“A Palavra se fez carne e veio morar no meio de nós” (Jo 1,14).
I) Introdução
A espiritualidade ou vida no Espírito não é uma parte ou aspecto parcial da vida humana, mas abrange toda nossa vida. Ela se concretiza em um conjunto de convicções, atitudes e comportamentos sociais que caracterizam o estilo de vida de uma pessoa, de uma comunidade ou de um grupo humano.
A espiritualidade cristã consiste no seguimento de Cristo. Diante de qualquer situação, o cristão se pergunta: “O que Cristo faria?” “Como viver os valores evangélicos, aqui e agora?”
A nossa espiritualidade não nos distancia das alegrias e tristezas dos homens e mulheres do nosso tempo e de nosso país. Pelo contrário, o seguimento de Cristo nos leva a nos inserir no mundo: “Vós sois o sal da terra (…) Vós sois a luz do mundo” (Mt 5,13-14).
Em Jesus, a Palavra de Deus se encarnou, entrou na história, adquiriu um rosto, assumiu um povo, um país, uma cultura, uma comunidade de discípulos e discípulas. Nós também vivemos inseridos em um contexto histórico determinado. É no dia a dia que temos que viver a espiritualidade encarnada.
“Deus enviou seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele” (Jo 3,17). Sendo rico, Cristo Jesus não se apegou a sua condição divina, mas se fez pobre, por causa de nós, para nos enriquecer com a sua pobreza (2 Cor 8,9; Fl 2,6-7). Essa atitude fundamental de Cristo Jesus (desprendimento-encarnação-serviço) nos motiva a ouvir o mundo e a nos colocarmos a serviço da vida.
Discípulos e missionários de Jesus Cristo, abertos ao diálogo com todos os que procuram a Deus de coração sincero, oferecemos ao mundo um caminho de humanização: a comunhão fraterna, a solidariedade com os mais necessitados, o amor-serviço a todos.
II) O que é uma Espiritualidade.
Ao procurarmos nos dicionários, vemos que palavra espiritualidade tem relação com a “alma” ou “espírito”, mas não no sentido de algo abstrato, eis que faz lembrar inspiração, força que leva a agir, ela vem de dentro e nos impulsiona para a ação, é um atributo que faz parte da essência do ser humano, que produz uma mudança interior, para tanto, deve ser exercitada, para que se torne uma oportunidade real e constante na busca do crescimento interior.
Neste esteio de pensamento, a espiritualidade é um processo de formação nunca acabado, exatamente como a vida, na qual estamos sempre nos transformando e aprendendo.
Com efeito, atualmente essa terminologia tem sido muito mal entendida, em virtude da diversificação de cultos, religiões, crenças e crendices, tanto que o escritor colombiano Harld Carmona diz que “boa parte da espiritualidade moderna é puramente uma mística sem ética, uma emoção sem missão e uma especulação sem meta.” Nesse cenário, o grande desafio é estar aberto para o aprendizado, para mudanças e para o crescimento, e ao mesmo tempo assumir uma posição contra as novidades que nos aparecem recheadas de subterfúgios, artifícios e estratégias, que têm como único objetivo ludibriar a boa fé daqueles que devem ser alvos do nosso amor e da nossa misericórdia.
A espiritualidade cristã é como o amor, é intrínseca ao ser humano, é uma atividade que nos leva a uma busca, a um profundo diálogo em comunhão com Deus, que se pode dar através da oração diária, do perdão, da solidariedade, enfim, daquilo que nos traz conforto e paz interior.
Vale lembrar que, Santa Teresa disse que “a oração é um trato de amizade com Deus”.
Em Romanos 8,16, o apóstolo Paulo diz que, o Espírito de Deus testifica com o nosso espírito que somos de Deus e, complementa ao dizer que passamos a ser habitação do Espírito Santo (1 Cor. 6,19-20). Deste estreitamento na relação Deus e Homem é que nasce a nossa verdadeira vida espiritual.
Desta forma, vale à pena derrubar as cercas da opinião alheia, que impõem barreiras, não tendo medo exatamente de tudo o que tememos como o não dar certo, a sinceridade, o sofrimento, para dar lugar à transformação, ao crescimento.
Segundo o Novo Dicionário Aurélio, espiritualidade é a qualidade ou caráter de espiritual ou, na definição Releligiosa – doutrina acerca do progresso metódico na vida espiritual.
Segundo o Concílio Vaticano II, é a liberdade nas várias formas de vida espiritual (Unitatis Redintegratio, Cap. I, n. 771) e as formas de realizá-la são múltiplas, pois cada um pode e deve tornar-se santo dentro das situações concretas em que se encontra e vive (LG, Cap. V, n. 91) e as vocações nos levam a tipos de espiritualidade e a formas de realizações dessa espiritualidade, tantas quantas são os cristãos, porque Deus chama e interpela a cada um de nós pessoalmente.
Na definição dada acima, para o vocábulo espiritualidade, é de se atentar às palavras progresso metódico.
Sim, porque para se atingir a espiritualidade em qualquer grau, é necessário o mesmo esforço de um atleta, é necessária constância, persistência, quase que um verdadeiro treinamento que encerra muita oração, muito silêncio, muita leitura e meditação da Sagrada Escritura e, principalmente, aproximação constante e fervorosa à Eucaristia, pois sabemos que na Eucaristia, se contém todo o bem espiritual da Igreja (Dec.Presbyterorum Ordinis, Cap., II, p. 446).
Os diferentes autores mencionam que existem etapas pelas quais se deve passar para um desenvolvimento espiritual, quais sejam: o afastamento do pecado e a purificação, a progressiva assimilação da Palavra e do Espírito e a progressiva intimidade divina. Para alcançarmos tudo isso, há os degraus a serem subidos que são os sacramentos, ou seja, os sacramentos da nossa Igreja são sinais e degraus que nos levam a alcançar a espiritualidade, a santidade, já que a vocação de todo ser humano é a santidade como afirma Mt 5,48 “Vós, portanto, sereis perfeitos, como é perfeito o vosso Pai celeste”.
Todavia, é de se salientar que cada cristão deve fazer sua escolha e esta deve basear-se num comportamento de abertura e disponibilidade à ação do Espírito Santo e que, sobretudo, deve esforçar-se continuamente para conservar esse comportamento.
Para isso, todo cristão deve procurar um encontro intenso com Cristo através da leitura e da meditação da Sagrada Escritura e através dela, meditar também sobre as circunstâncias da própria vida, procurando encontrar o caminho correto através da vocação que lhe foi revelada por Deus e, para a meditação, são necessários momentos de silêncio para que, nesses momentos, possamos também deixar que Deus fale conosco e nos mostre o seu desejo.
A oração também é necessária, seja ela silenciosa ou não, seja ela do modo que cada cristão sabe orar, mas deve ser constante, como afirmava Santa Tereza D´Avila, devemos orar sempre.
Tudo isso é coroado com a Eucaristia da qual devemos nos aproximar com freqüência, para buscar força, coerência, sabedoria, mansidão, humildade.
O progresso espiritual, segundo o Catecismo da Igreja Católica n. 2014 tende à união sempre mais íntima com Cristo e essa união se chama “mística”, pois participa no mistério de Cristo pelos sacramentos, principalmente pelo Sacramento da Eucaristia. O que o alimento produz em nossa vida corporal, a comunhão o realiza em nossa vida espiritual. O crescimento da vida do cristão precisa ser alimentado pela Comunhão Eucarística até o momento da morte, quando nos será dado como viático (CIC, n. 1392).
Vejamos um pouco neste aspecto o que nossa doutora da Igreja nos ajuda diante de uma Espiritualidade que inicia-se no intenso trato de amor com aquele que nos amamos .
(continua )
Padre Emílio Carlos Mancini+
Deus só e nada mais!
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