“ESPIRITUALIDADE DA
CRUZ E DO SOFRIMENTO”
( I )
Tendemos
a um discurso do sofrimento pelo sofrimento, que às vezes, e com razão, é
apelidado de masoquismo. Há algumas correntes de espiritualidade que atravessam
a história da Igreja e que talvez ainda subsistam, que valorizam o sofrimento
em si mesmo.
Mas
o sofrimento em si é um mal, que pode ser oportunidade de algumas coisas boas.
O sofrimento não é pascal em si mesmo.
Precisamos
de reformular a nossa linguagem e perceber que o sofrimento tem um potencial
pascal.
No
entanto, para que este potencial pascal atue e seja transformador, é preciso
evangelizar a vivência cristã do sofrimento e, tendo Jesus Cristo como exemplo,
ver o modo como ele viveu o sofrimento. Jesus Cristo lutou contra tudo o que
foi sofrimento e aceitou o inevitável, transformando-o em esperança e amor.
Esta
é a espiritualidade do sofrimento que devemos saber viver e apresentar.
Na
exercitação de uma espiritualidade do acolher o sofrimento como expiação e alma
reparadora é isto que nos é proposto como renúncia e penitência, para
desenvolver capacidades interiores que nos tornam incapazes de percorrer este
caminho.
O sofrimento tem respostas ou é caminho?
Não podemos pensar que a fé oferece uma
resposta óbvia. Quem assim o pretender, aumenta apenas o sofrimento. A fé
oferece um caminho para atravessar a experiência do sofrimento. Mas oferece
enquanto caminho, não como resposta adquirida.
Jesus
na cruz pergunta «meu Deus, onde estás? Porque me abandonaste?» Ele percorre o
caminho, não o ilude.
É
este o caminho que precisamos percorrer. Partir da experiência do sofrimento
que nos faz perguntar por Deus, e também por nós próprios, pela nossa
verdadeira identidade, de forma a tornarmo-nos mais conscientes sobre quem
somos, da nossa insuficiência e da necessidade que temos de Deus, e nos faz
chegar ao fim e dizer «entrego o meu espírito, tudo está consumado». Mas isto é
um trajeto não é uma resposta óbvia.
E
que podem fazer o mundo, o demônio e seus servidores contra quem atingiu o amor
sem medida pelo sofrimento?
Nada!
Eles apenas nos fornecem a ocasião para provarmos nossa virtude. Realmente, a
virtude é posta à prova pelo que lhe é contrário. A pessoa deve até alegrar-se
e rejubilar-se, deve procurar sofrer sempre com Cristo crucificado, deve
aniquilar-se por Ele, deve humilhar-se. Deve deleitar-se na dor e na Cruz. E ao
desejar o sofrimento, encontrará alegria. Mas se procurar a alegria, achará a
dor.
O
próprio Jesus, no seu sofrimento redentor, se tornou, num certo sentido,
partícipe de todos os sofrimentos humanos" (Salv. Dol., 20). Ele
"está presente em quem sofre, pois o seu sofrimento salvífico foi aberto
de uma vez para sempre a todo sofrimento humano" (Salv. Dol. 30). A vida inteira
de Jesus está marcada pela dor e o sofrimento que, a partir dele, podemos
chamar, também e com maior propriedade, de cruz. A cruz de Jesus não apareceu
só na Via Sacra daquela última Sexta-feira, antes da Páscoa da ressurreição.
Ele assumiu a cruz já na hora da encarnação, início de sua Paixão, quando
incorporou a condição humana, embora sendo divino (cf. Filp 2, 5-13), com todos
os seus valores e limitações. Na verdade, sua vinda não teria nenhum sentido ou
razão se na sua vida não aparecesse a cruz e a ressurreição. Os Apóstolos, seus
companheiros de caminhada, depois da ressurreição, entenderam o porque da cruz
e também da encarnação e de todos os seus fatos e ditos.Tudo, nele e por ele,
termina sendo obra de amor, ou melhor, obra do Amor.
Pe.Emílio Carlos +
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