A ÂNCORA
Senhor me salva!
(Mt 14,30)
Eu tenho certeza que todos vocês
sabem o que é uma âncora assim como conhecem a sua finalidade, de firmar os
navios com segurança, seja no porto seja no mar. Trata-se de um pesado artefato
de ferro, preso a uma corrente, que quando acionado cai com um grande estrépito
em direção ao fundo do mar. Todos os navios têm suas âncoras. Alguns, seja pelo
motivo que for – e o depósito de ferrugem nas engrenagens no-lo revela – jamais
ou raramente as utilizam. O fato é que todas as embarcações, desde os simples
barcos pesqueiros até os gigantescos superpetroleiros, todos são equipados com
esse indispensável dispositivo de segurança.
Assim como os navios, expostos às
grandes ameaças do mar, o ser humano também é vulnerável e impotente,
tornando-se muitas vezes uma presa fácil das investidas do mal. Se não nos
fixamos em algo consistente, mais precisamente em alguém, que nos dê amparo e segurança, nossa existência corre o
risco de, qual um frágil barco de madeira, despedaçar-se contra os rochedos do
pecado, da violência, da doença e de tantos fatores capazes de colocar em risco
nossa vida material, psíquica e espiritual.
O apóstolo Pedro era um pescador
que certamente sabia nadar. Seguindo a ordem de Jesus ele se dispôs, como o mestre,
a caminhar sobre as águas, naquela noite em Genesaré. Quando
o vento agitou o mar, sentindo-se ameaçado, mesmo sabendo nadar, ele pediu a
ajuda de Jesus:
Senhor me salva!
Todos nós entendemos alguma coisa
de carpintaria. Serramos aqui, pregamos ali e colamos acolá. Nosso conhecimento
nessa área nos permite elaborar alguns serviços de emergência, algo assim para
“quebrar o galho”, não é mesmo? Mas na hora de fazer um trabalho mais
importante, definitivo e de maior responsabilidade, a quem apelamos? A um
“carpinteiro” profissional, um especialista na matéria. Assim ocorre a
graduação em nossas necessidades e urgências humanas. Alguém duvida?
Os crentes mais humildes oram e
cantam ao Deus da vida, pedindo proteção. O pessoal mais sofisticado e de mais
posses prefere confiar no poder da sua inteligência, do dinheiro, das amizades
influentes, dos advogados, etc. Eu já conhecia a música, mas quando morei no
nordeste, senti de perto a fé daquele povo simples das comunidades de base,
cantando a plenos pulmões:
Segura na mão de Deus, segura na mão de Deus,
pois ela, ela te sustentará...
não temas, segue adiante
e não olhes para trás,
segura na mão de Deus e vai!
As seguranças que o mundo tem
para oferecer podem ser muito boas, e resolver uma porção de problemas do
dia-a-dia, mas não são cem por cento eficazes. Pedro sabia nadar, mas na hora
do sufoco preferiu “segurar na mão de Deus”, pois intuiu que só dali viria a
solução para a angústia daquele momento.
Nada é tão radicalmente eficaz
como a âncora que Deus nos oferece a cada instante. E não se trata de algo
miraculoso que desce dos céus nos momentos aziagos. Não! Os grandes navios têm
motores potentes, rádio, radar e âncora. Então porque naufragam? Por imperícia
e imprudência do comandante, que deixa de utilizar aqueles instrumentos de
apoio na hora certa. Na nossa vida também ocorre, muitas vezes, algo parecido.
As âncoras estão à nossa disposição. Se naufragamos é porque não soubemos ou
não as utilizamos na hora adequada. Nesse aspecto, gostaria de relacionar
alguns fatores, que reputo como importantes para a “fixação” de nossa vida
cristã:
1. Vida familiar comprometida
A
responsabilidade com a unidade da família é fundamental para a criação de um
tipo de consciência que é capaz de reagir contra tantos males que agridem as
pessoas, e que se não compulsados devidamente, contribuem para a dissolução do
grupo familiar; o mundo por aí está cheio de histórias de derrotas, individuais
e conjuntas que tiveram sua gênese a partir do desmoronar da família;
2. Vida comunitária atuante
A manutenção
de uma vida comunitária atuante, por conta da necessidade de um testemunho
permanente, é um ponderável esteio contra todo tipo de mal; quando nos
inserimos numa comunidade cristã, adquirimos a consciência de que é preciso combater
o mal e todas as investidas do pecado;
3. Oração
A oração é a
ferramenta mais eficaz contras as tentações. Santo Afonso de Ligório ensina que
“quem ora se salva; quem não ora, facilmente se perde”. As grandes vitórias
contra o pecado e suas armadilhas foram desenhadas a partir dos joelhos em
terra, da contemplação ao Cristo no sacrário e com a grande arma do Terço nas
mãos; os antigos místicos bizantinos usam a figura da âncora, comparando-a com
a oração, como o instrumento contra as tentações; para eles, a Rosário é a
corrente que ajuda a fixar a âncora;
4. Estudo da Palavra de Deus
Quem não
estuda Palavra de Deus, não medita o evangelho e não lê diuturnamente a Bíblia,
é incapaz de encontrar um porto seguro onde deixar abrigado o barco de sua vida
espiritual; a leitura permanente das Sagradas Escrituras dá ao cristão a
orientação para o caminho do bem, da virtude e da santidade;
5. Freqüência (no mínimo dominical) à Santa
Missa
Inserida na
vida comunitária, a freqüência à Santa Missa é um poderoso auxílio contra as
urdiduras do diabo, livrando o crente da sedução das armadilhas malignas. A
Missa é para nós um prazeroso encontro com alguém que nos ama. Não se trata de
ir quando temos vontade, mas alimentar o desejo de uma comunhão permanente,
profunda e regeneradora. A Missa é o cimo referencial de toda a nossa vida
cristã. É por onde começam todos nossos projetos de santidade;
6. Frequência aos sacramentos (Reconciliação e
Eucaristia)
Junto com a
Missa, a frequência à Eucaristia é um ato de amor e comunhão. Não é possível um
cristão, especialmente um católico, viver sem a recepção dos sacramentos, seja
da Eucaristia, seja da Reconciliação. Quem comunga (pelo menos uma vez por
semana) e confessa (pelo menos uma vez por mês) tem melhores meios de fugir do
pecado e manter-se puro e isento das tantas tentações que assaltam os menos
prudentes;
7. Atos permanentes de caridade
A caridade (ou
o amor) é a principal das virtudes cristãs; trata-se daquela dedicação à pessoa
do outro, da família, da Igreja e da sociedade; quem pratica o bem,
representado por uma caridade discernida (não se trata de um mero
assistencialismo) mantém-se ligado às coisas, sem tempo para pensar no mal,
tornando-se assim mais resistente ao pecado.
Esses fatores auxiliam
sobremaneira o desenvolvimento da nossa fé e, como tal, são capazes de formar
uma resistência contra os assaltos do maligno. Tem gente que naufraga, famílias
que se destroçam, espíritos que se desviam, porque os engodos do mundo,
sedutores como eles só, tiram dos trilhos aqueles que foram incapazes de se
organizar a partir do conjunto de fatores acima relacionados. Não basta
praticar um ou outro; temos que exercitar todos.
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