Lectio Divina ou Leitura Orante da Bíblia
Recebi um e-mail onde a pergunta era: A Lectio Divina foi criada pelo Concilio Ecumênico
Vaticano II? A resposta é “não”. Graças ao Vaticano II não só o
termo, mas a pratica popularizou-se e hoje é um instrumento necessário de
comunhão com Deus na vida de nós católicos.
Os princípios da Lectio Divina datam do ano 220 da era
cristã (LEITURA – MEDITAÇÃO – ORAÇÃO – CONTEMPLAÇÃO). O grande teólogo,
filosofo e escritor cristão Orígenes de Alexandria, que viveu no século III
dizia que é preciso atenção, constância e oração para compreender a
Sagrada Escritura, e ia mais longe quando afirmava que a oração nasce da leitura assídua e diligente
das Escrituras, ou seja, não tem como ter vida de oração sem a
comunhão com a Palavra, e é do entendimento da Palavra que a nossa vida se
transforma em oração.
“Eu gostaria, em especial recordar e recomendar a antiga tradição da
Lectio Divina, a leitura assídua da Sagrada Escritura, acompanhada da oração
que traz um diálogo íntimo em que a leitura, se escuta Deus que fala e,
rezando, responde-lhe com confiança a abertura do coração”. (Bento XVI)
A Lectio Divina é o encontro com a Palavra de Deus através
da oração, é debruçar-se em seus ensinamentos e descobrir qual a nossa missão,
é mergulhar através da meditação no mistério insondável de Deus e esperar a sua
revelação. A Leitura Orante da Bíblia em resumo é um deixar-se envolver pelo
amor que santifica. Assim como o corpo precisa do alimento para tornar-se forte
e desenvolver as atividades do dia, a alma necessita ainda mais do alimento
espiritual para manter-se firme na fé, base da nossa caminhada rumo à salvação.
Nada nos impede de fazermos a Lectio Divina em grupo, quando
de um momento de evangelização, contudo, não devemos deixar de fazê-la
individualmente como parte da nossa oração pessoal.
A Constituição Dogmática Dei Verbum (cap. VI n.25) ressalta
a necessidade do contato diário com a palavra: “... todos os clérigos e
sobretudo os sacerdotes de Cristo e outros que, como os diáconos e os
catequistas, se consagram legitimamente ao ministério da palavra, mantenham um
contato íntimo com as Escrituras, mediante a leitura assídua e o estudo aturado
(contínuo), a fim de que nenhum deles se torne «pregador vão e superficial da palavra de Deus,
por não a ouvir de dentro», ... Do
mesmo modo, o sagrado Concílio exorta com ardor e insistência todos os fiéis,
mormente (principalmente) os religiosos, a que aprendam «a sublime ciência de
Jesus Cristo» (Fil. 3,8) com a leitura frequente das divinas Escrituras, porque
«a
ignorância das Escrituras é ignorância de Cristo». Debrucem-se,
pois, gostosamente sobre o texto sagrado, quer através da sagrada Liturgia,
rica de palavras divinas, quer pela leitura espiritual, quer por outros meios
que se vão espalhando tão louvavelmente por toda a parte, com a aprovação e
estímulo dos pastores da Igreja. Lembrem-se,
porém, que a leitura da Sagrada Escritura deve ser acompanhada de oração para
que seja possível o diálogo entre Deus e o homem; porque «a Ele falamos,
quando rezamos, a Ele ouvimos, quando lemos os divinos oráculos».
Quatro passos são necessários na Lectio Divina: Lectio (Leitura), Meditatio (Meditação),
Oratio (Oração), Contemplatio (Contemplação).
Lembre-se das palavras do profeta Isaias 50,4: “O Senhor Javé me deu a
capacidade de falar
como discípulo, para que eu saiba ajudar os desanimados com uma
palavra de coragem. Toda manhã ele faz meus ouvidos ficar atentos para que eu
possa ouvir
como discípulo”.
Regra de ouro para uma boa Leitura Orante da Bíblia:
1.
Não tenha pressa, o tempo é de Deus.
2.
Reserve um local tranquilo e busque relaxar ao
máximo.
3.
Aquiete o coração com louvor e oração.
4.
Iniciar sempre com a oração do Espírito Santo.
5.
Leia o texto quantas vezes forem necessárias,
até conseguir interioriza-lo.
6.
Uma dica para quem está iniciando é buscar um
texto pequeno, de preferencia dos Evangelhos ou dos Salmos.
7.
Tenha sempre um bloco de notas, registre as
revelações que vierem ao coração para posterior meditação.
Bento XVI em sua Exortação Apostólica Verbum Domini (n.87)
diz: “Nos documentos que prepararam e acompanharam o Sínodo, falou-se dos
vários métodos para se abeirar (aproximar), com fruto e na fé, das Sagradas
Escrituras. Todavia prestou-se maior atenção à Lectio Divina, que «é verdadeiramente
capaz não só de desvendar ao fiel o tesouro da Palavra de Deus, mas também de
criar o encontro com Cristo, Palavra Divina viva»”. Quero aqui
lembrar, brevemente, os seus passos fundamentais:
1 - Começa com a LEITURA (lectio) do texto, que suscita a interrogação sobre
um autêntico conhecimento do seu conteúdo: o que diz o texto bíblico em si? Sem este momento, corre-se o risco que o texto se
torne somente um pretexto para nunca ultrapassar os nossos pensamentos.
1.
Neste
primeiro momento não devemos ter pressa, leia com calma e atenção.
2.
Busque
contextualizar a passagem bíblica (os personagens, o ambiente, os diálogos),
procure tornar-se parte da história.
3.
Sempre
leia as notas de rodapé.
A Leitura
Orante tem que nos impulsionar a sair do simples patamar de ler e começarmos a
ouvir a Sagrada Escritura.
2 - Segue-se
depois a MEDITAÇÃO (meditatio), durante a qual nos perguntamos: que nos diz o texto
bíblico? Aqui cada um, pessoalmente
mas também como realidade comunitária, deve deixar-se sensibilizar e pôr em
questão, porque não se trata de considerar palavras pronunciadas no passado,
mas no presente.
A meditação
nos aponta a direção, faz-nos enxergar o desejo de Deus. Meditar é muito mais
que uma mera parada em nossa vida agitada, meditar é sintonizar o emocional e o
racional diante da vontade revelada.
3 - Sucessivamente
chega-se ao momento da ORAÇÃO (oratio),
que supõe a pergunta: que dizemos ao Senhor, em resposta à sua Palavra?
A oração enquanto pedido, intercessão, ação de graças e louvor é o primeiro
modo como a Palavra nos transforma.
Devemos lembrar que a oração é a nossa resposta, é a nossa
adesão. Se após a meditação o sentimento que inunda o teu ser, é de culpa,
então que a tua oração seja um pedido de perdão; se é de alegria, louve ao
Senhor; se é gratidão, demonstre através do serviço. Em tudo devemos ter em
mente que a contemplação só terá surdido efeito se nos impelir a uma ação, e a
está ação damos o nome de oração.
A oração que nasce de uma verdade revelada através da
meditação, não pode ser mesquinha ou de barganha, trata-se antes de um
comprometimento sincero que brota do relacionamento fiel e desinteressado com
aquele que nos amou primeiro. A oração é o tornar-nos um com Deus, não dá para
orar de braços cruzados, temos que abri-los para o projeto do Criador.
4 - Finalmente, a Lectio Divina conclui-se com a CONTEMPLAÇÃO (contemplatio), durante a qual assumimos como dom de
Deus o seu próprio olhar, ao julgar a realidade, e interrogamo-nos: qual é a conversão
da mente, do coração e da vida que o Senhor nos pede? São Paulo, na Carta aos Romanos, afirma: «Não vos
conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente,
a fim de conhecerdes a vontade de Deus: o que é bom, o que Lhe é agradável e o
que é perfeito» (Rm 12,2). De facto, a contemplação tende a criar em
nós uma visão sapiencial da realidade segundo Deus e a formar em nós «o pensamento
de Cristo» (1 Cor 2,16).
Contemplação é muito mais do que simplesmente olhar ou admirar,
é na contemplação que Deus realiza seu processo de cura, e para que isso
aconteça é necessário assumirmos a nossa pequenez, a nossa dependência.
Contemplar é silenciar, é deixar-se embalar nos braços do Pai, é sentir-se
amado, perdoado e acolhido.
Uma frase do Beato Tiago Alberione me faz lembrar para que
fomos criados: “O
amor ao Evangelho é o sinal e a característica das pessoas escolhidas por Deus
para grandes coisas”. Fomos escolhidos justamente para espalhar esse
amor, mas para tanto é necessário estarmos impregnado da essência de Deus para
podermos exalar o perfume que santifica.
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