“Tu és morno, nem frio nem quente. Oxalá fosses frio ou quente, mas como és morno, nem frio nem quente, Eu te vomitarei da minha boca” (Apocalipse, 3, 15-16)
Nessa citação bíblica, o autor fala da inautenticidade de uma comunidade cristã primitiva, que assumiu o cristianismo, mas continuava com seus costumes pagãos. Ele não pede que sejam quentes, ou que sejam frios.Pede que tomem uma decisão. Ou isto, ou aquilo.
Como diz o salmo 1, que não andem por dois caminhos ao mesmo tempo; como diz a linguagem popular, que não tenham “duas caras”, “dois pesos e duas medidas”, que não fiquem “em cima do muro”. Pede para que sejam coerentes com a opção que fizeram que sejam autênticos.
A autenticidade é um assunto muito debatido, mas pouco aprofundado. Está intrinsecamente ligada ao desejo de realização pessoal do homem. A busca da felicidade está no âmago do ser humano. Sua realização pessoal depende totalmente de uma vida autêntica. Será feliz à medida em que for autêntico. Logo, conclui-se que todo ser humano quer ser autêntico, pois quer ser feliz.Hans Küng (1969), em seu livro “Veracidade”, diz que nos dias atuais existe uma grande paixão pela autenticidade.
O homem hodierno agrade ouvi-lo ou não, perdoa quase todos os pecados, caso sejam cometidos dentro de uma convicção sincera (p.5). Küng denuncia toda forma de hipocrisia, de fachada, de pompa, de enfeite, de artificialismo no falar, no vestir, no agir.Assim, o tema “autenticidade” sempre foi alvo dos questionamentos humanos, desde que o homem primitivo tomou consciência de si, a busca pela autenticidade foi iniciada. Sócrates, cinco séculos antes de Cristo, foi grandioso paradigma, com sua célebre frase: “conhece-te a ti mesmo”.
Também pelo exemplo de heroísmo a nós deixado, com sua opção pela morte para que não fosse obrigado a viver sem buscar a verdade.De forma sistemática, a autenticidade foi abordada direta ou indiretamente a partir do século XVII por vários filósofos. Entre eles, Hegel, Marx, Kierkegaard, Heidegger, Nietzsche, Sartre e outros existencialistas.Em curto prazo, este tema continuará tendo utilidade para poucas pessoas – afirmação baseada na observação da sociedade.
É bem provável que a cultura neoliberal não entre em declínio tão rapidamente. Mas, por outro lado, também não durará para sempre, é visível o descrédito de muitos grupos humanos, a decepção, o vazio interior que tem causado indignação e revolta.
Quanto mais questionamentos houver, maior será a utilidade e eficácia deste tema. Isso dependerá totalmente do decorrer das coisas, mas algo é certo, a utilidade do tema está intrinsecamente ligada à capacidade de reflexão das pessoas, grupos e de toda sociedade.Neste artigo, serão analisadas várias definições de autenticidade. Que este trabalho contribua com o progresso do pensamento universal, que venha ao encontro das expectativas de seus leitores, seja útil para o revigoramento da autenticidade daqueles que já a conquistaram, para o aprendizado daqueles que a buscam e para o questionamento daqueles que a rejeitam direta ou indiretamente.
Que todos possam progredir na autenticidade, na arte da verdade.
Precisamos e urgente é necessidade a autenticidade a veracidade na vida cristã.
Que nosso sim seja sim e o não seja não pois o que passa disto vem do maligno , é obra de Satã, do divisor . E o homem dividido já é um desgraçado.O tempo urge a veracidade, a verdade por pior que seja é a verdade o pior é querer manter-se sobre a mentira.
O nosso tempo infelizmente os homens estão se esquecendo do juízo final que um dia todos nós teremos diante do pai das luzes e da Verdade imparcial.João Batista Libânio, em suas palestras, fala da importância de se iniciar um trabalho pela definição do tema. Ele diz que toda palavra, antes de ser palavra, foi experiência. Toda experiência é marcante para a vida de uma pessoa ou um grupo de pessoas.
Algumas experiências são tão marcantes que merecem definição própria.
Daí a importância de conhecer as raízes do termo, sua construção etimológica e, se possível, a experiência que se transformou em palavra. As definições de “autenticidade” são diversas. A experiência da psicologia resultou numa definição de “autenticidade” própria, de acordo com sua terminologia própria; assim acontece com a sociologia, o direito, a biologia, a astronomia etc. O objetivo deste trabalho é procurar uma definição ética de autenticidade, uma definição que possa ser usada em qualquer ciência, do ponto de vista moral.
A filosofia é a mãe das ciências, aquela que abriga em si as raízes de qualquer teoria. Por meio dela, torna-se possível uma definição geral. Assim, este trabalho é baseado em teorias filosófico-antropológico-morais, isto é, do homem visto de forma integral, em sua relação consigo e com os outros. O termo “autenticidade” tem origem grega: “autos”. É uma referência à própria origem, um retorno do efeito à causa, uma alusão à independência, por si próprio, de si mesmo conforme Aurélio B. H. Ferreira (1986).
Segundo Inwood (2002, p.11), quer dizer si mesmo e significava originalmente feito por suas próprias mãos, garantido por confiança. Segundo Lalande (1999), autêntico é aquele que age com autoridade, ou que é feito por si mesmo (p.112). O termo “auto” é muito utilizado atualmente, e seu significado é conhecido por todos. O sufixo “dade” indica sempre a forma ideal de algo aplicável nos seres particulares concretos.
Liberdade, por exemplo, é a forma abstrata, é a idéia daquilo que se pode entender observando os seres livres. Assim, pode-se dizer que o termo “autenticidade” é a qualidade dos seres autênticos, que por sua própria composição, indica originalidade, causa em si mesmo.Vários dicionários de Filosofia e escritores diversos arriscaram definir autenticidade de acordo com a própria experiência. Na interpretação de vários autores, haverá a tentativa de encontrar um modelo geral de autenticidade, do ponto de vista moral, que possa ser aplicável nas diversas situações. Em que consiste a autenticidade? Em toda pessoa humana pode haver dicotomias.
O que a pessoa sente pode ser diferente do que a pessoa pensa. O que pensa pode ser diferente do que diz. O que diz, diferente do que faz.
Autenticidade significa que essas dicotomias desaparecem e que se luta para conquistar uma unidade harmônica entre o sentir, o pensar, o falar e o agir. Para isso, será preciso acostumar os jovens a uma permanente autocrítica (LARRAÑAGA, 1975, p. 456). Frei Inácio Larrañaga define autenticidade de forma muito clara, simples e objetiva: é a harmonia entre sentir, pensar, falar e agir. Compreensível para qualquer ignorante. Para Larrañaga, autenticidade é sinônimo de coerência, unidade, coesão, conexão, integração, concordância, conformidade, entre as várias dimensões do ser humano. Esta definição vem ao encontro das expectativas mostrando a autenticidade como “equilíbrio”. Este equilíbrio poderia também abranger as relações humanas essenciais: com o mundo – sobrevivência –, com o outro – convivência – e com Deus – dependência.
Em seu “Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia”, Lalande (1999) faz uma definição geral de autêntico: C. No sentido corrente e vago: legítimo; original; sincero; conforme sua aparência, que merece o nome que se lhe dá; algumas vezes até, por extensão, verdadeiro (p.112). Em seguida, faz uma crítica à própria definição: O sentido C não é aconselhável, nem do ponto de vista da precisão da linguagem, nem do ponto de vista da etimologia.
A expressão "autêntico", tomada da linguagem judicial..., apenas se relaciona com a proveniência e não com o conteúdo: dizer que um documento é autêntico é dizer apenas que a sua proveniência é certa, não que o seu conteúdo seja exato. Mas a autenticidade produz uma impressão de respeito que predispõe a aceitar o conteúdo sem discussão...(p.113). A crítica de Lalande enriquece o nosso trabalho, revelando a contribuição que a visão judicial de autenticidade oferece.
Autenticidade não indica veracidade. A procedência difere do conteúdo. Será que esta divisão pode ser aplicada às pessoas? Lalande mesmo responde, e dá um toque especial na nota de rodapé a respeito da palavra “autêntico”: Sobre Autêntico - Certamente que um documento autêntico não é um documento verídico; são dois valores distintos, que é necessário não confundir, e o segundo prevalece sobre o primeiro. Mas no caso de um quadro ou de uma jóia ‘autêntica’, o sentido é que eles têm de fato todo o valor que parecem ter, que não decepcionarão quanto à riqueza que prometem.
Neste sentido, o epíteto não poderá aplicar-se utilmente ao pensamento e às pessoas? A pessoa sincera mostra-se tal como acredita ser; a pessoa autêntica tal como é profundamente. ‘A fé que não age é uma fé sincera?’ Certamente, sobretudo, antes da questão lhe ter sido posta; mas não é uma fé autêntica.
A autenticidade seria o limite para o qual tende a sinceridade quando ela é acompanhada de sinceridade em relação a si mesma, que pressupõe bem mais do que a introspecção imparcial: o estudo da conduta, a coerência dos atos e dos pensamentos (p.112). Depois de riquíssimas ilustrações, Lalande define: A autenticidade seria o limite para o qual tende a sinceridade quando ela é acompanhada de sinceridade em relação a si mesma, ou seja, a autenticidade seria o ápice da sinceridade. Mas, para isso, alguns critérios são exigidos: sinceridade em relação a si mesma, introspecção imparcial, o estudo da conduta, a coerência dos atos e dos pensamentos. Percebe-se que Lalande coloca a autenticidade mais centrada no próprio indivíduo do que em suas atitudes. Ele fala que, além de sincera com o outro, a pessoa deve ser sincera consigo mesma, por mais difícil que seja reconhecer certas verdades sobre si mesmo.
E só reconhecerá tais verdades se praticar a introspecção, isto é, a busca do conhecimento de si mesmo, das motivações interiores, das intenções inconscientes, dos traços determinantes da própria personalidade, das influências externas etc. Depois de toda essa auto-análise, ainda exige o estudo da conduta e a coerência dos atos e dos pensamentos. Neste ponto, Lalande entra em acordo com Larrañaga, que fala da “harmonia” dos atos e pensamentos. Mas Larrañaga se detém neste âmbito, enquanto Lalande vai além. Ou seria melhor dizer “vai aquém”? Uma vez que retorna ao indivíduo e coloca nele a possibilidade da autenticidade, só será autêntico se fizer todo o esforço necessário para ser sincero consigo mesmo, para depois manifestar-se de forma coerente. Aqui se torna possível aquela dualidade judicial entre proveniência e conteúdo.
A proveniência indicaria a verdade da pessoa com ela mesma, o conteúdo, a verdade objetiva a ser comunicada.Em seu Dicionário de Filosofia, Mora (2000) inicia sua definição de autêntico fazendo uma analogia à identidade, reflete sobre a problemática da alienação do próprio ser. Diz-se que algo é autêntico quando se estabelece, sem lugar para dúvidas, a sua identidade, ou seja, quando se estabelece de modo definitivo que ele é certa e positivamente o que se supõe ser. Em filosofia, os termos ‘autenticidade’ e ‘autêntico’ são aplicados por alguns pensadores especialmente, não exclusivamente à existência humana e a outras realidades tão só na medida em que são função de tal existência.
Diz-se, então, que um determinado ser humano é autêntico quando é, ou chega a ser, o que verdadeira e radicalmente é, quando não está alienado. Contudo, em certas ocasiões, pode-se considerar que a alienação é um dos traços essenciais da existência humana, de modo que, em tal caso, o estar alienado, e, de um modo ainda mais radical, o não ser em si mesmo, é uma das características do ser autêntico (p.233). Autêntico é algo que está de acordo com sua identidade. A identidade revela o que algo ou alguém é. Pela identidade é possível descobrir as características da coisa ou pessoa identificada, assim como sua realidade última. A autenticidade, na verdade, não seria sinônimo de identidade, mas o pleno cumprimento dela.
A fidelidade à própria identidade é uma ótima definição de autenticidade; é a “função” da existência; é a propriedade de ser ela mesma e não ser outra. No caso de objetos e animais, a autenticidade é intrínseca à sua verdadeira identidade, pois não há como eles deixarem de ser o que são. Mas com o homem é diferente. Só o homem tem a capacidade de não ser o que é, ou melhor, de não manifestar aquilo que diz sua identidade, de não ser fiel ao próprio ser. Um determinado ser humano é autêntico quando é, ou chega a ser, o que verdadeira e radicalmente é, quando não está alienado.
Nessa situação, entra a alienação do ser, a alienação significa aqui um abandono de si, uma entrega gratuita do sentido da própria existência. Neste ponto, Mora coloca a alienação como inautenticidade. Uma perda do próprio ser. Um deixar de tomar posse da própria existência. E logo em seguida, acrescenta: Contudo, em certas ocasiões, pode-se considerar que a alienação é um dos traços essenciais da existência humana. Quais seriam estas ocasiões? Ocasiões em que a alienação não seria inautenticidade? Heidegger, ainda segundo Mora, define autenticidade como essa “apropriação ou desapropriação” de si: O Dasein [homem] pode, com efeito, ‘eleger-se a si mesmo’, isto é, ‘ganhar-se’, caso em que se apropria de si mesmo e se torna ‘autêntico’. Ele pode também ‘não eleger-se a si mesmo’, ou seja, ‘perder-se’, caso em que deixa de apropriar-se de si mesmo e se torna ‘inautêntico’ (id.).
Para Heidegger, tanto o eleger-se, o ganhar-se, o apropriar-se, como o não eleger-se, o perder-se, o desapropriar-se, constituem realidades de mesmo valor ontológico. Ambos fazem parte da realidade humana. É perceptível em Mora, a tendência ontológica na análise da autenticidade. Além da própria definição e de Heidegger, cita José Ortega y Gasset: Ortega y Gasset falou com freqüência de autenticidade e inautenticidade como traços ontológicos da realidade humana. Em 1916, (Obras, II, 84-85), ele descrevia um ‘eu autêntico’, como a base insubornável da vida humana;(...) Quando o homem torna-se o que é, sua vida é própria. O homem cumpre então sua vocação radical e seu ‘destino’ (ibid.). Mora cita, ainda, Pascal, Hegel e Marx: ...idéia pascaliana de ‘distração’ (que exprime a realidade humana em sua inautenticidade), com a idéia hegeliana (e também marxista) da ‘alienação’ (que expressa uma fase em certo processo ‘dialético’ da realidade humana) (ibid.).Todas estas definições são abordadas sob o ponto de vista existencial: a “alienação” de Hegel, Marx e do próprio Mora, a “distração” de Pascal, a “vida própria” de Ortega y Gasset. Abbagnano (1998) cita Jaspers, que fala também da “perda de si mesmo”. Mas como isso se daria? Seria mesmo possível alguém deixar de ser gente?Abbagnano tenta responder nas palavras de Jaspers e Heidegger: ‘O autêntico’, diz Jaspers, ‘é o mais profundo, em contraposição ao mais superficial; (...) Heidegger expressou em outros termos a mesma oposição: (...) a existência inautêntica é caracterizada pela tagarelice, pela curiosidade e pelo equívoco, que constituem o modo de ser cotidiano, impessoal do homem e representam, portanto, uma decadência do ser em ralação a si mesmo (ibid. Par. 38) (ABBAGNANO, 1998, p.95). Sim, é possível um ser humano deixar de ser humano. Várias situações foram apontadas: vida superficial, escolher-se e conquistar-se só aparentemente, pela tagarelice, pela curiosidade e pelo equívoco, que constituem o modo de ser cotidiano, impessoal do homem, que o próprio Heidegger conclui: representam, portanto, uma decadência do ser em ralação a si mesmo.
Gonçalves Jr. (2004) em seu artigo: “Ética das Massas: A Noção de Inautenticidade em Heidegger e Sartre” também vê a autenticidade num nível mais existencial.A expressão autenticidade na filosofia existencial denota o modo de ser do homem que se funda numa consciência autônoma. Em um sentido amplo, de acordo com Olson ‘a vida autêntica é a que se baseia numa apreciação exata da condição humana’. Já Zilles extrai da compreensão da existência como possibilidade a alternativa entre o modo de ser autêntico e o inautêntico: ‘a existência autêntica é a de quem reconhece e escolhe a possibilidade mais própria do seu ser’. A inautenticidade, por outro lado, é uma existência cotidiana que segundo o mesmo autor, estaria distante das responsabilidades pessoais, levada pela mediocridade das massas.Sendo assim, resume Olson: ‘tanto para Sartre como para Heidegger, (...) o homem autêntico é o que reconhece a dualidade radical entre o humano e o não-humano, que reconhece que o homem deve viver no mundo e que também reconhece que estar-no-mundo não implica estar-no-meio-do-mundo’ (GONÇALVES JR., Arlindo. Responsável. Disponível em:
http://www.suigeneris.pro.br/ /dasmassas.html>. Acesso em: 10/10/2003).
Estas são citações de uma riqueza profunda que dispensaria comentários.
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