Em toda parte acentuava-se o contraste entre a riqueza e a indigência, bem como o domínio despótico do forte sobre o fraco. O egoísmo era a lei que regia as ações do homem.
Por outro lado, uma imensa corrupção dos costumes se alastrava por todo o território dos césares. A existência dos cidadãos livres decorria numa ociosidade propícia a todos os vícios, na procura desordenada do luxo e dos prazeres. As crônicas daépoca nos descrevem algumas das diversões que tanto atraíam as turbas: orgias, corridas, lutas de gladiadores, comédias. O que mais agradava àquele povo embrutecido era ver correr o sangue humano; com freqüência, ele se mostrava exigente com os imperadores, se o espetáculo não era suficientemente sanguinário para causar-lhe o delírio.
Para compreender o estado de degradação e imoralidade em que soçobrava a sociedade antiga, basta lembrar a epístola de São Paulo aos romanos, na qual o Apóstolo recrimina os escândalos e abusos aos quais eles chegaram, por não terem procurado chegar a Deus através das criaturas.
Não faltavam, entretanto, almas boas que manifestavam sua inconformidade ante todos esses desvarios e conservavam uma vaga reminiscência da promessa, transmitida por Adão e Eva ao saírem do Paraíso, da chegada de um Salvador.
De onde poderia vir esse Esperado das nações? Acaso seria um sábio ou um potentado? Ou um príncipe, um general dotado de poder e força extraordinárias, capaz de dominar sobre toda a humanidade? Todos os olhos estavam ansiosamente à procura de alguém do qual pudesse vir o socorro...
Ali, no fundo de um estábulo, na humilde cidade de Belém, está reclinada a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, feita Menino para Se colocar à nossa altura e à nossa disposição. Ele não vem convocar soldados, nem impor jugos, nem exigir tributos; não Se manifesta sob os fulgores da justiça punitiva que se revelara no Antigo Testamento. Pelo contrário, esse Deus todo-poderoso faz-se todo-debilidade, a marca da realeza repousa agora sobre os ombros de um encantador Recém-Nascido que abre graciosamente os braços e parece dizer, por entre seus infantis vagidos, o que mais tarde anunciará a todas as gerações: "Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores" (Mt 9, 13). Sim, é um reino que Ele vem implantar, mas este será o reino da graça, da bondade e da misericórdia.
Oh! que a humanidade inteira, cansada e sobrecarregada pelo peso de seus pecados, venha prostrar-se diante desse esplêndido presépio no qual se encontra não só o feno dos animais, mas também o alimento dos Anjos! Que o homem velho se despoje das ações das trevas e corra para adorar, enternecido, a Divina Criança que lhe traz a luz!
No meio da noite escura e fria, um mundo novo começa a surgir em torno da sagrada gruta onde vela José abismado em profundo respeito, ora Maria em maternal contemplação e dorme o Menino em paz celestial... (Clara Isabel Morazzani; Revista Arautos do Evangelho, Dez/2006, n. 60, p. 20-21)
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