DECIDIR-SE PELO AMOR
O amor, eixo em torno do qual
gira toda a vida humana e cristã, também é questão de decisão. Sou eu que
escolho se quero ou não amar, a quem quero amar e como será o meu amor
Em nossa
vida, constantemente precisamos tomar decisões: se vamos a um passeio ou à
Missa, se permanecemos neste emprego ou buscamos outro, se usamos esta ou
aquela roupa etc. Desde as mínimas coisas até grandes decisões, como a resposta
a determinada vocação, em tudo devemos nos posicionar, fazer uma “cisão”, uma
quebra, um rompimento com algo para assumir outro.
A Santíssima
Trindade, por ser uma comunidade de amor, vive em perfeita harmonia nas decisões
tomadas e assumidas. O Pai, com o Espírito Santo, decidiu enviar o Filho. O
Filho, naquele momento
“sem momento”, decidiu
se apresentar ao Pai dizendo o “eis-me aqui, envia-me”, e sua aceitação levou-o
até o “sim” da cruz e o sim que se perpetua na Eucaristia em todos os
tempos.Jesus tomou decisões e nos ensina a fazê-lo. O Filho, junto com o Pai,
decidiu enviar o Espírito Santo para nos santificar. A Palavra de Deus já nos
alerta: “Que o vosso sim seja sim e o vosso não seja não”, porque se não és
frio nem quente vou vomitar-te”. Assim, o cristão se torna alguém que sabe o
que quer e busca ser conseqüente com o que assume.
O amor, eixo em torno do qual gira
toda a vida humana e cristã, também é questão de decisão. Sou eu que escolho se
quero ou não amar, a quem quero amar e como será o meu amor.
As vezes, no atendimento às pessoas que batem à porta do nosso mosteiro
pedindo orações ou conselhos, fico comovida ao escutar histórias
verdadeiramente dramáticas, mas onde percebo, no meio de tanto sofrimento e
ingratidão a dedicação é um amor total e incondicional de alguma pessoa.
Quantas esposas que acolhem e aceitam seus esposos ingratos, alcoólatras,
infiéis, agressivos e os amam a ponto de conseguirem de Deus sua conversão e
libertação! Por outro lado, também quantos esposos abandonados, traídos e
humilhados por suas esposas, mas que continuam fiéis a um sim pronunciado um
dia! Quantos pais que insistem em amar seu filho que só traz desgosto e
sofrimento!... E cobrem tudo com o amor, defendendo a pessoa amada com “unhas
e dentes”. São pessoas que simplesmente decidiram amar. E muitos milagres
acontecem como conseqüência deste amor.
Quando amo devo agir com a consciência de
estar fazendo uma opção de vida. Não estou vivendo um sentimento que irá
trazer-me apenas prazer ou alegria. Irei assumir toda a pessoa, com seus
limites, seus defeitos, suas quedas, seus fracassos, mas também suas vitórias e
triunfos. Aliás, é na hora da desgraça que se prova o verdadeiro amor.
Penso que muitos relacionamentos — inclusive no matrimônio
— não se
aprofundam nem perseveram por falta desta decisão de amar até o fim, para além
dos sentimentos. Deus nos ama assim. Ele é fiel porque se decidiu a estar
conosco sempre e nos ama em todo tempo, “na alegria e na tristeza, na saúde e
na doença”, sempre! Quando Jesus decidiu ser amor entre nós, assumindo nossa
humanidade e nos ensinando a ser humanos, todas as conseqüências foram
assumidas juntamente, inclusive a cruz e a morte.
“Amar é dar a vida”, e dar a
vida não é sentimento, é ato de decisão. Quando amo alguém estou vivendo este
mistério que Jesus vive na Eucaristia a cada momento. Ele está ali, no sacrário
e em quem o recebe, independentemente da forma como é acolhido e venerado. É o
mesmo para aquele que o ama intensamente como para aquele que o recebe com
indiferença, em pecado ou para aquele que nem o quer receber. Ele continua o
mesmo Amor que se dá na pura gratuidade. E este amor gratuito é que nos
constrange a pagar amor com amor e a mudar nossas vidas.
Santa Teresa de Ávila, em seu livro Castelo Interior ou Moradas,
descrevendo o itinerário espiritual da pessoa que se entrega à oração, diz
várias vezes como se sentia pequena e como que ‘esmagada’ diante de tudo que
Deus lhe fazia, de todas as graças que recebia do Senhor. Amor gera amor, dizia
ela em outro lugar e era firme na formação das carmelitas descalças para serem
pessoas decididas, pessoas de “determinada determinação”, na linguagem
teresiana. Quando a pessoa que Deus coloca em nossa vida para que a amemos não
nos agrada, quando temos de enfrentar lutas de nossa natureza, quando o outro
se torna um peso, ou ele tem “o dom de desagradar-me em tudo” — na expressão
de Santa Teresinha — então sim, estarei diante de uma excelente oportunidade
para viver o verdadeiro amor,o amor gratuito que Jesus me pede e ensina.
Seja nosso amor para com cada pessoa este ato de decisão que nos leve a
perseverar até o fim, ou seja, até a consumação de nossa vida no céu, onde tudo
será amor, pois “na tarde da vida seremos julgados pelo amor” (São João da
Cruz).
Irmã Maria Elizabeth da Trindade, OCD Carmelo de Passos-MG
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