O que é o carisma?
O carisma específico de cada Instituto é um dom de Deus para o
benefício da Igreja e da humanidade.
O que é o carisma?
Existem casos de homens e mulheres que possuem um carisma especial
para predicar, para aconselhar as pessoas, para conhecer e transmitir a Deus e
que nem sempre foram fundadores de uma congregação religiosa.
Breve introdução
No princípio do Terceiro Milênio parece bastante normal tratar de
carismas. E sendo nosso objetivo o de despertar o carisma é importante saber exatamente
o que significa este termo ou o que deseja significar.
É necessário ter algumas noções claras sobre este conceito se vamos
centrar nele a vida e a identidade consagrada.
Por carisma desde muito conhece pela definição paulina de “graças
especiais (conhecidas “carismas”) medias as quais os fiéis ficam “preparados e
dispostos para assumir vários compromissos ou ministérios que contribuem para
renovar e construir ainda mais a Igreja” (LG 12:cf.AA 3). Espetaculares ou
simples e humildes, os carisma são graças do Espírito Santo, que têm direta ou
indiretamente uma utilidade eclesial; os carismas estão ordenados à edificação
da Igreja, ao bem estar dos homens e às necessidades do mundo”.
Um carisma é por tanto uma graça especial que o Espírito Santo deixa
para o bem da Igreja. Não existe uma classificação de carismas e sendo assim
existem muitos tipos. Mais os principais elementos que os compõem serão sempre
dois:
- proveem do Espírito Santo e estão para a edificação da Igreja. Desta
definição partem três grandes aplicações que convêm conhecer para evitar
confusões no momento de estudar os carismas dentro da vida consagrada: o
conceito de carisma como tal, a concepção da vida consagrada como uma carisma
para a Igreja e o carisma específico de cada Instituo ou congregação religiosa.
Um carisma não está necessariamente conectado à fundação de uma
congregação religiosa. Existem casos de homens e mulheres que possuem um
carisma especial para predicar, aconselhar as pessoas, para conhecer e
transmitir a Deus, mais que nem sempre foram fundadores de uma congregação
religiosa. Por outro lado a própria vida consagrada já é um dom do Espírito
para o bem da Igreja: “A vida consagrada, enraizada profundamente nos exemplos
e ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, é um dom de Deus Pai para sua
Igreja por meio do Espírito”. E por último, é importante considerar o carisma
específico de cada congregação ou instituto de vida consagrada, buscando
centrar nossa atenção no presente estudo nesta última acepção do termo.
Daremos início fazendo uma breve revisão do que o Magistério escreve
sobre o carisma de cada Instituto ou congregação religiosa, para passar mais
adiante a uma análise do mencionado por alguns autores da atualidade. Ao final,
em base a esta dupla pesquisa, nos arriscaremos a propor o que é o carisma e
quais são seus elementos constitutivos.
Revisão do Magistério
Ainda que o termo carisma não aparece nos documentos do Concílio
Vaticano II, tudo indicava sua posterior aparição, dado que no debate que precedeu
à redação da Constituição dogmática Lumen Gentium e do Decreto Perfectae
Caritatis, já é possível observar o manejo do caráter carismático da vida
consagrada.
Marca que abrirá as possibilidades para uma futura pesquisa e que deu
como resultado uma ampla literatura, fruto do avanço da Teologia da vida
consagrada, onde se trabalhou bastante o termo carisma sob diversas acepções.
O termo carisma veio sendo utilizado pela primeira vez em um documento
do magistério no número 11 da exortação apostólica Evangelica Testificatio: “Só
assim podereis despertar de novo os corações para a Verdade e para o Amor
divino, segundo o carisma dos vossos Fundadores, suscitados por Deus na sua
Igreja.” A partir deste documento o magistério assume a terminologia paulina de
carisma com diversas acepções: carisma da vida religiosa, carisma do fundador,
carisma de fundador, carisma fundacional, carisma do Instituto, carisma
originário, carisma institucional, carisma de uma família religiosa.
Será o documento Mutuae Relationes quem definirá pela primeira vez o
carisma: “O próprio carisma dos Fundadores (Evang. nunt. 11) revela-se como uma
experiência do Espírito, transmitida aos próprios discípulos a fim de ser por
eles vivida, conservada e aprofundada e constantemente desenvolvida em sintonia
com o Corpo de Cristo em perene crescimento. E´ por isso que a Igreja protege e
apoia a índole própria dos diversos Institutos Religiosos (LG 44; cf. CD S; 35,
1; 35, 2; etc.). Essa índole própria comporta outrossim um estilo peculiar de santificação
e apostolado, que estabelece uma determinada tradição própria, a tal ponto que
se podem convenientemente colher seus elementos objetivos. Por conseguinte,
nesta hora de evolução cultural e de renovação eclesial, faz-se mister que a
identidade de cada Instituto se conserve com tal segurança, que se possa evitar
o perigo de uma situação não suficientemente definida, pela qual os Religiosos,
sem a devida consideração do estilo peculiar de ação próprio da sua índole, se
insiram na vida da Igreja de maneira vaga e ambígua.” Desta definição irão sair
muitos estudos e documentos posteriores do Magistério.
Tratando-se da contemplação, o documento mencionará como um carisma
especial: “Os que são chamados à vida contemplativa especificamente são
reconhecidos como um dos tesouros mais importantes da Igreja. Graças a um
carisma especial, escholheram a melhor parte, isto é, a oração, o silêncio, a
contemplação, o amor exclusivo a Deus e a dedicação total a seu serviço...”
O carisma, como dom do Espírito, também se reflete em obras concretas,
precisamente nas obras do Instituto. Por essa razão um apostolado, uma obra
levantada por uma congregação não é indiferente para o carisma, como consigna o
Magistério: “Existe a tentação de abandonar as obras estáveis, genuína
expressão do carisma do instituto, por outras que aparentemente são mais
importantes e urgente diante das necessidades sociais, mais que não são irrelevantes com a identidade do instituto.”
No mesmo documento, se destaca a importância do carisma para a
formação das pessoas consagradas, sendo este uma espécie de mapa para não
perder-se na formação: “Esta constante configuração com Cristo se realiza de
acordo com o carisma e normas do Instituto ao qual pertence o religioso. Cada
instituto têm seu próprio espírito, caráter, finalidade e tradição e em
concordância com eles, e assim é como crescem os religiosos com eles e sua
união com Cristo”.
Mais adiante, encontramos que o carisma particular de cada Instituto e
a vida consagrada são uma mesma coisa: Não existe concretamente uma religiosa
« em si » à qual se incorpora, como um anexo subsidiário, o fim específico e o
carisma particular de cada instituto.” O carisma de cada Instituo forma parte
da vida consagrada. E este mesmo documento considera que o carisma deve fazer
parte integrante da formação da pessoa consagrada. “No programa de estudos,
deve aparecer de forma primordial a teologia bíblica, dogmática, espiritual e
pastoral, de modo particular, o aprofundamento doutrinal da vida consagrada e
do carisma do Instituto.”
A vida fraterna em comunidade encontra no carisma também sua razão de
ser: “Viver em comunidade, na verdade, é viver todos juntos a vontade de Deus,
segundo a orientação do dom carismático que o fundador recebeu de Deus e que
transmitiu a seus discípulos e continuadores.” Este mesmo documento, Vida
fraterna em comunidade, dedicará todo um número, o 70, para falar sobre a
possibilidade de compartilhar o carisma com os leigos, tema do qual trataremos nos
próximos artigos.
Podemos citar inclusive quais são as responsabilidades das pessoas
consagradas para com o carisma, de acordo ao seguinte texto: “Cada instituto
têm uma responsabilidade primária com respeito a própria identidade. Com razão,
o «carisma dos fundadores (…)- experiência do Espírito transmitida aos próprios
discípulos para ser por eles vivida, custodiada, aprofundada e constantemente
desenvolvida em sintonia com o Corpo de Cristo em perene crescimento» - é
confiado a cada instituto como patrimônio original em benefício de toda a Igreja.
Cultivar a própria identidade na « fidoidade criativa » significa, afinal,
confluir na vida e na missão do povo de Deus, dons e experiências que a enriquecem e, ao mesmo tempo, evitar que os religiosos «inserem-se na vida da
Igreja de um modo vago e ambigüo».”
João Paulo II na exortação apostólica Redemtionis donum fala
explícitamente do carisma como um dom, tanto para as pessoas consagradas como
para a comunidade e não duvida em afirmar que nesse dom, encontram-se elementos
válidos para viver a consagração. “Seria difícil descrever e até mesmo
simplesmente enumerar as múltiplas maneiras diferentes pelas quais as pessoas
consagradas põem em prática, mediante o apostolado, o seu amor para com a
Igreja. Esse apostolado nasceu sempre daquele dom particular dos vossos
Fundadores que, recebido de Deus e aprovado pela Igreja, se tornou um carisma
para a inteira Comunidade. Tal dom divino corresponde às diversas necessidades
da Igreja e do mundo, em cada época da história; e, seguidamente, prolonga-se e
consolida-se na vida das comunidades religiosas como um dos elementos
perduráveis da vida e do apostolado da mesma Igreja.
Em cada um destes elementos, em todas as suas expressões — quer na da
contemplação fecunda para o apostolado, quer na da atividade diretamente
apostólica — acompanha-vos a bênção constante da Igreja; e, simultaneamente, a
sua solicitude pastoral e materna, pelo que respeita à identidade da vossa vida
espiritual e em ordem ao acerto da vossa atuação, no seio da grande Comunidade
universal das vocações e dos carismas de todo o Povo de Deus.”
Chegamos, finalmente, à exortação apostólica pós-sinodal Vida
consecrata, da qual podemos dizer que o termo carisma aparece citado 72 vezes,
sendo a parte mais citada a que faz referência à fidoidade ao carisma. Esta
simples observação nos faz pensar na importância que se da à fidoidade o dom
inspirado ao Fundador que o levou a seguir adiante com sua obra.
Não podemos deixar de mencionar o descrito pelo Compêndio do Catecismo
da Igreja Católica, quando no número 160 da seguinte definição de carisma, que
ao certo se trata de todo tipo de carisma, também pode aplicar-se ao carisma de
uma congregação religiosa ou Instituto: “Os carisma são dons especiais do
Espírito Santo concedidos a cada um para o bem dos homens, para as necessidades
do mundo e, de modo particular, para a edificação da Igreja, a cujo Magistério
compete o discernimento sobre eles.”
Por último, Bento XVI selecionou o carisma como a norma suprema da
vida consagrada, isto é, seguir a Cristo: “Não é possível conseguir um
autêntico re-lançamento da vida consagrada se não é tratando de uma existência
plenamente evangélica, sem ante-pôr nada ao único Amor, mais sim encontrando em
Cristo e em sua palavra a essência mais profunda de todo o carisma do fundador
e de fundadora.”
Revisão de alguns autores.
É muito variada e ampla a literatura que trata sobre o carisma. A
continuação colocamos algumas citas que podem iluminar o desenvolvimento
teológico deste termo e ajudar-nos a identificar com maior precisão o
significado deste termo.
“Alguns autores diferenciam entre, o carisma de fundação, dom que
habilita a uma pessoa para iniciar uma nova fundação: e o carisma do fundador,
que faz relação ao conteúdo do dom inerente a todo fundador para perceber,
viver e mostrar na história, uma experiência particular do mistério de Cristo,
segundo algumas características concretas que, depois, os identificarão. Na
verdade o carisma de fundação e o carisma do fundador são duas vertentes de uma
mesma realidade que se exigem mutuamente.” Jesús Álvarez Gómez, Carisma e
História, Publicaciones Claretianas, Madrid, 2001, p.100-101.
“O carisma do fundador e da fundadora, uma vez compartilhado em seu
caminho histórico se converte no carisma do Instituto. Com esta definição
pode-se entender o desenvolvimento da virtualidade genética contida no carisma
do fundador ou da fundadora.” Fabio Ciardi, In ascolto dolo Spirito, Città
Nuova editrice, Roma, 1996, p. 58.
“O carisma do fundador, é por tanto para nós aquele dom pessoal que,
estando na origem da experiência da fundação, traça os lineamentos espirituais
essenciais que caracterizam a própria identidade do Instituto, sua missão na
Igreja, sua espiritualidade peculiar.” Giuseppe Buccellato, Carisma e
Rinnovamento, Edizioni Dehoniane, Bologna, 2002, p. 28.
“Se por carisma dos membros do Instituto entende-se sua específica
missão ou o fim pelo qual ingressaram os membros do Instituto, este carisma
pode ser realmente comunicado pelo fundador que, com seu exemplo e sua vida,
arrastam e convencem a outros a seguí-lo.” Giancarlo Rocca, Il carisma do
fondatore, Ancora editrice, Milano, 1998, p. 75.
“O carisma não se mantêm na história como se mantêm um patrimônio de
idéias, de valores, de experiências, somente porque seja possível contrastar
com novas perspectivas e novas emergências. Mantêm-se sim, como uma “graça
viva”, cuja direção pertence ao Espírito Santo: começa com um evento de graça
que envolve o carismático em um ardente camiho para seguir a Cristo e pode
permanecer na história somente como uma graça que sempre se renova.” Antonio
Maria Sicari, Gli antichi carisma nella Chiesa, Jaca Book, Milano, 2002, p. 32
– 33.
Pier Giordano Cabra em seu livro Breve corso sulla Vita consacrata
relembra o que têm sido a teologia do carisma. Para este autor cada Instituto
têm em sua base um carisma para o benefício da Igreja e representa um dos
pontos fundamentais da identidade de cada Instituto. Afirma ainda que o carisma
funda também a precisa missão e a própria espiritualidade. Entretanto para
Cabra, existem poucos carisma que aglutinam a todos os carismas, como uma
grande constelação onde cada carisma, como somente uma estrela, pode
reconhecer-se em uma constelação. Sem retirar a importância de cada carisma específico,
Cabra deseja por em guarda os Institutos religiosos para não super valorizar o
próprio carisma e assim enriquecer-se de todos os carismas, principalmente dos
mais semelhantes. Continuando nesta mesma linha, em seu livro Tempo di prova e
di speranza, Cabra considera que na atualidade os carismas, mais ainda na
Europa, devem traduzir-se em uma realidade prática, seguindo as indicações da
Vita consecrata, sobre a fidoidade criativa. Pier Giordano Cabra, Breve corso
sulla Vita consacrata, Editrice Queriniana, Brescia, 2004, p. 170 – 172. Pier
Giordano Cabra, Tempo di prova e di speranza, Ed. Ancora, Milano, 2005, p. 147-
150.
Fazendo referência a um dicionário da vida consagrada, anotamos o
seguinte: “A expressão carisma designa, de modo geral, aquele dom do Espírito
oferecido beneplácidamente por Deus a alguns fundadores, homens ou mulheres,
para produzir neles determinadas capacidades que lhes permitem estarem aptos
para iluminar novas comunidades de vida consagrada na Igreja.”
Uma pesquisa digna de mencionar é a de Antonio Romano que em seu livro
I fondatori, profezia dola storia, faz uma análise valiozíssima diferenciando o
carisma da fundação, o carisma do fundador, o carisma do ato de fundar e o
carisma do Instituto. Deixando de lado qualquer particularidade, afinal de
contas remitimos ao mesmo livro, é importante não obstante destacar, que estes
momentos relacionados por Romano significam diferentes momentos do mesmo
carisma. Podemos dizer que são explicações conaturais ao carisma. Ao tratar de um
carisma de um Instituto religioso estamos falando necessáriamente dos momentos
pelos quais atravessou para chegar a constituir-se em um dom do Espírito ao
serviço da Igreja.
O que é o carisma e quais são os elementos que o constituem?
Partiremos de uma definição que serviu como base para todos os
documentos do magistério que manejam o termo carisma: “Os Institutos religiosos
na Igreja são muitos e vários, cada um com sua índole própria (cfr. PC 7, 8, 9,
10); mais todos contribuem sua própria vocação, tal dom feito pelo Espírito,
por meio de célebres homens e mulheres (cfr. LG 45; PC 1, 2) e aprovado de modo
autêntico pela sagrada Hierarquia. O mesmo carisma dos Fundadores revela-se
como uma experiência do Espírito (Evang. Test. 11), transmitida aos próprios discípulos para ser por eles vivenciada, custodiada, aprofundizada e explicada
constantemente em sintonia com o Corpo de Cristo em um perene crescimento. Por
isso a Igreja defende e sustenta a índole própria dos diversos Institutos
religiosos (LG 44; cfr. CD 33; 35, 1, 2, etc.). A índole própria leva além do
mais consigo, um estilo particular de santificação e apostolado que vai criando
uma típica tradição cujos elementos objetivos podem ser facilmente
individualizados.”
O magistério identifica neste texto o carisma com a índole própria de
cada instituto ou congregação religiosa. Tratar de carisma é falar por tanto
das notas mais características e específicas que possui cada congregação ou
instituto religioso para seguir mais de perto a Jesus Cristo. Utilizando um
termo da genética moderna, podemos comparar ao carisma com o código genético da
congregação. Ai está escrito a identidade da congregação, contendo nessa
identidade, ainda que com a necessidade de uma posterior explicação, seu
patrimônio espiritual, seu passado e seu futuro, visto que o carisma não é algo
estático, mais sim em continuo desenvolvimento.
Definir a índole própria pode ser um trabalho árduo para cada
congregação ou instituto religioso. Quando o Concílio Vaticano II pedia o
regressar para a origem da vida consagrada e as fontes originarias de cada
congregação ou instituto religioso, estava convidando precisamente à
identificação dos elementos mais peculiares que configuravam à congregação.
Esta índole própria não provem necessariamente das obras de apostolado
específicas da congregação, nem do modo de ser ou de atuar dos membros, mais
sim de uma experiência do Espírito que viveu o fundador ou a fundadora e que
foi capaz de transmitir aos primeiros membros da congregação ou instituto religioso.
As obras de apostolado, o estilo de vida, a forma de viver os conselhos evangélicos são expressões concretas da experiência do Espírito. “As diversas
formas de viver os conselhos evangélicos são, com efeito, expressão e fruto dos
dons espirituais recebidos pelos fundadores e fundadoras e, em quanto tais,
constituem uma experiência do Espírito, transmitida aos próprios discípulos
para ser por eles vivenciada, custodiada, aprofundada e explicada
constantemente em sintonia com o Corpo de Cristo em um perene crescimento.”
Podemos afirmar por tanto que “no carisma está constituído não somente a
finalidade específica do Instituto mais sim a conformação espiritual, humana e
social da pessoa consagrada.” A experiências do Espírito é um dos pontos característicos
ou dos elementos mais importantes que constituem o carisma. “As notas
características de um carisma autêntico são as seguintes: a) procedência
singular do Espírito, certamente diferente ainda que não está separada dos
dotes pessoais de quem guia e modera; b) uma profunda preocupação por
configurar-se com Cristo testemunhando algum dos aspectos de seu mistério; c)
um amor frutífero à Igreja, que repugne tudo o que nela possa ser causa de
discórdia.” Deus permite ao fundador ou a fundadora uma provação muito forte de
alguma necessidade em seu mundo, um contraste entre os planos de Deus e a
verdadeira realidade. Para enfrentar esta realidade Deus outorga a graça ao
fundador ou a fundadora de realizar uma leitura do evangelho de um modo novo,
de tal maneira que a realidade surge iluminada com uma nova luz, uma nova interpretação, uma experiência do Espírito que já não está circunscrita à
condições de espaço e tempo onde nasceu, mais que como criatura do Espírito se
expande a todos os tempos e lugares. Desta forma nasce a experiência do
Espírito do fundador, como um dom de Deus para a Igreja, dom que é possível compartilhar e ser trabalhado por muitas outras pessoas, ao longo do espaço e do
tempo. É este Espírito através do fundador ou da fundadora. Para enfrentar a
necessidade que Deus lhe permitiu experimentar, o fundador ou a fundadora, sob
a experiência do Espírito, centra a sua atenção em algum aspecto específico da
figura de Cristo, como o meio mais idôneo, sugerido pelo Espírito, para plasmar
tal necessidade. Não estão excluídos outros meios, ou expressado de maneira
mais clara, todos os demais meios dos quais possa aproveitar o fundador ou a
fundadora nascem da grande necessidade que experimenta ao sair do encontro da
necessidade através deste específico aspecto da personalidade de Cristo, que o
Espírito lhe sugeriu. Para o fundador ou a fundadora, somente Cristo pode
aliviar a necessidade que deu origem a sua obra. Sua vida estará dedicada a
configurar-se o mais que seja possível com este específico aspecto de Cristo
que já provou.
Um último aspecto do carisma é o de saber inserir-se dentro da
Igreja. O fundador ou a fundadora acietaram seguir o caminho que o Espírito lhe
indicou em sua experiência inicial não para fazer um caminho separado da Igreja,
mais sim para ajudar à Igreja para cumprir com sua missão. Os carismas só podem
ser entendidos e justificados na Igreja, para a Igreja e desde a Igreja. Desta
maneira é possível entender também o carisma como “o dom particular da graça
divina operado no que crê por parte do espírito Santo para a utilidade comum da
Igreja.” Conceito que, aplicado à vida consagrada, João Paulo II define da
seguinte maneira: “É difícil descrever, mais ainda classificar, de quais modos
tão variados as pessoas consagradas realizam, através do apostolado, seu amor
pela Igreja. Este amor sempre nasce daquele dom particular de vossos
Fundadores, que recebido de Deus e aprovado pela Igreja, conseguiram ser um
carisma para toda a comunidade. Esse dom corresponde as diversas necessidades
da Igreja e do mundo em cada momento da história, e ao mesmo tempo se prolonga
e consolida na vidas das comunidades religiosas como um dos elementos
duradouros da vida e do apostolado da Igreja.”
Acreditamos por tanto que não convêm diferenciar os termos entre
carisma do fundador, carisma de fundar, carisma de fundação, carisma do
Instituto. Dissemos que são passos conaturais para que se realize o carisma.
Nos centramos no carisma como a experiência do Espírito que Deus concede ao
Fundador para o bem da Igreja, englobando nesta definição todos os passos que
sucederam para dar luz a este dom.
Bibliografia
Catecismo da Igreja Católica, Asociación de Editores do Catecismo, nn.
798 e 799.
Pier Giordano Cabra, em sua obra Tempo di prova e di speranza, Ed.
Ancora, Milano, 2005, p. 147- 150, de alguma maneira tenta fazer uma
classificação dos carismas.
João Paulo II, Exortação Apostólica Pós-Sinodal Vida Consecrata,
25.3.1996, n. 1.
“Reverte em bem da Igreja que os Institutos mantenham a sua índole e
função particular; por isso, sejam fielmente aceites e guardados o espírito e
as intenções dos fundadores bem como as sãs tradições, que constituem o
património de cada Instituto.” Concilio Vaticano II, Decreto Perfectae
Caritatis, 28.10.1965, n. 2b.
Paulo VI, Exortação Apostólica Evangelica Testitificatio, 26.6.1971,
n. 11.
“A definição paulina de carisma expressa um dom particular da graça
divina operando no que crêe por parte do Espírito Santo para a utilidade comum
da Igreja. Trata-se de um neologisma criado provavelmente do próprio São Paulo
que utiliza 16 vezes em suas cartas. É importante descatar que, não obstante a
utilização do termo possa considerar-se relativamente recente, a realidade
profunda que esta definição expressa pode ser estimada como um constante
patrimônio da tradição eclesial.” Giuseppe Buccellato, Carisma e Rinnovamento,
Eizioni Dehoniane, Bologna, 2002, p. 15.
Sagrada Congregação para os religiosos e institutos seculares, Mutua
relationes, 14.5.1978, n. 11.
Sagrada Congregação para os religiosos e institutos seculares,, A
dimensão contemplativa da vida religiosa, março 1980, n. 22.
Sagrada Congregação para os religiosos e institutos seculares,
Elementos essenciais da doutrina da Igreja
sobre a vida religiosa, 31.5.1983, n.
27.
Ibidem, n. 46
Congregação para os Institutos de vida consagrada e as Sociedades de
vida apostólica, Orientações sobre a formação nos institutos religiosos,
2.2.1990, n. 17
Ibidem, n. 61.
Congregação para os Institutos de vida consagrada e as Sociedades de
vida apostólica, A vida fraterna em comunidade, 2.2.1994 n. 45.
Congregação para os Institutos de vida consagrada e as Sociedades de
vida apostólica, A colaboração entre Institutos para a formação, 8.12.1988,
n.7.
João Paulo II, Exortação apostólica Redemptionis donum, 25.3.1984,
n.15.
Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, Asociación de Editores do
Catecismo, Madrid, 2005, p. 68 – 69.
Bento XVI, Mensagem à Sessão Plenária da Congregação para os
Institutos de vida consagrada e as Sociedades de vida apostólica, 27.9.2005.
Antonio Romano, Carisma, em Dicionário Teológico da vida consagrada,
Publicaciones Claretianas, Madrid, 2000, p. 151.
Antonio Romano, I fondatori, profezia dola storia, Editrice Ancora,
Milano, 1989.
Sagrada Congregação para os religiosos e institutos
seculares,Critérios pastorais sobre a relação entre bispos e religiosos na
Igreja, 14.5.1978, n. 11.
A segunda parte da obra de Fabio Ciardi, In ascolto dolo Spirito,
Città Nuova editrice, Roma, 1996, relata a história e as fatigas de várias
congregações para encontrar sua própria índole, até chegar a individualizar o
carisma específico de cada um deles.
João Paulo II, Exortação Apostólica Pós-Sinodal Vida Consecrata,
25.3.1996, n. 48.
Amedeo Cencini, Vita consacrata: itinerario formativo lungo la via de
Emmaus, Edizioni San Paolo, Milano 1994
Sagrada Congregação para os religiosos e institutos seculares,
Critérios pastorais sobre a relação entre bispos e religiosos na Igreja,
14.5.1978, n. 51.
Aqui radica uma das principais diferenças entre apostolado e
voluntariado social.
Giuseppe Buccellato, Carisma e rinnovamento. Rifondazione dola vita
consacrata e carisma do fondatore, EDB, Bologna, 2002, pag. 15.
João Paulo II, Exortação Apostólica Redemptionis donum, 25.3.1984, n.
15
Nenhum comentário:
Postar um comentário