Jesus Cristo, fundamento da vida cristã
(Parte II- Cristo presente nos cristãos)
Quis recordar, embora brevemente,
alguns dos aspectos do viver actual de Cristo - Iesus Christus heri et hodie; ipse et
in saecula; Jesus Cristo é sempre o mesmo, ontem e hoje, e por toda a eternidade - porque aí
está o fundamento de toda a vida cristã. Se olharmos ao nosso redor e considerarmos o decurso
da história da Humanidade, observaremos progressos, avanços: a Ciência deu ao homem
uma consciência maior do seu poder; a Técnica domina a Natureza melhor do que em épocas
passadas; e permite à Humanidade sonhar com um nível mais alto de cultura, de vida
material, de unidade.
Talvez alguns se sintam levados a
matizar este quadro, recordando que os homens padecem agora injustiças e
guerras maiores ainda do que as passadas. E não lhes falta razão.
Mas, por cima dessas
considerações, prefiro recordar que, no domínio religioso, o homem continua a ser homem e Deus
continua a ser Deus. Neste campo, o cume do progresso já se deu; é Cristo, alfa e ómega,
princípio e fim.
No terreno espiritual não há
nenhuma nova época a que chegar. Já tudo se deu em Cristo, que morreu e ressuscitou,
e vive, e permanece para sempre. Mas é preciso unirmo-nos a Ele pela fé, deixando que a sua
vida se manifeste em nós, de maneira que se possa dizer que cada cristão é, não já alter
Christus, mas ipse Christus, o próprio Cristo.
Instaurare omnia in Christo, é o
lema que S. Paulo dá aos cristãos de Éfeso: dar forma a tudo segundo o espírito de
Jesus; colocar Cristo na entranha de todas as coisas: Si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad
meipsum: quando Eu for levantado sobre a terra, tudo atrairei a mim. Cristo, com a sua
Encarnação, com a sua vida de trabalho em Nazaré, com a sua pregação e os seus milagres por
terras da Judeia e da Galileia, com a sua morte na Cruz, com a sua Ressurreição, é o centro da
Criação, Primogénito e Senhor de toda a criatura.
A nossa missão de cristãos é
proclamar essa Realeza de Cristo; anunciá-la com a nossa palavra e com as nossas obras. O
Senhor quer os seus em todas as encruzilhadas da Terra. A alguns, chama-os ao deserto,
desentendidos das inquietações da sociedade humana, para recordarem aos outros homens, com
o seu testemunho, que Deus existe. Encomenda a outros o ministério sacerdotal. À grande
maioria, o Senhor quere-a no mundo, no meio das ocupações terrenas. Estes cristãos,
portanto, devem levar Cristo a todos os ambientes em que se desenvolve o trabalho humano: à
fábrica, ao laboratório, ao trabalho do campo, à oficina do artesão, às ruas das grandes
cidades e às veredas da montanha.
Gosto de recordar a este
propósito o episódio da conversa de Cristo com os discípulos de Emaús. Jesus caminha junto
daqueles dois homens que perderam quase toda a esperança, de modo que a vida começa a
parecer-lhes sem sentido. Compreende a sua dor, penetra nos seus corações, comunica-lhes algo da
vida que Nele habita. Quando, ao chegar àquela aldeia, Jesus faz menção de seguir para diante,
os dois discípulos retêm-No e quase O forçam a ficar com eles. Reconhecem-No depois ao
partir o pão: - O Senhor, exclamam, esteve connosco! Então disseram um para o outro: Não é
verdade que sentíamos abrasar-se-nos o coração dentro de nós enquanto nos falava no caminho e
nos explicava as Escrituras? Cada cristão deve tornar Cristo presente entre os homens; deve
viver de tal maneira que todos com quem contacte sintam o bonus odor Christi, o bom odor de
Cristo, deve actuar de forma que, através das acções do discípulo, se possa descobrir o
rosto do Mestre.
O cristão sabe que está enxertado
em Cristo pelo Baptismo; habilitado a lutar por Cristo pela Confirmação; chamado a
actuar no mundo pela participação que tem na função real, profética e sacerdotal de Cristo;
feito uma só coisa com Cristo pela Eucaristia, Sacramento da unidade e do amor. Por isso, tal
como Cristo, há-de viver voltado para os outros homens, olhando com amor para todos e
cada um dos que o rodeiam, para a Humanidade inteira.
A fé leva-nos a reconhecer Cristo
como Deus, a vê-Lo como nosso Salvador, a identificarmo-nos com Ele,
actuando como Ele actuou. O Ressuscitado, depois de arrancar das suas dúvidas o Apóstolo Tomé,
mostrando-lhe as chagas, exclama: Bem-aventurados os que, sem me verem, acreditaram. Aqui -
comenta S. Gregório Magno - fala-se de nós de um modo particular, porque nós possuímos
espiritualmente Aquele a Quem corporalmente não vimos.
Fala-se de nós, mas com a
condição de que as nossas acções se conformem à nossa fé. Não crê verdadeiramente senão quem,
no seu actuar, põe em prática o que crê. Por isso, a propósito daqueles que da fé não
possuem mais do que as palavras, diz S. Paulo: professam conhecer Deus mas negam-no com as
obras.
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