À PROCURA DA PALAVRA
SANTÍSSIMA TRINDADE Ano B
"… ensinando-as a cumprir tudo o que vos mandei." Mt 28, 20
À maneira da Trindade
Haver um domingo chamado “da Santíssima Trindade” quase parece uma
contradição, como se os outros não o fossem também. Mas é fundamental
não esquecermos que acreditamos em Deus que é Um e Trino, que é comunhão
de Pessoas, e é na sua intimidade que queremos viver. Assinalar neste
domingo a Igreja Diocesana, como fazemos em Lisboa e em outras dioceses,
é fazer da comunhão a opção fundamental de viver a fé e de estar no
mundo como fermento e luz. E também como sal, pois a grande sensação é
que vivemos sem sabor e sem descobrir o sabor daquilo que é importante.
Maravilho-me com a simplicidade das últimas palavras de Jesus quando
enviou os discípulos pelo mundo. Mais do que um plano, um mandato:
“Ide”; mais do que uma organização, um tesouro a comunicar: “a Boa
Nova”; mais do que regras e leis, uma vida em transformação:; mais do a
garantia de sucesso, a promessa da sua presença. Na espantosa
criatividade de levar Jesus e ser levado por Ele, de “a propósito e a
despropósito” deixar a boca falar da abundância do coração, a Igreja
aprende na escola do Espírito Santo como chegar aos corações e à vida
das pessoas. É a pastoral da proximidade, do gosto dos outros e de tudo o
que lhes diz respeito, do encanto em descobrir como Deus habita o
íntimo de cada um. Ultrapassando a atitude de quem se julga acima, mais
puro ou mais santo, mais íntimo do sagrado ou mais dono da verdade, e
descobrindo que Deus se fez próximo também para nos humanizar, para não
aprisionarmos o pensamento nem o coração, para que as nossas palavras
sejam vivas e não repetições vazias de fórmulas. Não precisam de andar
juntas a fé e o amor?
Também de fé e amor fala o delicioso e discreto filme “A pesca do
salmão no Iémen”. Não tem a fé também a ver com o que nos parece
impossível? Como são importantes, no caminho da fé, a paciência, a
humildade e a esperança com que o pescador se reveste! A coragem em
nadar contra a corrente (que caracteriza a vida dos salmões) por causa
de um amor verdadeiro, e até a descoberta da fronteira ténue entre o que
engrandece Deus ou é arrogância humana, entrelaçam-se nesta história. A
conclusão de que o maior dos sonhos precisa também de começar pelo
pouco, pelo possível e pelo empenho de todos fez-me pensar no que é
viver “à maneira da Trindade”: unindo a fé e o amor, a partir da
realidade de cada um e do mundo concreto, com verdade e transparência.
Como podemos dizer no mundo que Deus enche de Graça a vida, se não
vivemos “à sua maneira”? E como viver assim se não nos deixamos
surpreender por Ele? E como pode ser Deus surpresa para nós se não
gostamos nada de surpresas?
P. Vítor Gonçalves
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