2º DOMINGO DO
TEMPO DO ADVENTO - ANO C
Preparar a vinda do Senhor às nossas vidas.
Podemos situar o
tema deste domingo à volta da missão profética. Ela é um apelo à conversão, à
renovação, no sentido de eliminar todos os obstáculos que impedem a chegada do
Senhor ao nosso mundo e ao coração dos homens. Esta missão é uma exigência que
é feita a todos os batizados, chamados – neste tempo em especial – a dar
testemunho da salvação/libertação que Jesus Cristo veio trazer.
O Evangelho
apresenta-nos o profeta João Batista, que convida os homens a uma transformação
total quanto à forma de pensar e de agir, quanto aos valores e às prioridades
da vida. Para que Jesus possa caminhar ao encontro de cada homem e
apresentar-lhe uma proposta de salvação, é necessário que os corações estejam
livres e disponíveis para acolher a Boa Nova do Reino. É esta missão profética
que Deus continua, hoje, a confiar-nos.
A primeira leitura sugere que este “caminho” de conversão é um verdadeiro êxodo
da terra da escravidão para a terra da felicidade e da liberdade. Durante o
percurso, somos convidados a despir-nos de todas as cadeias que nos impedem de
acolher a proposta libertadora que Deus nos faz. A leitura convida-nos, ainda,
a viver este tempo numa serena alegria, confiantes no Deus que não desiste de
nos apresentar uma proposta de salvação, apesar dos nossos erros e dificuldades.
A segunda leitura chama a atenção para o fato de a comunidade se dever
preocupar com o anúncio profético e dever manifestar, em concreto, a sua
solidariedade para com todos aqueles que fazem sua a causa do Evangelho.
Sugere, também, que a comunidade deve dar um verdadeiro testemunho de caridade,
banindo as divisões e os conflitos: só assim ela dará testemunho do Senhor que
vem.
LEITURA I – Bar 5,1-9
O “livro de Baruc” é um texto de autor
desconhecido, embora se apresente como tendo sido redigido por Baruc,
“secretário” de Jeremias, durante o exílio na Babilônia (cf. Bar 1,1-2). No
entanto, a crítica interna revela (pelos dados pessoais que não quadram com
aquilo que conhecemos de Jeremias, bem como pelo desenvolvimento de ideias e de
perspectivas que são claramente posteriores à época do exílio) que é impossível
atribuir esta obra ao “secretário” de Jeremias. O mais provável é que seja um
texto escrito durante o séc. II a.C. na diáspora judaica. O autor convida os
habitantes de Jerusalém a celebrar uma liturgia penitencial e exorta-os à
reconciliação com Jahwéh.
O texto que nos é proposto está inserido na 4ª parte do livro, integrado numa
exortação e consolação a Jerusalém – muito ao estilo do Deutero-Isaías. Depois
de convidar à confissão dos pecados (cf. Bar 1,15-3,8), o autor manifesta a
certeza de que Israel, iluminado pela luz da sabedoria, voltará ao “temor de
Deus” (cf. Bar 3,9-4,4). Seguir-se-á o perdão; por isso, o profeta convida
Jerusalém a ter coragem (cf. Bar 4,5-37) e a alegrar-se com a atitude
misericordiosa de Jahwéh, em favor do seu Povo pecador (cf. Bar 5,1-9).
O profeta começa por comparar Jerusalém infiel a
uma mulher de luto, desanimada e aflita, sem razões para ter esperança. No
entanto, a mensagem fundamental deste texto é: “esse tempo de luto terminou;
Deus perdoou-te todas as tuas faltas e quer devolver-te a vida e a esperança”.
Para dar corpo a essa promessa de um futuro novo, o autor fala do regresso dos
“filhos” exilados, utilizando a linguagem do Deutero-Isaías e apresentando esse
regresso como um novo êxodo da terra da escravidão (do pecado?) para a
Jerusalém nova da justiça e da piedade. Tal ação resulta – apenas – do amor de
Deus, sempre disposto a perdoar o afastamento dos filhos rebeldes e a reatar
com eles uma história de libertação e de salvação.
ATUALIZAÇÃO
A reflexão sobre este texto pode fazer-se de
acordo com as seguintes coordenadas:
• O Advento é um tempo favorável para o êxodo da
terra da escravidão para a terra da liberdade. Neste tempo somos especialmente
confrontados com as cadeias que ainda nos prendem e convidados a percorrer esse
caminho de regresso que a bondade e a ternura de Deus vão aplanar, a fim de que
possamos regressar à cidade nova da alegria e da liberdade. Em termos pessoais,
quais são as escravidões que ainda nos prendem e nos impedem de acolher o
Senhor que vem?
• As nossas comunidades são, verdadeiramente,
oásis de justiça, de fraternidade, de comunhão, de partilha e de serviço? Que
falta fazer, a nível comunitário, para acolher o dom de Deus e tornar realidade
essa cidade da justiça e da piedade?
• “Vê os teus filhos… estão cheios de alegria
porque Deus se lembrou deles” (Bar 5,5). É nesta atmosfera de alegria e de
confiança serena na ação salvadora do nosso Deus que somos convidados a viver
este tempo de mudança e a preparar a vinda do Senhor às nossas vidas.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 125 (126)
Refrão 1: Grandes maravilhas fez por nós o
Senhor: por isso exultamos de alegria.
Refrão 2: O Senhor fez maravilhas em favor do seu
povo.
LEITURA II – Filip 1,4-6.8-11
A Carta aos Filipenses é, talvez, a mais
afectuosa das cartas de Paulo. É dirigida a uma comunidade a que Paulo se
afeiçoou, que ama Paulo, que o ajuda e que se preocupa com ele.
No momento em que escreve, Paulo está na prisão (em Éfeso?). Dos Filipenses,
recebeu dinheiro e o envio de Epafrodito, um membro da comunidade, encarregado
de ajudar Paulo em tudo o que fosse necessário. Enviando de volta Epafrodito,
Paulo agradece, dá notícias, informa a comunidade sobre a sua própria sorte e
exorta os Filipenses à fidelidade ao Evangelho.
O texto da segunda leitura faz parte da “ação de
graças” com que Paulo inicia a carta: ele agradece a Deus a fidelidade dos
Filipenses e o seu empenho na difusão do Evangelho.
Paulo começa por manifestar a sua comoção pelo
empenho dos Filipenses na difusão do Evangelho e na ajuda àqueles que se
empenham no anúncio da Boa Nova (e de forma especial ao próprio Paulo,
prisioneiro por causa do seu testemunho). Paulo sente uma grande ternura por
esta comunidade atenta às necessidades dos evangelizadores, solidária com todos
os que dão a sua vida à causa do Evangelho.
Depois, Paulo pede a Deus que aumente a caridade
dos Filipenses (apesar de ser uma comunidade modelo, nem tudo era perfeito a
este nível: Paulo tem que pedir a duas senhoras para fazerem as pazes e não
dividirem a comunidade – cf. Flp 4,2-3). A vivência da caridade é fundamental
para que os Filipenses possam aguardar, puros e irrepreensíveis, o dia da vinda
de Cristo.
ATUALIZAÇÃO
A reflexão sobre o texto da segunda leitura pode
ter em conta os seguintes pontos:
• A essência da Igreja de Jesus é ser
missionária. “Ide e anunciai” – diz Jesus. Para que Jesus venha, para que a sua
proposta de salvação chegue a todos os povos da terra, é necessário este
compromisso contínuo com a evangelização. As nossas comunidades sentem este
imperativo missionário? Sentem a necessidade de fazer Jesus nascer para todos
os povos? Estão atentas às necessidades e são solidárias com aqueles que dão a
sua vida à causa do anúncio de Jesus? É com ternura e carinho que acolhemos os
catequistas das crianças, dos jovens, dos adultos da nossa comunidade?
• Só é possível acolher, com um coração puro e
irrepreensível, o Senhor que vem se a caridade for, entre nós, uma realidade
viva. Mas, frequentemente, a vida das nossas comunidades cristãs é marcada
pelas divisões, pelas murmurações, pelas lutas pelo poder, pelas tentativas de
manipular, pelos interesses mesquinhos e egoístas, pelas guerras de sacristia…
Será possível “esperar com coração puro e irrepreensível o Senhor que vem” num
contexto de divisão? Será possível à comunidade ser o espaço onde Jesus nasce,
se não se aceitam todas as pessoas e em especial os pequenos e os pobres?
• É possível que a nossa comunidade não seja,
ainda, um modelo de perfeição: somos um grupo de irmãos com os nossos limites e
defeitos… Sem desânimo, devemos ter presente que somos uma comunidade “a
caminho”, em processo de construção. O que é importante é que saibamos acolher
o Senhor que vem e deixar que Ele nos conduza à plenitude da vida e do amor.
ALELUIA – Lc 3,4.6
Aleluia. Aleluia.
Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas
veredas e toda a criatura verá a salvação de Deus.
EVANGELHO – Lc 3,1-6
O texto de hoje segue-se imediatamente ao
“evangelho da infância”, na versão lucana. Aqui começa, oficialmente, o
Evangelho – isto é, o anúncio da Boa Nova de Jesus. Antes de começar a descrever
a ação libertadora e salvadora de Jesus no meio dos homens, Lucas vai
apresentar João Baptista, o profeta que veio preparar a chegada do Messias de
Deus.
Lucas, como compete a alguém que “tudo investigou
cuidadosamente desde a origem” (Lc 1,3), começa por situar o quadro de João
Baptista num determinado enquadramento histórico. Nomeia 7 personagens (desde o
imperador Tibério César, até ao sumo sacerdote Caifás), num esforço de situar
no tempo os acontecimentos da salvação (estaremos aí pelos anos 27/28). Ele
sugere, assim, que esta aventura do Deus que vem ao encontro dos homens para
lhes apresentar um projeto de salvação e de felicidade não é uma lenda, perdida
nas brumas do tempo e da memória dos homens… Mas é uma história concreta, com
acontecimentos concretos, que podem ser ligados a um determinado momento
histórico e a uma terra concreta.
Num segundo momento, Lucas apresenta a figura de
João Baptista. Ele é “uma voz que grita no deserto” e que convida a preparar os
caminhos do coração para que Jesus, o Messias de Deus, possa ir ao encontro de
cada homem. Lucas começa por sugerir que a missão profética de João lhe é
confiada por Deus: o chamamento de João é apresentado com as mesmas palavras do
chamamento de Jeremias (cf. Jer 1,1, no texto grego), para marcar o carácter
profético do seu anúncio. Depois, Lucas situa num espaço geográfico a
actividade profética de João: ele prega em “toda a zona do rio Jordão” (Mateus
e Marcos, situam-no no deserto)… Trata-se de uma região bastante povoada, sobretudo
depois das construções de Herodes e de Arquelau: o anúncio profético de João
destina-se aos homens, que são convidados a acolher o Messias que está para
fazer a sua aparição no mundo. Finalmente, concretiza-se o âmbito da missão:
João “proclama um baptismo de conversão (“batisma metanoias”), para a remissão
dos pecados”… A palavra “metanoias” sugere uma revolução total da mentalidade
que leva a uma transformação total da forma de pensar e de agir… Para acolher o
Messias que está para chegar, é necessário um processo de conversão que leve a
um re-equacionar a vida, as prioridades, os valores; só nos corações
verdadeiramente transformados, o Messias encontrará lugar.
O Evangelho de hoje conclui-se com uma citação tomada do Deutero-Isaías (cf. Is
40,3-5), onde serve para anunciar aos exilados na Babilónia a libertação e o
regresso a casa, num novo e triunfal êxodo. Lucas sugere, desta forma, que está
para chegar a libertação: é necessário, no entanto, que os destinatários do
projecto libertador de Deus aceitem percorrer esse caminho, se deixem
transformar e acolham “a salvação de Deus”.
ATUALIZAÇÃO
Elementos para a reflexão e a atualização da
Palavra:
• João é o profeta, cujo anúncio prepara o
coração dos homens para acolher o Messias. A dimensão profética está sempre
presente na comunidade dos batizados. A todos nós, constituídos profetas pelo
baptismo, Deus chama a dar testemunho de que o Senhor vem e a preparar os
caminhos por meio dos quais Jesus há-de chegar ao coração do mundo e dos
homens.
• Preparar o caminho do Senhor é convidar a uma
conversão urgente, que elimine o egoísmo, que destrua os esquemas de injustiça
e de opressão, que derrote as cadeias que mantêm os homens prisioneiros do
pecado… Preparar o caminho do Senhor é um re-orientar a vida para Deus, de
forma a que Deus e os seus valores passem a ocupar o primeiro lugar no nosso
coração e nas nossas prioridades de vida.
• Esse processo de conversão é um verdadeiro
êxodo, que nos transportará da terra da opressão para a terra nova da
liberdade, da graça e da paz. Só quem aceita percorrer esse “caminho”
experimentará a “salvação de Deus”.
• A preocupação de Lucas em situar concretamente,
no espaço e no tempo, os acontecimentos da salvação chama a atenção aos
profetas que anunciam a “vinda do Senhor”, no sentido de encarnar o seu anúncio
no contexto cultural e político onde estão inseridos, a ir ao encontro do homem
concreto, com a sua linguagem, os seus problemas concretos, as suas ânsias, os
seus dramas, sonhos e esperanças. A linguagem com que o profeta anuncia a
salvação não pode ser uma linguagem desencarnada, mas tem se ser uma linguagem
viva, questionante, interpelativa.
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