26º
Domingo do Tempo Comum
29 de setembro de 2013
O amor, essência de Deus em nossa
vida...
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“Tu,
porém, ó Homem de Deus, foge destas coisas, procura antes a justiça, a
piedade, a fé, a caridade, a constância, a mansidão”
(1
Tm 6,11-16)
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Leituras:
Amós 6, 1a.4-7;
Salmo 145 (146), 7.8-9a.9bc-10 (R. 1);
Primeira Carta a Timóteo
6, 11-16;
Lucas 16, 19-31.
COR LITÚRGICA: VERDE
A
liturgia hoje nos fala da parábola do rico e do Lázaro. Hoje, haveria muitos
lugares onde poderíamos encontrar esse desamparado Lázaro: ele está doente sem
hospital, desempregado, é mendigo na rua, mora em cortiços, alagados, favelas,
é migrante sem destino, operário de salário mínimo, criança fora da escola, mãe
solteira sem amparo, idoso que ninguém quer. Neste “Dia da Bíblia” o Senhor quer
abrir nossos ouvidos e nosso coração para acolher a “Palavra VIVA e eficaz” que
brota da situação sofrida dos empobrecidos, nos desperta da alienação e da indiferença
e nos indica a solidariedade como verdadeiro caminho da SALVAÇÃO.
1. Situando-nos
brevemente
É o Senhor que aqui nos reúne.
Chamados a viver o amor procuramos, na escuta da Palavra de Deus, entender e
aperfeiçoar nossa vivência desse grande mistério. Na Celebração da Eucaristia,
em que Cristo se entrega a nós, vamos ao encontro do Pão da Vida eterna,
alimento para nossa caminhada. É o amor que nos reúne, hoje, para juntos
elevarmos nossas preces e pedidos a Deus Pai.
Chegamos ao final do mês de
setembro, especialmente dedicado à escuta e à reflexão sobre a Palavra de Deus.
Inspirada por ele, a Sagrada Escritura manifesta de modo primordial o imenso
desejo do Pai de nos revelar o grande mistério da salvação.
Neste domingo celebramos o Dia da
Bíblia. A exemplo de São Jerônimo, queremos aprofundar nossa compreensão da
Palavra para vivenciarmos o chamado de Deus e vivermos na plenitude do amor.
Deixemos que Deus, que nos falou
através das leituras que ouvimos, toque o nosso coração. Veremos que a
perspectiva do futuro tem influencia sobre o hoje e que a relação da pessoa com
seus irmãos incide na vida definitiva na presença de Deus.
2.
Recordando a Palavra
Na primeira leitura, ouvimos uma
passagem do profeta Amós. Natural de Judá, Amós tralhava como pastor. Foi
chamado para exercer seu ministério profético em Israel. A situação era
vibrante. O rei Jeroboão II havia acabado de levar os limites do império até
onde Davi havia chegado. A sociedade prosperou.
No entanto, com a prosperidade,
houve decadência nas questões morais. A prostituição era comum. As fraudes,
muito mais. A religião era utilizada apenas para amenizar a consciência dos ricos,
perpetradores da miséria.
A passagem de Amós aqui vai contra
os comerciantes, responsáveis diretos não só pela miséria do povo, mas também,
e muito mais, por sua condição de indignidade. O castigo veio, a perda de tudo
aconteceu por causa da injustiça que cometeram contra os “pobres do Senhor”.
O Salmo que cantamos, em nítido
contraste com a atitude dos chefes do povo, acusados na primeira leitura,
apresenta o rosto misericordioso do Deus que faz justiça aos oprimidos, dá
alimento aos famintos, liberdade aos cativos, abre os olhos dos cegos, faz
erguer os caídos, ama aquele que é justo, protege o estrangeiro, o órfão e a viúva
e confunde o caminho dos maus. Felizes os que nele confiam!
A Carta de São Paulo a Timóteo é
direcionada às comunidades cujos líderes deixaram o poder lhes subir à cabeça.
Trata-se de uma orientação pastoral para o povo não dar ouvidos aos falsos
profetas e, principalmente, às doutrinas anticristãs então muito influentes.
A parábola que ouvimos hoje se
encontra somente no Evangelho de Lucas, o evangelista dos pobres, o qual vê, na
riqueza injusta ou mal administrada, um perigo mortal para a fé e para a vida.
O rico, a julgar por suas vestes e
por seu modo de viver, levava uma boa e confortável vida. O pobre Lázaro,
enquanto suas feridas eram lambidas pelos cachorros, procurava saciar sua fonte
com as sobras do rico.
Eis que os dois homens morrem.
Enquanto o homem rico, que tivera uma vida boa e confortável, passa aos
tormentos da região dos mortos, Lázaro, que tivera uma vida de sofrimentos, é
acompanhado por anjos à morada eterna, na qual é referido junto do Pai Abraão.
Sem demora, os sofrimentos provocam
no rico um sentimento de revolta. Ele procura receber de Lázaro, a quem antes atormentava,
um pequeno sinal de alívio. A este pedido, ouvimos de Abraão a confirmação
daquilo que fora anunciado: o rico já havia recebido, em vida, todas as chances
para se reconciliar, porém não as aproveitou.
O rico ainda tenta, sem sucesso,
pedir que Lázaro avise seus familiares acerca da iminente condenação. Uma vez
mais, ouvimos de Abraão o reforço da condição em que vivem: aos vivos é
necessário escutar a Palavra de Deus; àqueles que já partiram desta vida,
porém, já não é mais possível retornar.
Temos, portanto, neste Evangelho, a
figura do rico, cujas posses podem, inicialmente, parecer causa condenação.
Desde o Antigo Testamento, o pensamento do povo considerava a riqueza como
preferência de Deus. Devemos ressaltar a promessa feita por Deus a seu povo, no
Antigo Testamento, acerca da abundância de bênçãos e da riqueza de bens
materiais. A riqueza era então tomada como sinal da fidelidade na relação da
pessoa com Deus.
O problema e, por consequência a
condenação, surgem quando o rico despreza o clamor daquele indigente chamado
Lázaro, que procurava saciar sua fome, não recebendo, no entanto, nem mesmo as
migalhas. O rico foi, portanto, condenado porque tirou do pobre.
Quanto à figura do pobre chamado
Lázaro, devemos prestar atenção em seu sofrimento devido à condição de miséria,
como o texto sugere. Também aqui há relação com o pensamento do Antigo
Testamento. No tempo de Jesus, o significado da pobreza, especialmente da
doença, está relacionado às conseqüências do pecado, seja da própria pessoa,
seja de seus antepassados.
Percebemos isto em outra passagem,
quando, ao ver um cego de nascença, os discípulos perguntam qual pecado ele
havia cometido para assim nascer. Eles escutam do próprio Jesus a explicação de
que, também na miséria daquele homem, Deus manifestava suas obras. Há,
portanto, na proposta de Jesus, uma quebra de conceitos e de paradigmas daquele
povo.
3.
Atualizando a Palavra
A liturgia da Palavra deste domingo
nos chama a atenção para a forma como levamos nossa vida. A força com que são
apresentados os acontecimentos, na parábola que ouvimos, nos convoca a avaliar
a forma como vivemos e nos relacionamos com os irmãos. O critério para tal
avaliação é o mandamento do amor.
Escutamos ponderações semelhantes
nas demais leituras de hoje. O profeta Amós chama a atenção para a prudência, a
reflexão e o exame de consciência, necessários à vida com Deus. O apóstolo
Paulo reflete sobre a vivência em plenitude da Palavra de Deus e o cuidado com
o objetivo a que fomos chamados: o amor.
Como vivemos? Com que nos
preocupamos? Mais ainda: com quem nos preocupamos?
Através da figura do rico da
parábola, Jesus nos ensina como a abundância dos bens materiais pode retirar a
atenção de nosso verdadeiro plano de vida, aquele dito por Jesus no evangelho:
“Amará o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, com, toda a tua alma, com
todo o teu entendimento; e a teu próximo como a ti mesmo” (Mc 12, 30ss).
Toda a vida de Jesus foi ocupada em
demonstrar a necessidade do amor para viver bem para sempre. A preocupação com
os bens materiais, assim como o prazer em excesso, retiraram daquela pessoa sua
humanidade.
Ao nos atermos à figura do pobre
chamado Lázaro, nos damos conta do grande amor de Deus, manifestado de especial
forma pelo cuidado com os pobres e necessitados. Somos todos chamados a
demonstrar diariamente nosso amor aos irmãos.
O amor, essência de Deus em nossa
vida, de fato, apenas pode ser vivido se nos ocupamos dele no trato com as
pessoas. Na parábola que acabamos de escutar, não tendo quem dele cuidasse, o
pobre Lázaro recebe de Deus as bênçãos e a recompensa por sua vida de fé.
E, em sua vida, Lázaro, apenas e
tão somente sofre as injúrias do mundo. Ao ser chamado por Deus à vida eterna,
é carregado pelos próprios anjos à vida. Se for sofrimento que o acompanhava
anteriormente, muito maior será o cuidado de Deus para com ele na vida eterna.
Estamos perante uma página de
grande atualidade que contesta a acumulação indevida e escandalosa de riquezas
por parte de poucos, perante uma pobreza generalizada e trágica, que contradiz
clamorosamente o desígnio de Deus sobre o mundo e coloca sempre em crise as
relações de convivência entre indivíduos e nações.
Quantos pobres como Lázaro jazem
famintos e cheios de chaga às portas das chamadas sociedades de bem-estar,
sobretudo em países onde a riqueza está concentrada vergonhosamente nas mãos de
poucos, sem escrúpulos e privados de sensibilidade social?
É urgente a todos os níveis uma
inversão de tendência: é necessário lançar pontes sobre os abismos que nos
separam, antes que se tornem precipícios de falta de comunicação e de conflitos
irreparáveis. Neste processo, os cristãos têm grandes responsabilidades e, por
vezes, decisivas (Giuseppe Casarin [org.]
Leccionário comentado, vol. II, São Paulo, Paulus, 2010, p.449).
4.
Ligando a Palavra com ação litúrgica
A parábola que ouvimos e seu
ensinamento constituem grande e valiosa ajuda em nossa vida de cristãos. Nós
nos deparamos com cada um de seus personagens. Como vivemos? Com que nos
preocupamos? Com quem ocupamos nosso tempo e nosso viver? Buscamos, na Palavra,
o fundamento e o critério do amor?
Depois de buscarmos, na Palavra, o
fundamento e razão de nossa existência, somos também chamados à mesa da
Eucaristia, na qual encontramos nossa verdadeira vocação: a vida em Cristo.
Em cada celebração eucarística,
vamos ao encontro dos frutos eficazes da comunhão sacramental. Nossa vida no
amor é fortalecida quando entramos em comunhão com o Corpo e Sangue de Jesus
Cristo. É isto que rezamos na oração do dia: o poder de Deus não está nas
posses, mas no perdão e na misericórdia. É preciso caminhar ao encontro das
promessas divinas para alcançarmos os bens que nos estão reservados.
Entre o rico e seus familiares
havia um “grande abismo”, intransponível. Na oração sobre as oferendas, rezemos
para que nossa oferenda agradável “abra para nós a fonte de toda a bênção”.
Deus não é tão mesquinho como demonstrou o pedido do rico: “manda Lázaro molhar
a ponta do dedo para me refrescar a língua”. Deus faz jorrar sobre nós a água e
da salvação.
A oração após a comunhão pede que a
Eucaristia que hoje celebramos “renove a nossa vida, para que, participando da
Paixão de Cristo, neste Mistério, sejamos herdeiros de toda a glória”.
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