Leituras:
Segundo Livro dos Reis 5, 9-14;
Salmo 31;
Primeira Carta de SãoPaulo aos Coríntios 10, 31-11,1;
Marcos 1, 40-45.
COR LITÚRGICA: VERDE
1. Situando- nos brevemente
O pedido pela cura já trazia a afirmação do poder de Jesus: “Se queres, tens o poder de curarme”.
O encontro traz por trás a dura situação das pessoas enfermas no tempo de Jesus, sobretudo em relação à religião. Elas eram consideradas impuras e, portanto, inaptas para prestar culto a Deus. De fato, a lei mosaica determinava a exclusão de tais pessoas (primeira leitura). Elas, por sua vez, deviam se declarar assim, demonstrando com roupas rasgadas, cabelos desgrenhados, avisando aos demais, com gritos, a sua impureza.
À primeira vista, nossa reação perante tal situação tende a julgar esse tipo de mentalidade como meramente excludente ou até mesmo perversa. É porque pensamos a partir das categorias do nosso tempo, quando muitas dessas enfermidades são tratáveis e possíveis de serem curadas, inclusive a hanseníase, ou mesmo a partir das nossas categorias religiosas. Nesse caso, é bom situar bem o problema em seu contexto. No tempo de Jesus não existiam tratamentos, nem cura
para essa e outras enfermidades.
Nem sequer muita distinção se fazia entre os vários tipos de doenças de pele, sendo todas praticamente qualificadas como lepra (cf. Lv 13,2). O medo de contágio funcionava então como “órgão regulador” que impunha medidas profiláticas, um tanto estranhas para nós, mas por eles
consideradas necessárias para a proteção da comunidade. Isso, evidentemente, não levava em conta a situação dos enfermos, sua exclusão da sociedade e do culto e a situação desumana em que se achavam. Qual foi a atitude de Jesus? Como ele se porta, dentro do mesmo contexto, em relação aos doentes e ao culto?
2. Recordando a Palavra
Por compaixão, Jesus não hesita em conceder a cura ao leproso. Ele tinha o poder de curar, e mais que isso, ele trazia consigo o desejo salvífico do Pai. Mas a relação entre puro e impuro se mostra em perfeito contraste no encontro com o leproso: de um lado, Jesus, o Filho de Deus, totalmente puro e santo; o leproso, no outro extremo, era considerado como o impuro e sua impureza era vista também como pecado.
Na relação, que é absolutamente desigual, o puro e santo se sobrepõe ao impuro e pecador, curando-o, purificando-o e perdoando-o. A santidade e a pureza divinas “vencem” a impureza, a
doença e o pecado. A vida se restaura diante da atitude “sacramental” de Jesus: gesto e palavra
revelam a salvação de Deus que supera as limitações humanas, religiosas e sociais.
O homem, reintegrado pela cura operada, foi enviado por Jesus aos sacerdotes, prova de que Jesus não combate o contexto religioso, mas reenvia o homem aos sacerdotes, cumprindo a lei mosaica e tornando a cura reconhecida.
Por outro lado, o totalmente puro e santo, Jesus, cumpre sua trajetória pascal neste pequeno relato. Jesus, verdadeiro homem, não hesita em tocar o impuro, tornando-se também, por contato, impuro aos olhos dos contemporâneos. Ele “torna-se” impuro segundo a lei, para purificar o homem enfermo. Põe em risco seu status de cidadão apto para o culto, dá a vida para
que o outro tenha mais vida.
É a identificação do totalmente santo com o leproso, fora da cidade (cf. Lv 13,46). Essa atitude de
Jesus desenha um “perfil” de Messias, que faz entender a sua ordem de não contar a ninguém o
milagre. O chamado “segredo messiânico” tem o sentido de não se deixar confundir com a mentalidade popular a respeito do Messias. O messianismo de Jesus é outro: passa pela cruz e pela identificação com os excluídos.
3. Atualizando a Palavra
Que significa seguir os passos de Jesus ao ouvir este evangelho? Ser cristão vai além do viver um rol de preceitos morais. É vida em Cristo! Esse modo de vida determina o seguimento dos discípulos e discípulas de Jesus.
O modo de vida daquele que se manifestou como esperança para os doentes e excluídos, compassivo diante da aflição alheia, pronto para atender à necessidade do sofredor, solidário na sua condição e avesso à notoriedade ou fama.
A vida em Cristo supõe permitir que a mesma salvação se operasse em nós e por meio de nós como sinais da nossa filiação divina em Cristo, o Filho de Deus. A comunidade será tanto mais de
Cristo, tanto mais unida a ele, quanto mais se fizer aberta e atenta aos desvalidos da nossa sociedade, presente nos ambientes e lugares onde a suspeita e o temor de “contaminação”, ou de ser tratado como impuro afastam os que buscam apenas viver bons preceitos.
O Bom Pastor vai em busca da ovelha que se perdeu e veio para salvar o que estava perdido... Cristianismo sem cruz, solidariedade e risco, está longe do evangelho e de Jesus.
4. Ligando a Palavra e a Eucaristia
A união com Cristo é conseqüência e finalidade da Eucaristia. A oração do dia manifesta essa busca contínua da Igreja: o viver unido a Deus, por meio de Cristo, único caminho ao Pai. É a celebração que nos aproxima dele, o totalmente santo e puro que pode purificar a nossa vida (oração sobre as oferendas) e devolver a alegria de viver ao provar a salvação (oração da comunhão ).
A comunidade de fé faz a mesma experiência do homem purificado: ela se aproxima confiante, suplica a salvação com fé e certeza e, sacramentalmente “tocada” pelos sinais e pela Palavra de Jesus, recupera a vida nova que ele mesmo nos dá. Neste sentido, o sacramento da eucaristia é nossa aproximação máxima daquele que nos santifica ao nos unir a si na sua entrega.
A oração eucarística terceira diz, a respeito do Espírito Santo: “que ele faça de nós uma oferenda perfeita”. Ao sermos santificados e habilitados para o culto pleno em Cristo, sejamos também manifestação da visita de Deus para os outros (aclamação ao evangelho). Que o culto existencial também nos qualifique para a celebração!
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