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LECTIO DIVINA
A intenção da Leitura Orante é levar-nos, a escutar Deus e assim conhecer sua vontade, por meio da Palavra. E aí nós podíamos perguntar, mas porque a Palavra? O que tem de especial na Palavra?
O que tem de especial na palavra, não só Palavra de Deus, mas também humana, é que ela nos possibilita a comunicação com o outro. Ela tem esta função, a função da comunicação, ela nos possibilita expressar. Mesmo que eu use a palavra simplesmente para dar uma informação, narrar um fato, para informar um acontecimento, coisa do passado, mesmo assim eu me expresso.
Porque mesmo que seja para informar um fato o ser humano coloca algo de si, diz alguma coisa de si, ao narrar o fato. Por isso, mesmo quando duas pessoas narram o mesmo acontecimento, eles nunca são idênticos, mesmo que seja simples informação eu coloco algo de mim e você coloca algo de si, e desta forma nós nos expressamos, estamos nos expressando. Todo homem que fala se exprime. E quando o homem se expressa ele busca o outro, eu não falo para uma pedra, eu falo para uma pessoa e espero por uma resposta. A palavra busca o outro ela é relação, ela cria a relação. Sempre quando eu falo, eu ponho algo de mim e quando ponho algo de mim eu espero que você acolha e me responda com algo de si, é um apelo.
O homem é um ser em relação, em relação com Deus, em relação com os outros, em relação consigo mesmo. Para relacionar-se, ou seja, para ser aquilo que o homem é chamado a ser, o homem tem necessidade da disciplina da palavra. É mediante a palavra que o homem penetra no emaranhado do mundo, das criaturas, para relacionar-se com elas. Deus cria as criaturas do nada por meio de sua Palavra, como nos mostra o Livro do Gênesis, cap. 1, e “leva ao homem para ver como ele os havia de chamar...” (Gn 2,19). Adão penetra o ser de cada animal e dá um nome a cada um, é ele quem os nomeia, e a partir daí cria uma relação com eles, cria a possibilidade da relação. É dando um nome, é falando, que ele se aventura no universo interior das criaturas, e não só das criaturas, mas de si mesmo, no mistério de si mesmo, falando ele procura sua auto-compreensão, que muitas vezes é confusa, busca a compreensão de um mistério, para compreender-se e exprimir-se.
A palavra dá a cada um a revelação de si na relação com o outro, e ai ela desperta, ela chama para uma comunhão de vida, não só de idéias, mas de vida. A Palavra de Deus revela Deus, não uma idéia de Deus, mas o próprio Deus, nós o encontramos na Palavra, não como uma idéia, mas como uma pessoa, Jesus, não uma Palavra solta, sem conteúdo, mas uma pessoa. Bento XVI, na encíclica, Deus Caritas Est, diz: que a verdadeira novidade do Novo Testamento não reside em novas idéias, mas na própria figura de Cristo, que da carne e sangue aos conceitos – um incrível realismo. Quando Jesus fala nas suas parábolas, do pastor que vai atrás da ovelha perdida, da mulher que procura a dracma, do pai que sai ao encontro do filho pródigo e o abraça, não se trata apenas de palavras mas do seu próprio ser e agir.” A Palavra inteira fala dele, desde o primeiro livro, Gênesis, até o último, Apocalipse.
A Palavra vai caminhando, contando as histórias de Deus com o povo até chegar nele, Jesus. E ele tem essa sede da relação, da relação amiga, intima. Parece que é onde Jesus queria chegar, depois de ter falado tudo de si, ter si expressado por meio da palavra e das ações aos discípulos, ele disse: “Já não vos chamo de servos, mas de amigos”. Jesus tem sede da amizade. Parece que fica tudo em vão se não conseguimos chegar até ai, na amizade com Deus.
Santo Agostinho disse: “Duas coisas são necessárias nesse mundo: a vida e a amizade”. Deus criou o homem para que ele exista e viva, e não esteja só, a amizade, portanto, é exigência da vida.
Deus quer ser nosso amigo, quer revelar-se, e para ser amigo é preciso se dar a conhecer. A Dei Verbum, documento do Concílio vaticano II, sobre a revelação de Deus, diz: “Deus invisível, na riqueza de seu amor, fala aos homens como a amigos, e conversa com eles, para os convidar e os admitir a participarem da sua própria vida.” É para comunhão de vida.
Este é o convite, a intenção da Lectio Divina, não dar conhecimentos científicos da Palavra, mas fazer amigos de Deus, de Jesus.
Milton Machado Junior
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