileus enquanto se preparavam para
sacrificar suas vítimas e da queda de uma torre perto da piscina de Siloé. Os
que relatam a Jesus as duas tragédias desejam ouvir sua opinião e provocar d’Ele
uma posição. O Mestre sai pela tangente.
Desconstrói a crença popular de que as desgraças sejam uma forma
de punição divina e que Deus poderia impedir tais tragédias, mas prefere
permanecer surdo e mudo aos gritos dos sofredores”. Rechaça a doutrina da
retribuição que vincula a desgraça ao pecado cometido. Para o Mestre, diante de
Deus, todos necessitam mudar de vida. Deus não é vingador. Ele oferece uma nova
oportunidade: “se vós não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo” (v.3.5).
A única maneira para escapar à ruína, é a conversão. Na segunda parte
(Lc 13, 6-9), temos a parábola da figueira. A imagem da figueira era familiar
aos ouvintes. Deus é o proprietário da figueira. Ela é a imagem do povo de
Israel. Durante três anos de ministério, Jesus procurou frutos de
arrependimento e de conversão. E nada!
Na Palavra de Jesus, a caminho de Jerusalém, a todos é oferecida
uma nova chance de mudança de vida. Ele espera, portanto, que os que o
acompanham dêem frutos, isto é, aceitem converter-se à Boa Nova que lhes
anuncia. É a paciência de Deus! Apesar do tom ameaçador, há esperança. Jesus
confia em que a resposta à Boa Nova seja positiva (Evangelho).
Moisés é convidado para ser o líder do povo, o rosto visível da
ação libertadora que o Senhor realizará em favor de Israel oprimido. Moisés
tinha fugido do Egito e se abrigado no deserto do Sinai após assassinar,
indignado, um egípcio que maltratava um hebreu. É acolhido por uma tribo de
beduínos. Casa-se e refaz sua vida numa experiência de tranquilidade.
É precisamente nesse Oasis de paz que o Senhor se revela,
inquieta e escolhe Moisés para uma nova missão no Egito. O chamado de Moisés
ressalta a compaixão do Deus dos pais Abraão, Isaac e Jacó, o Deus da aliança
com os patriarcas (v.6). Um Deus atento e sensível com a realidade do povo.
Sensibilidade que se revela nos verbos, ver, ouvir, conhecer (v.7). “Desci para
libertá-los das mãos dos egípcios” (v.8).
Na segunda parte (v.13-15), ante às indagações de Moisés, Deus
se revela: “Eu Sou aquele que sou”. Uma espécie de “sinal” que confirma que
Moisés foi convidado por Deus e enviado por Ele em missão. Nome que acentua a
presença contínua de Deus na vida do seu povo. Uma presença viva, ativa e
dinâmica, no presente e no futuro, como libertação e salvação (primeira
leitura).
Diante de tudo isto, não resta ao salmista que louvar o Senhor,
porque é um Deus que ouve o grito dos fracos e sofredores: “O Senhor é
indulgente, é favorável, é paciente, é bondoso e compassivo” (Sl103/102). É um
salmo que expressa a misericórdia de Deus para com o seu povo.
Paulo lembra que os israelitas foram conduzidos por Deus (a
nuvem), passaram pelas águas libertadoras do Mar Vermelho, alimentaram-se do
Maná e da água que jorrou da rocha. Para o apóstolo, este rochedo é o símbolo
de Cristo já presente na caminhada do êxodo do antigo povo. Apesar de todos
estes sinais, a maior parte dos israelitas não foi fiel a Deus e acabou
morrendo no deserto.
Isto nos faz compreender que, apesar da importância de nossa participação
nas ações rituais, o que conta é a adesão sincera à vontade de Deus. Paulo
recorda o fundamental na vivência da fé: levar uma vida coerente e viver no
amor de Deus. Quem assim viver contará com a compaixão de Deus (segunda
leitura).
3. Atualizando a Palavra
A Quaresma é um tempo para avaliarmos a qualidade de nossas respostas
aos projetos da vontade de Deus. Será que elas correspondem à expectativa de
quem confiou em nós? Pode ocorrer que os frutos não estejam à altura do
esperado.
Quem planta e cultiva determinada árvore frutífera, é natural
que almeje colher bons frutos. “Foi lá procurar figos e não encontrou. Então
disse ao agricultor: “já faz três anos que venho procurando figos nesta
figueira e nada encontro”. Desilusão! A paciência parece estar se esgotando. O
impulso humano é dar um basta: “corta-a”.
Apesar de nossas infidelidades, Deus não age assim. Mesmo que
sua paciência esteja no limite, “Misericórdia e piedade é o Senhor, ele é amor,
é paciência, é compaixão” (Sl 144/145). “A misericórdia será sempre maior do
que qualquer pecado, e ninguém pode colocar um limite ao amor de Deus que
perdoa” (MV, n.3).
Cristo, por sua vez, intercede constantemente por nós junto do
Pai, dilatando e ampliando sua paciência. O amor misericordioso torna possível
o êxito dos projetos de Deus. Converter-se a Deus é voltar-se para Deus, é
caminhar rumo a Ele (Cf. PRONZATO A., OP. CIT., P.65).
A urgência da conversão quaresmal não se apresenta aqui como uma
ameaça, mas como um convite libertador que suscita alegria, pois nos libertamos
de algo que impede de crescermos como pessoas fiéis. O apelo à conversão requer
mudança (metanoiá) de nossa maneira
de pensar, para assimilarmos os critérios de Jesus seu estilo de vida.
A conversão, como êxodo, é uma atitude do coração que exige
manifestação externa no cotidiano pela dedicação às obras de caridade, à
promoção da fraternidade e o cuidado com a Casa Comum. “A conversão do coração
a que nos urge a Quaresma, deve ser reconhecida pelos frutos” (CABALLERO b. Nas fontes da Palavra,
leitura, meditação e anúncio – Ano C. Aparecida. Editora Santuário, 1991, p.74),
ou seja, como sugere a Misericordiae Vultus, por meio das “obras de
misericórdia corporal e espiritual”.
O chamado à conversão, que nos transforma em novas criaturas,
começa pela fé e no batismo, exige esforço contínuo, para que, renunciando a
nós mesmos, assimilemos a vontade de Deus, estabelecendo novos relacionamentos
com as pessoas e com o mundo que nos cerca. A conversão apoia-se no crescimento
da fé e nas relações pautadas pela Boa-Nova do Reino.
No caminho da conversão, iluminados pela “sarça ardente”,
percebemos sempre que algo poderia ser melhor, no que fazemos e somos, mesmo em
nossas ações e atitudes dignas de aplausos, descobrimos resquícios de egoísmo e
falta de amor. Mais do que nos penalizar, estas descobertas nos alegram. Pois na
confissão da nossa fraqueza e a humilhação pela consciência de nossas faltas,
somos reconfortados pela misericórdia de Deus.
Contudo, não abusemos da paciência de Deus, não tomemos como
desculpa a sua misericórdia para retardar nossa conversão. A paciência de Deus
não é uma atitude passiva, mas uma solicitude para que o homem viva. Deus crê
no homem, crê que ele pode mudar a sua conduta passada, para se voltar para
aquele de quem se afastou (Cf. Ano C. Homilia 3º Domingo da Quaresma).
Conversão é convite à vida. Mais do que anúncio de ameaças, é
proclamação de uma boa nova, Jesus apela à conversão, anunciando a proximidade
do Pai amoroso e misericordioso (Cf. GRÜN,
Anselm. Penitência, celebração da reconciliação. São Paulo, Edições Loyola,
2007, p. 58-60)
A Quaresma é uma nova oportunidade que Deus nos dá. Ele se
apresenta como o simples agricultor para trabalhar a terra de nosso coração,
regar-nos com seu Espírito e sua Palavra.
Deixemos que ressoem no nosso interior as palavras do Papa Francisco numa missa
em Santa Marta: Que a misericórdia de Deus nos faça mais misericordiosos com os outros.
Junto com o Papa Francisco peçamos também a Maria que nos acompanhe neste tempo
de conversão.
4. Ligando a Palavra com a ação
eucarística
Na celebração Eucarística, memorial da morte e ressurreição de
Jesus Cristo, sempre de novo, Deus Pai, rico em misericórdia, manifesta a sua
bondade, reconciliando-nos consigo em Cristo. Reconhecendo a ação de Deus na
história, como Igreja, proclamamos: “vós, Deus de ternura e de bondade, nunca vos
cansais de perdoar. Ofereceis vosso perdão a todos convidando os pecadores a
entregar-se confiantes à vossa misericórdia” (Oração Eucarística sobre Reconciliação II).
Mesmo que nós quebremos a comunhão e não produzamos os frutos
almejados, nos seus planos, Deus não nos rejeita para sempre. Ele nos socorre e
convida a que “nos entreguemos confiantes à sua misericórdia”. Com braço forte,
por meio de Moisés, Deus conduziu Israel pelo deserto à Terra Prometida; hoje,
na sua misericórdia, em Jesus Cristo, nos acompanha pelos caminhos da história,
iluminando-nos para que sempre reconheçamos “os sinais dos tempos”.
Participando da paixão de Cristo pela Celebração Eucarística, e
convertendo-nos cada vez mais ao Evangelho de Cristo pela prática das obras de
caridade e misericórdia, nos tornamos no mundo um sinal da conversão a Deus
(cf. Ritual da Penitência, Introdução, 4).
Em nome da assembleia, o presidente da celebração suplica: “Nós
vos pedimos, ó Deus, que a comunhão no vosso sacramento nos purifique dos pecados
e nos conduza à unidade” (Oração da Comunhão da segunda-feira da terceira
semana da Quaresma).
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