Há muitos cristãos que tranquilizam a sua consciência beijando um Cristo belo, obra de arte e de museu, enquanto ofendem, mutilam e roubam o pequeno Cristo de carne, que é o seu irmão… Esses beijos repugnam-me e causam-me asco. Tolero-os e aguento-os, forçado, nos meus pés de imagem talhada em madeira. Ferem-me porem o coração. Tendes demasiados Cristos belos, demasiadas obras de arte da minha imagem crucificada, demasiados Cristos completos, perfeitos, apolíneos… E estais em perigo de vos ficardes na obra de arte. Um Cristo belo pode ser um perigoso refúgio, para vos esconderdes da dor alheia, tranquilizando ao mesmo tempo a consciência com um mentido amor a Deus crucificado.
Por isso deveríeis ter mais Cristos partidos, mais Cristos mutilados. Um à entrada de cada igreja, um em cada procissão da semana santa, que vos gritasse sempre, com os seus membros partidos e a cara sem formas, a dor e a tragédia da minha segunda Paixão nos meus irmãos, os homens… Por isso te suplico: não me restaures. Deixa-me partido. Aguenta-me partido junto de ti, ainda que amargure um pouco a tua vida. Beija-me partido !
Ramon Cué – O Meu Cristo partido, Porto, Editorial Perpétuo Socorro, s.d., 32.
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