17º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO B
29 DE JULHO DE 2012
“Vós
abris a mão e sacias todo o ser vivo com fartura” (Sl 144,16)
Leituras:
Segundo Livro dos Reis 4, 42-44;
Salmo 144 (145);
Carta de São Paulo aos Efésios 4, 1-6;
João 6, 1-15. (Multiplicação dos pães).
COR LITÚRGICA: VERDE
Nesta Eucaristia, onde celebramos a
multiplicação dos pães, Jesus se manifesta em todas as pessoas que se
comprometem em combater a fome do povo. Comendo o pão à mesa do Senhor
realiza-se para nossa comunidade aqui reunida o milagre da multiplicação, ao
mesmo tempo em que somos chamados em missão para vencer a fome do mundo.
Acolhemos Jesus como aquele que se põe a serviço e nos ensina o caminho que
leva ao Pai.
1. Situando-nos brevemente
Interrompendo a sequência do Evangelho de
Marcos, a liturgia nos propõe, nos próximos cinco domingos, o capitulo sexto
(6) de João: a multiplicação dos pães e o discurso sobre o Pão da Vida.
A multiplicação dos pães concentra um
simbolismo muito forte, revolucionário, e caracteriza sobremaneira a identidade
dos cristãos. Não é apenas uma imagem da Eucaristia, mas revela a intimidade do
Reino anunciado e aponta para o banquete messiânico, no final dos tempos,
quando todos serão saciados e a morte, vencida.
Este é o verdadeiro sentido da missão de
Jesus, que sente as necessidades do povo e o alimenta com a Palavra e o pão
partilhado. O pão é abençoado porque é um presente e alimento de Deus para
todos os viventes. Repartir o pão com os pobres significa entrar e viver na
dinâmica do Reino. Repartir o pão é participar na comunhão do corpo e sangue do
Senhor, entregues para a vida do mundo. É o segredo maior do Reino, por isso,
nada pode ser perdido, mas recolhido e sempre multiplicado.
O memorial da páscoa do Senhor implica nessa
memória da partilha e na profunda solidariedade com todos os que passam fome e
são rejeitados e expatriados.
Celebrar a Eucaristia no contexto da
multiplicação dos pães é contestar o sistema de acumulação que domina o mundo e
coloca milhões na miséria.
2. Recordando a Palavra
A multiplicação dos pães, quarto sinal do
Evangelho de João, é o centro dos sete sinais que simbolizam a ação de Jesus.
Jesus passa para a outra margem do lago, isto
é, para outra chave de ver e entender o mundo, e aí estabelecer um novo modo de
viver e compreender o sentido da criação, lugar de Deus na história e no
relacionamento humano. Sinais da novidade do Reino.
Jesus se encontra na Galileia, marcada pela
escravidão, região dos trabalhadores pobres, mantida por latifundiários que
moram na corte de Herodes. A Páscoa dos judeus está próxima, bem como o sonho
de liberdade e pão. O povo decide não ir a Jerusalém, mas seguir Jesus. Gesto
novo e revolucionário. Liberta-se, assim, do poder explorador concentrado no
Templo de Jerusalém.
E Jesus se torna verdadeiro libertador que
conduz à Páscoa autêntica. É o novo Moisés, sobe ao monte e é rodeado por muita
gente que deseja escutá-lo. O povo vinha de longe, atraído pela fama e pelo
fascínio dos sinais. Jesus aproveita esses momentos para ensinar a partilha,
característica fundamental de seu projeto. Começa interpelando os discípulos
sobre como solucionar o problema da fome. Logicamente, no sistema do império e
na política do Templo, nunca haverá comida e pão para todos. Os discípulos
atestam isso.
E então a primeira leitura adquire sentido e
prepara para entendermos proposta de Jesus. Pão de cevada era comida modesta,
de pobres ou gente simples, e o único alimento que tinham para partilhar naquele
momento.
Jesus não dá esmola, mas ensina as pessoas a
repartir o que têm, mesmo que sejam cinco pães e dois peixes. Há uma grande
diferença entre dar esmola e o ato de repartir. A solidariedade e o partilhar
geram irmandade, trazem alegria. A esmola e o paternalismo podem produzir
desigualdade, descontentamento, divisão e humilhação.
Jesus revela, faz sensível e encarna a bondade
e a generosidade de Deus. O povo come enquanto precisa e ainda sobram doze
cestos. Doze é numero simbólico que, às vezes, se refere à organização do Povo.
Mas o que se torna claro é que não se deve desperdiçar o dom de Deus.
A primeira leitura lembra a atividade
profética de Eliseu no Reino do Norte. No seu tempo, muitos pobres, para
sobreviverem, submetiam-se a dívidas com os latifundiários, vendendo seu
trabalho por nada. Eliseu, homem de Deus, ensina o povo a se organizar para
sair de tal situação. A libertação não é um favor, mas presente generoso de
Deus.
A multiplicação dos pães sacia cem pessoas com
vinte pãezinhos de cevada, lembrando a fartura do maná, no tempo de Moisés.
Embora à primeira vista pareça não ser suficiente para tanta gente, quando
partilhado, satisfaz a todos e ainda sobra.
Fartura, abundância e alimento à vontade são
frutos da partilha, que é sinal da realização do projeto de Deus, da chegada do
tempo messiânico que se realiza em Jesus Cristo.
O Salmo 144 (145) respira a aliança de Javé
com o rei, representante do povo, na defesa e no cultivo da justiça para todos.
O povo que tem Javé como Deus é feliz. Javé é um guerreiro poderoso, aliado do
rei na defesa do povo. Ele é Senhor do universo e da história. Ocupa-se com o
ser humano e coloca a sua atenção sobre o povo da aliança.
As leituras bíblicas deste domingo se
completam no salmo, que mostram quem é o Deus de Jesus Cristo, aliado dos
pobres, mensageiros da boa nova da partilha e da vida para todos.
Por isso, em comunhão com o povo explorado
pelos poderosos louvamos a fidelidade de Deus, traduzida em suas obras
amorosas. Ele ampara, endireita, dá alimento, estende a mão e sacia. Ele ama os
que estão encurvados, os que caem, os oprimidos.
A segunda leitura é uma exortação à unidade.
Não são simples conselhos, mas exigências éticas que tem suas raízes no ser de
Deus para os homens. Por isso, Paulo, na prisão, suplica aos efésios que vivam
de acordo com a vocação a que foram chamados e se esforcem para manter a
unidade, já que receberam um mesmo batismo. O reconhecimento da paternidade de
Deus nos leva a admitir que os “demais” são nossos irmãos!
A unidade é a essência da Igreja: um corpo, um
espírito, um Senhor, uma fé, um batismo, um Deus e Pai de todos. E, para manter
essa unidade, é preciso humildade, paciência e suportar-se mutuamente na
caridade. A humildade e a modéstia desempenham papel muito importante onde a
unidade é ameaçada.
A mansidão, o espírito pacífico e a docilidade
são comportamentos que distanciam toda espécie de rixa, evitam a agressividade
e o sentimento de superioridade. A paciência é um sinal essencial do amor e
torna possível a unidade e a paz. É o Espírito que cria e conserva a unidade.
A unidade da comunidade cristã, portanto, provém
da união existente na Trindade que age na história para o bem e a felicidade de
todos. Trabalhar a serviço da unidade dos cristãos é prolongar a ação da
Trindade na história e na Igreja.
3. Atualizando a Palavra
Jesus saciou pessoas que tinham fome e se
revelou o pão da vida eterna, levando em conta a situação concreta e real do
dia a dia. O pão, a comida que Ele oferece não é o símbolo do pão sobrenatural.
Nos desígnios do Pai, não é possível revelar o pão da vida eterna sem
solidarizar-se com as realidades humanas.
O amor aos pobres, como o amor aos inimigos, é
um teste e um testemunho por excelência da nossa caridade e doação. Reconhecer
aos pobres o direito de receber o pão da vida significa engajar-se de corpo e
alma nas exigências do amor, e, para o cristão, fazer acontecer uma “nova
multiplicação dos pães”.
Se o povo passa fome não é tanto pela pobreza
em si, mas pelo fechamento de quem não se importa com os demais. A partilha
marcou profundamente as primeiras comunidades cristãs. Ao partir o pão,
descobre-se a presença nova do Ressuscitado!
A salvação trazida por Jesus atinge nossa vida
em todas as suas necessidades, em sua totalidade, e não deixa ninguém com fome.
Por isso, a atuação e responsabilidade com as questões sociais, econômicas e
políticas são sinais da salvação que Deus quer realizar, hoje, através de nós.
Ao multiplicar os pães, Jesus nos oferece
critérios evangélicos fundamentais para vivermos a fraternidade, a partilha e a
solidariedade. É repartindo e sendo solidários que realizamos o projeto de
Jesus, o banquete de fartura e de alegria entre irmãos que se amam. O dinheiro,
a terra, os bens ou servem para criar a fraternidade ou acabam dividindo e
matando as pessoas.
Jesus ensina que a dinâmica do Reino é a arte
de repartir. Somente o dinheiro do mundo não seria suficiente para comprar
alimento necessário para os que estão passando fome... O problema não se
soluciona comprando, mas repartindo.
A dinâmica do mundo capitalista é o dinheiro.
A filosofia é que, sem dinheiro, nada se pode fazer. Tudo é convertido em moeda. No mundo
capitalista, não há espaço para a gratuidade. Tudo tem seu preço! Esquecemos,
contudo, de que a vida nos é dada por pura gratuidade de Deus.
4. Ligando a Palavra e a Eucaristia
Necessidade de força e de sentido para a vida,
participamos da ceia do Senhor, onde se realiza entre nós a multiplicação dos
pães.
Jesus, o Pão da vida, sacia a fome com a
Palavra que nos revela o sentido da vida e com a ceia eucarística, sacramento
da salvação, sinal e antecipação do banquete sem fim a que somos destinados e
convocados.
Ele nos convida a termos compaixão das
multidões famintas. Precisamos abrir as mãos e o coração para a partilha e a
solidariedade, a fim de vencermos a fome e a miséria do mundo.
A eucaristia é o pão que sacia e plenifica o
sonho de paz e fraternidade. É o alimento para conservar a vida. É o pão que
nos dá força para superar as atribulações que existem e atormentam a vida. É
segurança de que Deus nos ama e a certeza da ressurreição. É Deus-conosco e no
meio dos pobres neste mundo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário