«Cem por um»
Da mesma forma que todo o poder das leis e dos mandamentos que Deus deu aos
homens se realiza na pureza de coração, como disseram os Padres, assim todos
os modos e todas as formas pelas quais o homem reza a Deus se concretizam na
oração pura. Os gemidos, as prosternações, as súplicas, as lamentações,
todas as formas de que se pode revestir a oração têm na verdade como
objetivo a oração pura. […] A reflexão deixa de ter algo que a sustente:
nem oração, nem movimento, nem lamentação, nem poder, nem liberdade, nem
súplica, nem desejo, nem prazer naquilo que espera nesta vida ou no mundo que
há-de vir; depois da oração pura, já não há outra oração. […] Acima
desse limite, já não é oração, é maravilhamento: a oração cessa e
começa a contemplação. […]
A oração é a semente, a contemplação e a recolha dos frutos. O
semeador maravilha-se ao ver o inexprimível: como é que, a partir dos
pequenos grãos nus que semeou, brotam subitamente diante de si espigas
florescentes? A vista da colheita tolhe-lhe os movimentos. […]
Do mesmo modo que só um homem em mil cumpre menos mal os mandamentos e
as coisas da Lei e consegue atingir a pureza da alma, assim também só um em
mil é digno de atingir com muita vigilância a oração pura, de atravessar o
limite e de descobrir este mistério. Pois não é dado a muitos mas a poucos
conhecer a oração pura.
Isaac, o Sírio (século VII), monge perto de Mossul
Discursos ascéticos, série 1, nº 32
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