Um dos problemas que temos de enfrentar e resolver é este: para onde dirigir a minha oração?
Não teremos condições de apresentar ao Senhor a oração que nos propomos fazer, a menos que ela seja, para nós, importante e significativa. Se estamos desatentos às palavras que pronunciamos, se o nosso coração não reage a elas ou se a nossa vida não se orienta no mesmo sentido, a nossa oração não chegará a Deus.
Portanto, a primeira coisa a fazer é escolhermos uma oração na qual possamos absorver toda a nossa mente, todo o nosso coração e toda a nossa vontade. Não é necessário que essa oração seja um grande modelo de arte litúrgica, mas tem de ser verdadeira, algo que não fique muito aquém de tudo o que desejamos expressar. Devemos compreendê-la em toda a sua riqueza e exatidão.
Três coisas devemos fazer quando recorremos às palavras. Podemos usar a oração espontânea, oração que jorra da nossa própria alma; podemos utilizar a breve oração vocal extremamente intensa e rica em conteúdo — orações muito breves — podendo conter um mundo de significados; e podemos usar aquelas que, às vezes de maneira antipática, são chamadas, de orações feitas: vão desde produções vulgares de pessoas que tentam inventar orações para todas as oportunidades, até a manifestação da experiência profunda dos santos, expressa em orações não inventadas por eles, mas que o Espírito Santo gravou no íntimo de suas vidas e de seus corações. Gostaria de comentar cada uma dessas categorias.
Rezar espontaneamente é possível em duas situações: nos momentos em que nos tornamos vivamente conscientes de Deus, quando essa consciência nos impele a uma resposta de adoração, de alegria, ou qualquer modalidade de resposta que sejamos capazes de oferecer sinceramente e perante o Deus vivo; ou então, quando subitamente tomamos consciência do risco fatal em que incorremos quando estamos disponíveis perante Deus, momentos em que repentinamente clamamos a partir do abismo do nosso desespero e abandono, e também a partir do sentimento de que não há, para nós, esperança de sermos salvos, a menos que Deus nos salve.
Essas duas situações constituem os dois pólos extremos: a visão acerca de nós mesmos na situação desesperada em que nos encontramos, sem Deus, sozinhos, ansiosos e incapazes de abrir caminho; ou também o deslumbramento de nos acharmos subitamente face a face perante Deus, podendo espontaneamente rezar, sem darmos demasiada importância às palavras que usamos. Podemos ir repetindo: "minha alegria, minha alegria." Podemos dizer palavras, porque estas não têm importância, são apenas maneiras de ir sustentando o ânimo, falando sem nexo, loucamente, do nosso amor e do nosso desespero. Lembremos a passagem do Evangelho referente à transfiguração, na qual Pedro diz a Jesus Cristo: "Façamos três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias."
O Evangelho diz que ele não sabia o que dizia, porque estava fora de si. Ele estava perante algo tão irresistível que dizia tudo o que lhe vinha à mente, soltava qualquer coisa que pudesse expressar o seu sentimento.
Agora, se pensamos ser capazes de manter a oração espontânea ao longo da vida, iludimo-nos ingenuamente.
A oração espontânea deve brotar da nossa alma: não se trata simplesmente de girar uma torneira e deixar correr. Não se trata, aqui, de acionar algo para nosso uso, em qualquer momento. A oração nasce do fundo da nossa alma, de cada deslumbramento ou dor, mas não se dá numa situação de mediocridade, na qual não estejamos inundados pela presença divina ou inteiramente dominados pelo sentimento daquilo que somos e da posição em que nos encontramos. Portanto, tentar o emprego da oração espontânea em tais momentos, torna-se um exercício inteiramente ilusório. Há largos períodos nos quais não estamos nem no fundo do mar nem no topo da montanha, em que temos de fazer alguma coisa para conseguir rezar: é o período em que não podemos rezar espontaneamente, mas podemos fazê-lo por convicção.
Isso é muito importante, pois muitas pessoas, que iniciam uma vida de oração, pensam que não estarão sendo sinceras se não sentirem fortemente as palavras e frases que empregam. Isso não é verdade. Podemos, por vezes, ser inteiramente sinceros na lucidez da nossa inteligência, na retidão da nossa vontade, muito embora em dado momento tais ou quais palavras ou talvez gestos não exprimam o que sentimos nessa ocasião.
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