DOMINGO III DA PÁSCOA Ano B
“Vede as minhas mãos e os meus pés: sou Eu mesmo.” Lc 24, 39
O mesmo e Outro
Os encontros com Jesus ressuscitado são sempre surpreendentes. Passam do desconhecimento inicial à alegria do reconhecimento. Uma saudação de paz, o susto e o medo, as dúvidas, o sopro do Espírito, e a missão de levar a Boa Nova são alguns temas comuns dos relatos. É sempre a dificuldade de colocar na estreiteza das palavras o esplendor deste acontecimento. Mas o importante é que estes encontros mudam a vida daqueles que os experienciam. Sendo os mesmos, é como se ficassem também outros: capazes de afastar o medo e de ousar viver como nunca tinham imaginado!
As mãos e os pés de Jesus trazem as marcas da paixão. Não é indiferente esta insistência que São Lucas apresenta: Jesus não foi homem a fingir, nem a ressurreição apagou as marcas do sofrimento. E é como companheiro, como amigo que se preocupa com o desânimo dos discípulos de Emaús e com o medo dos apóstolos fechados em casa, que Ele se aproxima. A vida que vence a morte não acontece sem a lâmina do sofrimento. Várias vezes o convite a seguir Jesus foi apresentado com o horizonte da cruz. Por dentro destes dias difíceis que são os nossos, a dúvida, o medo e até a sensação do abandono de Deus estão presentes. É também por dentro das nossas portas fechadas que o mesmo Jesus se apresenta. Para ajudar a descobrir novos significados da vida, novos modos de sermos com os outros. Sermos os mesmos na identidade mais profunda, mas outros na esperança transformadora!
Ainda mal refeitos da surpresa e iluminados para compreenderem que as Escrituras falam de Jesus, os discípulos foram logo enviados como testemunhas. A sua universidade foi o Espírito Santo e o seu método o amor que haviam de colocar nas palavras e nos gestos. Refazendo as pontes entre as pessoas. Levando a misericórdia e o perdão a todas as realidades feridas. Reinventando em cada tempo os projectos que podem unir as pessoas, levando-as a darem o melhor de si mesmas, a comprometerem-se na mudança do que está mal e degrada o ser humano. Partilhando o trabalho e a festa, vencendo o desânimo e a amargura. O encontro com Jesus ressuscitado não torna a vida mais fácil; torna-a mais plena. E as marcas das nossas paixões são marcas de um amor dado em total gratuidade.
“Enterrar a cabeça como a avestruz” será recusar os apelos do Espírito de Jesus! Que “mesmo” guardar sem impedir que possamos ser “outro”?
P. Vítor Gonçalves
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